A vacina que deu início à imunização contra Covid-19 no Brasil e chegou a 85% das doses aplicadas em março, agora tem menos de 10% das aplicações –e não deve ser comprada pelo governo federal no próximo ano.

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A Coronavac alcançou o braço dos brasileiros em janeiro. Foi o imunizante mais ministrado até abril contra Covid-19, com quase 40 milhões de doses aplicadas nesse período. Isso significa que idosos, profissionais de saúde, indígenas e outros grupos prioritários foram os principais vacinados com o imunizante produzido pelo Instituto Butantan por meio de um acordo com a farmacêutica chinesa Sinovac.

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A partir de maio, no entanto, a Coronavac começou a perder participação nas vacinas aplicadas no país contra a doença causada pelo coronavírus. Agora, de acordo com o Ministério da Saúde, os imunizantes eleitos para combater a pandemia em 2022 são Pfizer e AstraZeneca — e nada de Coronavac.

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“As duas vacinas foram escolhidas por terem o registro definitivo na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e a aprovação por parte da Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS)”, diz a pasta federal em nota.

Trocando em miúdos: o governo federal não pretende comprar Coronavac para aplicação no ano que vem –o que tem preocupado especialistas.

A principal questão é que a vacina do Butantan pode ser uma opção para a imunização de crianças abaixo de 12 anos, que deve ter início no ano que vem após aprovação da Anvisa. “Se a Coronavac licenciar para crianças, o governo federal vai deixar de comprar?”, questiona o virologista Maurício Lacerda Nogueira, professor da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto.

Por enquanto, apenas a vacina da Pfizer foi aprovada pela Anvisa para crianças acima de cinco anos, na última quinta (16). A dosagem será menor do que aquela já utilizada para maiores de doze anos.

Só que as doses infantis ainda não foram compradas pela gestão do presidente Jair Bolsonaro (PL). Na sexta (17) o governo paulista chegou a encaminhar um ofício à Pfizer comunicando o interesse na compra das vacinas, mas a empresa disse que só negocia com o governo federal.

Já a Coronavac está em avaliação pela Anvisa para aplicação na faixa etária de três a 17 anos. O Butantan entregou uma nova solicitação à agência na quarta (15). A agência tem o prazo de 30 dias para avaliar a solicitação.

O pedido anterior, feito em julho, ficou emperrado por falta de dados. Países como China, Chile, Equador e Indonésia usam a Coronavac para crianças e adolescentes.

Para o imunologista Gustavo Cabral, pesquisador da USP com investigações no desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19, não podemos “aposentar” a Coronavac justamente por causa da demanda de imunização de crianças e de adolescentes.

“Na luta contra a pandemia, quanto mais somarmos, melhor será o resultado”, diz. “A Pfizer é uma ótima vacina, mas nunca é bom depender de uma única arma, se podemos ter várias que se completam.”

Além de não comprar mais Coronavac para o ano que vem, o Ministério da Saúde recusou recentemente 15 milhões de doses, que estão paradas na fábrica do Instituto Butantan. Depois da negativa federal, o governo de São Paulo anunciou que iria reservar parte dessa sobra para aplicação em crianças e adolescentes –quando isso for aprovado.

De acordo com o Ministério da Saúde, o Instituto Butantan já cumpriu a entrega contratual de 100 milhões de doses da vacina Coronavac. Até o final de novembro, 82,4 milhões de doses da Coronavac tinham sido aplicadas no Brasil na população acima de 18 anos. Isso significa 28,63% de todas as doses –primeira, segunda e doses únicas –ministradas desde janeiro.

Em maio, a Coronavac foi ultrapassada pela Astrazeneca, que chegou a 70% das imunizações naquele mês. Depois, perdeu também para Pfizer, que se tornou o principal imunizante contra Covid-19 a partir de agosto.

Para se ter uma ideia, em novembro, 8 em cada 10 doses contra Covid-19 aplicadas no Brasil foram da Pfizer (considerando primeira e segunda doses, além de dose única). Já a Janssen, que começou a ser aplicada em junho com dose única no país –e teve um pico de doses no mês seguinte–, não chega a 2% de todas aplicadas contra Covid-19 até o final de novembro.

Em nota à reportagem, o governo do estado de São Paulo diz que a “Coronavac é uma vacina segura e eficaz e integra um grupo de imunizantes fundamental para salvar vidas”, mas não se pronunciou especificamente sobre o anúncio de que a vacina não será adquirida pela pasta federal em 2022.

Afirma ainda que “diante da inércia do governo federal, mobilizou estratégias junto ao Butantan para garantir imunizantes e a imunização dos brasileiros. Também de forma pioneira ocorreu o início da vacinação de grupos prioritários no Brasil ainda em janeiro, que só foi possível por esforço do Governo de São Paulo imediatamente após a aprovação da Anvisa para o uso emergencial da Coronavac”.

De todos os estados, São Paulo teve a maior participação da Coronavac de janeiro até o final de novembro: a vacina representou 34,1% das doses aplicadas.

Já o Butantan disse, em nota à reportagem, que “a produção de vacinas seguirá um planejamento que será acordado com o Ministério da Saúde de acordo com as demandas do país”. Também reforçou anúncio feito na última terça (7), em evento com a Sinovac, de que a Coronavac será atualizada contra a variante ômicron. A ideia é que a nova versão da vacina esteja disponível em três meses.

O retrato da distribuição da vacinação contra Covid-19 por fabricante foi tabulado pela reportagem diretamente no DataSUS (sistema de informações do Ministério da Saúde). Isso foi feito antes de o sistema sair do ar nesta sexta (10) por causa de um ataque hacker.

O DataSUS identifica todas as pessoas imunizadas com um código individual, acompanhado de informações sobre idade, grupo prioritário de vacinação, data da imunização e lote da vacina recebida.

Foram tabuladas todas as primeiras e segundas doses e doses únicas aplicadas desde o início da campanha vacinal no país, em janeiro, até o último dia de novembro.

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