Vida volta ao normal depois da bala perdida

A tarde do dia 19 de novembro de 2004 vai ficar marcada na vida do médico veterinário e professor universitário Luiz Felipe Caron. Enquanto aguardava para fazer um retorno na BR-476, no bairro Umbará, em Curitiba, ele foi vítima de uma bala perdida. Até hoje Caron não sabe quem foi o autor do disparo que atingiu sua cabeça, mas sabe que o fato serviu para ele ter uma nova visão da vida.

Aquela sexta-feira parecia outra qualquer. Caron saiu da Universidade Federal do Paraná, onde é professor do curso de Medicina Veterinária, e foi levar os filhos de 3 e 6 anos para a natação. "Quando parei para fazer a volta na rodovia, comecei a escutar o barulho dos tiros. A minha primeira reação foi pedir para meus filhos se abaixarem", conta. Ele lembra que, quando o barulho diminuiu, viu um carro sendo perseguido pela polícia, e logo deduziu que se tratava de um assalto. Foi nessa hora que Caron foi baleado na cabeça.

O médico veterinário lembra que o motorista do carro que estava atrás foi prestar socorro, e ele pediu que ligasse para uma irmã vir buscar as crianças. "Apesar de estar ferido, fiquei lúcido e ainda peguei o celular e pedi para não avisar minha esposa", comenta. Em seguida Caron foi levado para o Hospital do Trabalhador, onde ficou internado por mais de um mês, 13 dias em coma.

"Depois da cirurgia ninguém sabia o que iria acontecer, pois o lado do cérebro atingido poderia comprometer a motricidade. Mas felizmente já estou conseguindo voltar à minha vida normal", disse. Caron se submete a sessões de fisioterapia diárias, e acredita que a dedicação da família e dos amigos foram essenciais para sua recuperação. Nesta semana, Caron voltou às aulas na universidade, e diz que tudo o que passou até hoje só fez reforçar a necessidade de investir na família. "Os valores hoje são outros. Sei que o que aconteceu comigo poderia ter acontecido com qualquer pessoa. Mas espero que eu sirva de exemplo para a necessidade de trabalharmos para acabar com a exclusão social, o grande gerador da violência", finalizou.

Esposa clama por providências

A esposa de Luiz Felipe, Roseli, divulgou uma carta de agradecimento àqueles que colaboraram para a recuperação do marido. Em relação ao desconhecido que atirou contra o marido, ela pede apenas que "Deus entre no coração desta pessoa". Reproduzimos trechos da carta, intitulada "O milagre da vida":

"Foi um tiro errado para a pessoa errada…Segundos que levaram para você ler esta frase foram suficientes para transformar a vida de toda nossa família. Até então, tínhamos uma vida completamente feliz. Moramos distante deste corre-corre infernal, procurando manter um ritmo de vida coerente com nossa filosofia de vida e para o crescimento de nossos filhos. Ele, uma pessoa maravilhosa, o homem que escolhi para viver ao meu lado por toda minha vida, para ser pai dos nossos filhos, amigo e companheiro para todas as horas. Seu lema, que tinha consigo e procurava fazer isso todos os dias, era fazer a bondade sem esperar nada em troca, que como conseqüência, a felicidade viria naturalmente, e vinha. Um profissional hipercompetente, que busca ser o melhor no que faz, e consegue, graças à sua inteligência. Como professor de uma universidade federal, cargo que conseguiu com muita dedicação, vivia se empenhando para colocar seus alunos em um bom estágio, proporcionar-lhes a oportunidade de desenvolver uma boa pesquisa, desviando horas que poderia até passar em casa com sua família para grupos de estudo com seus alunos. Uma pessoa de bem com a vida, tudo estava bom e parecia fazer seu dia render bem mais que as 24 horas normais (…) Possuía uma garra para conquistar seus objetivos que servia como exemplo de vida. Seu mestre e guia costumava dizer que "Caron tem muito neurônio". Mas tudo mudou. A inconseqüente atitude de uma pessoa, que disparou uma arma em pleno dia, em um lugar repleto de pessoas voltando do trabalho, na presença de nossos dois filhos (…) quase consegue dar fim a toda essa história de vida que lhes repassei. Uma bala "perdida" o atingiu na cabeça (…). Toda noite tento contornar este trauma das crianças com meu amor de mãe, acolhendoos em minha cama. Mas não está sendo fácil.

Tento abrir isso a vocês, pois isso é a minha vida, a nossa vida, a nossa história, para ver se sensibilizo as autoridades responsáveis por fazer algo, e não falar como mais um discurso político. Faço isso na tentativa de que tomem uma providência, pois daqui um tempo isso será esquecido, e não é justo termos que conviver encarando um fato como esse com normalidade (…).

Queria lhes dizer que a justiça está sendo feita com a luz divina, pois Deus nosso Senhor nunca nos abandonou, em momento algum (…).

Seria, com certeza, injusto citar os nomes de todas essas pessoas que, de uma forma ou de outra, direta ou indiretamente, nos ajudaram a chegar até aqui. Desde os médicos, enfermeiros, familiares, amigos próximos e distantes, nossos alunos e amigos de trabalho, e até mesmo desconhecidos que se sensibilizam com a situação e acabam nos transmitindo muita força positiva, seja através de pensamentos ou orações (…).

Peço apenas a Deus para entrar no coração desta pessoa que disparou esta arma, que lhe ensine o que é amor, que lhe mostre o verdadeiro caminho para o encontro de Deus, e pedir para que se coloque no lugar de uma pessoa de boa índole, justa, com excelentes princípios, trabalhadora e muito bem amada. Com certeza, você verá que ninguém merece passar por essa dor, e nenhuma pessoa deste mundo tem o direito de tirar a vida de outra ou mesmo julgá-la. Que Deus tenha piedade desta pessoa e consiga resgatá-la para o caminho do bem.

Hoje trago feliz esta mensagem a todos vocês, e divido minha certeza, desde o início de que tudo iria dar certo, pois nosso amor é muito grande e forte para nossa história acabar aqui. Deus me deu este presente e Lhe agradeço todos os meus dias.

Deixo aqui, do fundo do meu coração e com muito carinho, meu muito obrigada a vocês, que para sempre serão nossos amigos.

Muito obrigada !!!"

Roseli Frota de Moraes Salles e família

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