Pesquisa inédita sobre o uso de drogas no Brasil, divulgada ontem no Palácio do Planalto pela Senad (Secretaria Nacional Antidrogas), revela que 19,4% da população já fizeram uso de algum tipo de droga pelo menos uma vez na vida, excluindo o cigarro ou o álcool. O percentual equivale a um contingente de 9,1 milhões de pessoas que já experimentaram entorpecentes como maconha, cocaína, crack e outros.
Na Região Sul apareceram as mais altas porcentagens de dependentes de tabaco e de maconha, em relação às outras quatro regiões do País. De acordo com a pesquisa, no Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, 1,6% da população é dependente de maconha.
Também no Sul, o uso de maconha ou cocaína pelo menos uma vez na vida foi mais alto que no resto do Brasil – 8,4% da população para maconha e 3,6% para cocaína.
Cigarro e bebida
A pesquisa revela ainda que 11,2% da população brasileira, ou 5,2 milhões de pessoas, são dependentes de álcool; e 9% de tabaco (4,2 milhões de brasileiros).
Ao comentar os resultados da pesquisa, o chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, general Alberto Cardoso, afirmou que os dados sobre o consumo de drogas no Brasil não podem ser considerados tão alarmantes se comparados a de outros países.
Segundo o general, em relação à cocaína, droga que mais preocupa o governo, o percentual de pessoas que utilizaram a droga apenas uma vez na vida chega a 2,3%, enquanto em outros países chega a 19,4%.
Repressão
Em relação ao crime organizado, ele disse que deve ser enfrentado com inteligência e repressão. Lembrou que a política nacional antidroga foi aprovada há três anos e que é preciso diferenciar o usuário e o dependente do traficante. Na opinião do general, o dependente não deve ser visto como criminoso, mas como doente que precisa ser tratado. “Não há porque encarcerá-los porque seria permitir que fizessem uma pós-graduação nas drogas”, ressaltou. Ele acredita que daqui a duas ou três gerações a democracia possa permitir a descriminalização da droga.
Ontem, na cerimônia de abertura da IV Semana Nacional Antidrogas, o presidente Fernando Henrique Cardoso defendeu uma política de ‘tolerância zero’ para os crimes relacionados ao tráfico de drogas.
Iniciada Semana Antidrogas
A Semana Nacional Antidrogas, lançada ontem pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, prevê uma série de atividades ligadas ao assunto, no Distrito Federal e em diversos Estados do País.
A Senad (Secretaria Nacional Antidrogas), vinculada ao Gabinete da Presidência da República, é responsável pela programação da semana em Brasília. No website da Senad, estão listadas as atividades em Estados como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Acre, Santa Catarina, Amazonas, Rio de Janeiro e São Paulo, entre outros. O Paraná não aparece no site da Senad.
De acordo com a assessoria de imprensa da Senad, o órgão apenas estimula e apóia a realização de eventos da Semana Antidrogas nos Estados, mas não se responsabiliza pelas atividades fora do Distrito Federal.
O Conen (Conselho Estadual de Entorpecentes) do Paraná não forneceu informações a respeito do assunto. Durante toda a tarde de ontem, o telefone do Conen em Curitiba não atendeu.
Atividades
Em Brasília, de hoje até a próxima quarta-feira, estão agendadas entregas de prêmios para pessoas que contribuíram com o combate ao uso de drogas, exposições, debates, desfiles de modas, performances teatrais, seminários e eventos esportivos.
Na próxima quarta-feira, dia 26, Dia Internacional Contra o Abuso de Drogas, haverá incineração de entorpecentes em todo o País. A queima de drogas será coordenada pelas superintendências regionais da Polícia Federal. (BM)
Paraná entre os líderes do vício
Somente este ano a Polícia Federal apreendeu em Curitiba 838 quilos de maconha, 120 quilos de cocaína e 2,5 quilos de haxixe, efetuando 25 prisões em flagrante de traficantes. No ano passado foram apreendidas 18 toneladas de maconha e 78 quilos de cocaína e realizada quase meia centena de prisões. Mesmo assim, o trabalho da PF – principal responsável pelo combate ao tráfico de drogas no País – não impediu que o Paraná figurasse como um dos Estados brasileiros com maior número de usuários de entorpecentes, conforme indica o relatório divulgado ontem pela Secretaria Nacional Antidrogas (Senad), em Brasília. Ontem, durante a apresentação do relatório e abertura da IV Semana Nacional Antidrogas, o presidente Fernando Henrique Cardoso defendeu uma política de “tolerância zero” para os crimes relacionados ao tráfico de entorpecentes.
Ao mesmo tempo em que as estatísticas apontam para um considerável aumento de usuários – que são aqueles que movimentam a máquina do tráfico e conseqüentemente alimentam o crime organizado – autoridades defendem a descriminalização do uso, ou seja, o viciado teria o direito de ser submetido a tratamento médico e não ser considerado um criminoso. Na prática isso já acontece há algum tempo, desde que as pessoas presas com pequenas quantidades de droga passaram a ser apenas ouvidas nas delegacias em um termo circunstanciado, ao invés de serem indiciadas em inquérito no artigo 16 da Lei Antitóxicos.
Apenas o artigo 12 da mesma Lei, que prevê pena para o tráfico, continua a ser usado quer no âmbito estadual quer no federal. Mesmo assim a pena mínima prevista por ele é de apenas 3 anos de reclusão, mesmo que o traficante tenha sido apanhado com 50 quilos de cocaína ou 200 quilos de maconha. “Se o traficante for primário e tiver direito a receber a pena mínima é isso que acontecerá, pois se for condenado a mais o advogado recorre e a condenação é reduzida”, explica o delegado Maurício Valeixo, chefe da Delegacia de Prevenção e Repressão a Entorpecentes da Polícia Federal do Paraná.
Cenário mundial
De acordo com Valeixo, o Brasil se enquadra no cenário mundial das drogas, já que todos os países estão tentando impedir o crescimento desta praga e poucos têm obtido sucesso. Citando os Estados Unidos, ele lembra que o governo americano tem aplicado bilhões de dólares para tentar combater o tráfico na Colômbia e no Peru, já que em seu próprio território tem encontrado dificuldades para impedir a entrada dos mais diferentes tipos de entorpecentes. E a preocupação com o problema é tão grande que os mesmos Estados Unidos também liberam verbas para outros países – inclusive o Brasil- através de organismos de auxílio internacional, para lutar contra traficantes.
O fato de o Brasil estar com uma moeda estável – pelo menos aparentemente – também contribui para que os traficantes invistam mais no País, trazendo mais drogas, já que dá para ganhar mais. “Se não houvesse dinheiro para pagar, eles não trariam tanto entorpecente para cá”, lembra o policial, salientando que o quilo de cocaína no Brasil é vendido de R$ 12 mil a R$ 15 mil. Já no Japão, onde é muito mais difícil de entrar, o quilo do produto varia de 70 a 80 mil dólares.
Os caminhos do narcotráfico
A extensão territorial brasileira e os milhares de quilômetros de fronteiras secas com o Paraguai – um dos grande produtores de maconha da América do Sul -, a Bolívia e a Colômbia – considerados os maiores produtores de cocaína – colocam o Brasil em posição estratégica para os traficantes. “É difícil fiscalizar tudo isso, a droga entra por vários pontos”, explica o delegado Maurício Valeixo, da Polícia Federal. O Paraná, também por questão de fronteiras, transformou-se em rota do tráfico. Por aqui passam as drogas que vão para Santa Catarina e Rio Grande do Sul e também para o Sul de São Paulo, onde existem vários pontos de distribuição para o restante do País.
“Geograficamente o Paraná está no olho do furacão”, lembra Valeixo. Em função disso são realizadas operações especiais em áreas de fronteiras e também nos municípios do interior que resultam em algumas apreensões significativas sob o ponto de vista da polícia, mas provavelmente insignificantes para os traficantes e produtores das drogas. No ano passado, em Maringá, Guaíra, Foz do Iguaçu, Londrina, Guarapuava e Paranaguá foram apreendidos 110 quilos de cocaína, 4 toneladas e meia de maconha, 6 quilos e 850 gramas de haxixe e 3 quilos e 887 gramas de crack, além de 4 quilos de pasta base de cocaína e algumas centenas de frascos de lança perfume.
Otimismo
Apesar das dificuldades enfrentadas, a Polícia Federal demonstra um certo otimismo no combate às drogas. Valeixo diz que as estatísticas indicam que o trabalho está tendo resultado positivo, havendo um crescimento nas apreensões. “Estamos trabalhando como novos equipamentos, outros meios e mais condições”, diz ele, concordando porém que o tráfico também aumentou, daí acontecerem apreensões maiores. Mato Grosso do Sul aumentou a repressão nos últimos anos, fazendo com que os traficantes procurassem novas rotas no Paraná, que se transformou em Estado de passagem, pois a maior parte da droga não fica aqui.
O auxílio da população no combate ao tráfico também é considerado de fundamental importância para a polícia, quer Civil, Militar ou Federal. Todo traficante deve ser denunciado. “Nós recebemos as denúncias pelo telefone 362-2313, mas fazemos uma filtragem das informações para buscar o grande traficante. O pequenos, que atuam mais no varejo, devem ser procurados pela Polícia Civil, que também tem autonomia para o combate às drogas”, afirma o delegado federal. Sempre que um “peixe grande” é apanhado, desmobiliza uma pequena rede de traficantes e às vezes o inverso pode ser verdadeiro, pois a prisão de um pequeno vendedor também pode levar à localização de um fornecedor “de peso”. O ideal é que as polícias trabalhem de forma organizada e com troca de informações para lutar contra este tipo de crime que é um exemplo de organização em qualquer país do mundo. (MC)
