Imagine que você, pai ou mãe, perdeu o emprego de uma hora para outra, ou então que seu marido ou esposa faleceu repentinamente. Do dia para a noite, você teria que lidar com esse “desajuste” e ainda reprogramar toda a sua vida – um desgaste emocional difícil de calcular. A comparação pode até parecer desproporcional, mas se assemelha muito ao que algumas crianças têm enfrentado nesta quarentena.
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“Dado o contexto em que estamos vivendo, o comportamento da criança pode ser interpretado como uma reação ao momento de estresse”, esclarece o psicólogo Bruno Mader, do Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba. Segundo ele, isso ajuda a entender, por exemplo, por que seu filho – que já dominava o penico – está sofrendo algum “acidente” ou o motivo pelo qual o seu mais velho está pedindo ajuda para realizar uma tarefa que ele já dominava sozinho.
Já a professora Ana Priscilla Christiano, doutora em Educação e membro do Conselho de Psicologia do Paraná explica que essa reação pode vir de diversas formas. “Ela pode vir como irritabilidade, como alteração do sono, da alimentação e também dos interesses da criança”. Segundo ela, essa é a forma que as pequenas conhecem de dizer que não está tudo bem. “Todos nós estamos alterados”, lembrou.
Causas
Vale lembrar, também, que, via de regra, quanto menor a criança, maiores as chances de ela sentir esse baque. “As crianças menores regulam seus sentimentos e emoções a partir de uma rotina estabelecida – o que foi quebrado por esta pandemia. De modo geral, a organização delas mudou, o que suportava o psiquismo delas mudou. E por isso, vão procurar segurança em algum lugar”, aponta Bruno Mader.
O argumento justifica, ainda, o fato de muitas crianças estarem mais carentes do que três ou quatro meses atrás. Nas palavras do psicólogo, muitas vezes a criança regride no desenvolvimento porque está buscando se ajustar. “Neste momento, os pais vão ter que entender que é um período difícil e que essa regressão é, na verdade, uma tentativa (mesmo que malsucedida) de adaptação. A questão aqui é conseguir perceber qual é essa tentativa e definir quais suportes você vai dar para o seu filho passar por isso”, orientou.
Como lidar
Para a psicóloga Ana Priscilla Christiano, repreender ou punir a criança não ajudará em nada. Do contrário, só vai fazer com que as coisas piorem. “Eu tenho falado para os pais que, neste momento, o que eles mais precisam é exercitar a paciência”, revelou.
Ela sugere, também, que conversem muito com os filhos e que expliquem para eles – sem medo – o que realmente está acontecendo. “É preciso dizer que está difícil para todo mundo e se mostrar solidário ao que estão sentindo”, destacou.
Bruno Mader indica, ainda, que os pais repensem os momentos da rotina em casa e que estabeleçam uma nova lógica para conter os efeitos das mudanças. “Se antes você chegava em casa do trabalho e ia direto para o sofá ver televisão, agora vai precisar dar uma atenção diferenciada para o seu filho. Se der a mesma resposta de antes, não vai ajudar, apenas estará contribuindo para que a frustração dele continue”, alerta.