Um livro com cara de Velho Oeste e perfeito para debater a história dos curitibanos. Com um tema polêmico, o jornalista André Rogal lançou no último mês de outubro, o “Era uma vez em Curitiba”, uma obra que promove um estudo crítico sobre o passado, certo ponto desconhecido, da capital.
Em uma conversa com a Tribuna do Paraná, André Rogal, autor também dos livros “Túneis de Curitiba – Verdades e Mitos sobre os subterrâneos da capital paranaense” e “Cruz Machado – Os mistérios da vida noturna de Curitiba”, o jornalista acredita que algumas leis impediram o ensinamento mais preciso sobre a história dos primeiros habitantes da cidade.
“Durante todo o século XIX, Curitiba passou por diversos momentos de tensão e isso não foi ensinado nas escolas com a narrativa oficial. O estudo sobre o processo civilizatório em Curitiba, com alguns apontamentos de leis que, por exemplo, proibiram ao longo tempo bailes, música, vestimenta, lazer, espaços de convivência, processos e julgamentos que ocorreram no contexto da Revolução Federalista interferiram nos hábitos”, disse André.
Entrevista com o autor de “Era uma vez em Curitiba”
Confira abaixo, mais detalhes da obra e informações de preço e onde encontra o “Era uma vez em Curitiba”.
Tribuna do Paraná: Qual a explicação para o sumiço dos hábitos de vida dos primeiros habitantes de Curitiba?
André Rogal: Durante todo o século XIX, Curitiba passou por diversos momentos de tensão e isso não se aprende nas escolas e na narrativa oficial. Desde independência do Uruguai, à Guerra dos Farrapos, Emancipação política do Paraná, Guerra do Paraguai e Revolução Farroupilha. Todos estes eventos repercutiram politicamente em nossa cidade, havia um receio de que houvesse uma ligação de Curitiba com outros povos ao Sul, e isso acarretasse em riscos para a Ordem Federal. Então, a forma de fazer esse controle foi pelos costumes. Muitos dos costumes que hoje consideramos gaúchos, são historicamente curitibanos. Parte das elites locais modernizam seus costumes e a criam a ideia cada vez mais vinculada à Ordem e Progresso, e o curitibano como um tipo civilizado, urbano e ordeiro. E, do contrário, os costumes sulistas como retrógrados e inimigos.
Tribuna do Paraná: Você acha que esse fator resultou em alguma particularidade do curitibano?
André Rogal: Totalmente. O curitibano carece de senso de passado histórico. Vivemos em uma cidade de mais de 330 anos que tem como elemento cultural a capivara. Festejamos a cultura dos imigrantes, mas é importante lembrar que os imigrantes chegaram aqui na metade final do século XIX, então mais da metade da história de Curitiba é esquecida pelo seu povo. O curitibano histórico possuí grande importância na construção da cultura sulista, como demonstra principalmente a obra de Roselys Roderjan Velloso. Mas nós não valorizamos, não possuímos em nossos festivais folclóricos sequer um grupo que represente esta cultura. Por outro lado, observamos que estes hábitos estão no subconsciente das pessoas mais humildes, nos bairros e Região Metropolitana, no gosto pelo chimarrão, pela estética campeira, pelo gosto pela música gauchesca, entre outros. A verdade está no povão.
Tribuna do Paraná: As leis da época interferiram de que forma nos hábitos?
André Rogal: É um estudo sobre o processo civilizatório em Curitiba, com alguns apontamentos de leis que por exemplo proibiram ao longo tempo bailes, música, vestimenta, lazer, espaços de convivência, processos e julgamentos que ocorreram no contexto da Revolução Federalista. Ou seja, não se trata de uma mera modernização de costumes, mas de um interesse do Estado em direcionar o comportamento das pessoas em um período de consolidação da unidade federal. Está tudo bem contextualizado para que todos possam ler, não apenas público jurídico. É um livro de leitura acessível.
Tribuna do Paraná: O livro é um resgate cultural com cara de Velho Oeste?
André Rogal: O livro inicialmente iria ter um título longo e mais técnico, mas a ideia de trazer um pouco de cultura pop e brincar com os filmes de Sérgio Leone foi uma forma de aproximar o discurso dele de todas as pessoas. Ele faz referência ás histórias de dois filmes que gosto muito, “Era uma Vez no Oeste”, em que o tipo cultural daquele contexto começa a sumir por ser um inconveniente à modernização dos Estados Unidos. Mas ele também faz referência a “Era uma vez na América”, do mesmo diretor, em que ele conta uma história dos bastidores da modernização de Nova York, em que grupos marginalizados de rua (gangster judeus no filme), também começam a serem apagados da narrativa oficial. Neste sentido, tem um estilo parecido com “Gangues de Nova York” do Scorsese também. Eu sou graduado em Direito e Jornalismo, então tentei trazer algo mais técnico, mas não abrir mão de meu lado mais artístico como jornalista.
Onde adquirir o livro
O livro custa R$ 70, e está disponível para vendas na Matteria Sapeco, na Rua 24 Horas, e no site da editora. A obra é impressa pela Editora Tirant Lo Blanch e conta com prefácio do pesquisador e ex-procurador de Justiça Nilo Bairros de Brum.