Casos graves

Entenda por que o respirador pulmonar é tão importante no tratamento do coronavírus

Foto: Bigstock.

Equipamento chave no atendimento a pacientes graves da Covid-19, os ventiladores pulmonares viraram até alvo de disputa entre países. A escassez do aparelho gerou uma corrida tanto pelas unidades disponíveis quanto pelas próximas a serem fabricadas. O Brasil, hoje com 65 mil respiradores, está nessa disputa por mais aparelhos.

Nos casos graves, o novo coronavírus produz um processo inflamatório em todo o corpo, mas principalmente nos pulmões, gerando pneumonia e prejudicando a capacidade respiratória. O suporte ventilatório garantido pelo aparelho, portanto, faz-se necessário e normalmente está disponível apenas em leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTI).

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Dentre os 20% das pessoas que, infectadas pelo novo coronavírus, desenvolvem quadros mais graves da doença e que exigem internação, cerca de 1/4 delas vai precisar do suporte por meio do ventilador pulmonar.

Wilson de Oliveira Filho, médico intensivista, membro da diretoria executiva da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib) e do comitê de ventilação mecânica da associação, explicou à Gazeta do Povo, quando é tomada a decisão pela ventilação mecânica e como exatamente o respirador ajuda os pacientes com dificuldades para respirar. Confira.

Quando o médico decide pela ventilação?

Falta de ar e desconforto do paciente são alguns dos sinais que podem indicar a necessidade de ventilação mecânica, segundo Oliveira Filho, além de alterações em alguns exames.

“A gente decide entubar quando o paciente está desconfortável, com falta de ar, e alterações em alguns exames de monitorização, como a oximetria de pulso (maneira de medir quanto oxigênio o sangue está transportando), quando colocamos o aparelho no dedo do paciente para ver a saturação de hemoglobina. Se tiver baixa, menor que 90%, a gente fica de olho para a entubação”, explica.

O médico alerta que antes da entubação, o paciente pode usar um cateter nasal, procedimento não invasivo, para facilitar as trocas gasosas. Caso não funcione, é feito o exame de gasometria.

Neste, uma amostra de sangue que passa pelas artérias do paciente é coletada, e são analisados os componentes metabólicos. O exame visa indicar se os pulmões estão sendo capazes de mover o oxigênio dos alvéolos para sangue, e de remover o dióxido de carbono do sangue. “Analisando o desconforto, a oximetria e a gasometria, determinamos a entubação orotraqueal (o tubo até a traqueia)”, explica.

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Outra de forma de fazer a ventilação mecânica é com uso de uma máscara junto ao rosto, mas ela não é indicada para essa pandemia. “A Amib não tem recomendado nesse momento a ventilação não invasiva de maneira rotineira. Tem recomendado a entubação orotraqueal”.

Para realizar a entubação, o paciente é sedado para evitar que tussa, espirre e espalhe o vírus pelo ambiente. “O paciente fica em coma induzido para não ‘brigar’ com o aparelho. Passa-se uma sonda pela boca e nariz para fazer a nutrição. É um procedimento diário com o qual lidamos em outras diversas doenças em pacientes na UTI”, explica o intensivista.

Como saber se está melhorando?

O ventilador pulmonar inverte a fisiologia do pulmão. Ou seja, em vez de o órgão fazer todo o movimento que permite as trocas gasosas, ele é auxiliado por uma máquina. Para saber se a pessoa está melhorando, os médicos ficam atentos a alguns parâmetros, tais como o volume de ar que está entrando no pulmão, e que está saindo e as pressões que são geradas nessa troca.

“Os parâmetros são regulados para o paciente, o volume de ar que entra e sai, pressões que são geradas, para não fazer mais lesão dentro do pulmão. Se tiver pressão baixa, usa a medicação. Se o rim não estiver funcionado, faz a diálise. A preocupação hoje é fazer esse suporte ventilatório gentil, evitar mais danos ao pulmão, pois o procedimento inverte a fisiologia pulmonar”, diz.

O uso do equipamento não é um tratamento para a cura da Covid-19, mas age como um suporte. “O aparelho oferece tempo para o organismo procurar, com suas defesas, parar a inflamação dentro do pulmão juntamente com o uso de medicamentos. A partir de dados do exame físico, ultrassom, gasometria, o médico vai vendo o aspecto geral, se está melhorando e pode deixar de usar o suporte”.

E se não melhorar?

Caso o paciente não apresente melhoras, os médicos têm maneiras extras de ajudar, por meio das manobras ventilatórias conhecidas por “resgate”. “Aumentamos a pressão positiva, que é a entrada do oxigênio no corpo, para aumentar o alcance do oxigênio aos alvéolos inflamados, visando melhorar a superfície da troca gasosa. Além disso, tem a posição prona, no qual colocamos o paciente de barriga para baixo, pois isso melhora a troca gasosa. Essa manobra é a chamada de pronação, para melhorar a oxigenação e recuperar o doente”, diz o médico.

A falta de oxigênio no organismo pode levar a uma falência múltipla do órgãos. “Pessoas com comorbidades e com deficiência imunológica têm defesas mais lentas e o problema se acentua. Por isso, o caminho é mais longo e esburacado na tentativa de melhora para eles”.

É possível compartilhar um ventilador mecânico?

Com mais pacientes do que ventiladores, alguns locais na Itália acabaram optando por usar um respirador para dois pacientes. Em Nova York, nos Estados Unidos, o governador Andrew Cuomo disse que, mesmo não sendo o ideal, o estado iria permitir a prática, pois estava “sem opção”.

Ainda sem estudos clínicos que comprovem a prática, o uso de um aparelho por duas pessoas não é aprovado no Brasil. Além de não ser possível personalizar os parâmetros para mais de um paciente com um único aparelho, não se pode monitorar a piora ou a melhora da pessoa quando mais de um o utiliza.

Segundo Oliveira Filho, nenhum dos seis especialistas brasileiros que participaram de um webinar na última terça-feira (31) recomenda essa prática no momento. “Imagine você colocar uma pessoa de 1,80 m ao lado de outra de 1,50 m, com pulmões diferentes. São tamanhos e necessidades de oxigênio distintas. A sociedade americana de UTI também se posicionou contra a prática. Seria só no último dos últimos dos casos, mas hoje ninguém recomenda”, afirma.

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