Tumulto na sessão da CPMI da Terra

Muita confusão e tumulto marcaram a audiência pública realizada ontem em Curitiba pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Terra. Deputados e senadores que integram a CPI se reuniram na Assembléia Legislativa para ouvir envolvidos no escândalo da formação de milícias armadas para combater sem terra na região de Ponta Grossa.

O tenente-coronel da Polícia Militar Valdir Copetti Neves foi convocado e resolveu falar pela primeira vez, desde sua prisão em 13 de abril, durante a operação "Março Branco", realizada pela Polícia Federal (PF). Neves, que é acusado de chefiar a suposta milícia disse que está sendo vítima de perseguição política. Antes de começar a responder as perguntas dos parlamentares, Neves – que chegou fardado à Assembléia – teve o direito de falar o que queria. A atitude irritou alguns integrantes da CPMI, que consideraram absurda a possibilidade de Neves "discursar". "Ele foi chamado aqui para ser ouvido e não fazer discurso político", disse o senador Sibá Machado (PT-AC).

Neves falou sobre o trabalho que exerceu em prol do Paraná, listou condecorações recebidas e citou dossiês elaborados para comprovar a perseguição política que estaria sofrendo. "Fui preso por uma saga política porque sou defensor da propriedade, a favor dos que pagam e não dos que tomam. Não sou contra e nunca persegui sem terra. Sou contra a liderança criminosa do MST", disse.

Neves afirmou que sempre foi um estudioso do problema agrário e que "sabe diferenciar os que querem trabalhar dos que apenas querem tomar dinheiro". Ele acusou as lideranças do MST de usarem os assentados como "massa de manobra" para tomar o poder.

O coronel disse que a prisão foi motivada por perseguições políticas. Ele acusou o secretário estadual de Segurança Pública, Luiz Fernando Delazari, de persegui-lo e o secretário estadual do Trabalho, Emprego e Promoção Social, padre Roque Zimermann, de cobrar "pedágio" de assentados e repassar o dinheiro ao MST. "Tenho tudo documentado através de investigações que fiz e informações anônimas que recebi", disse. Ao ser questionado pelos parlamentares, Neves se reservou ao direito de não falar.

Defesa

Zimmerman disse que as acusações feitas contra ele são "ridículas, injuriosas e sem fundamento". O secretário, que passou o dia em Foz do Iguaçu, disse que iria se informar melhor sobre o teor das acusações feitas por Neves e pretende falar mais sobre o assunto hoje, durante entrevista coletiva.

Já Delazari, informou – por meio de nota oficial – que o coronel Neves fez uso "da mais antiga e medíocre das táticas" ao partir para o ataque durante seu depoimento à CPMI. Delazari afirmou que as acusações do militar não merecem crédito e que já está tomando providências para processar o tenente-coronel por injúria, calúnia e difamação, além do dano moral.

Roberto Baggio, coordenador do MST no Paraná, também rebateu as denúncias de Neves e disse que não passam de tática para desviar o foco dos crimes cometidos por ele. "Neves é um alto funcionário do Estado e desde os anos 90 persegue o MST. Há 15 anos denunciamos as violações cometidas por ele, patrocinadas por fazendeiros, pessoas do governo, do judiciário. Com a prisão dele, cai uma peça importante desta articulação política criada no Paraná para combater a ação do MST".

Assessor de deputado preso por desacato

O superintendente da PF, Jaber Saadi, também compareceu à audiência. Ele explicou que o trabalho da PF foi realizado em conjunto com a Secretaria de Estado da Segurança Pública a pedido do governador Roberto Requião, que queria combater o crime organizado. "Foi através da descoberta do contrabando de armas que chegamos até as milícias em Ponta Grossa." Saadi confirmou também que foram usadas escutas telefônicas autorizadas pela Justiça nas investigações.

Saadi se reservou ao direto de não responder às outras questões, alegando que o inquérito está sob segredo de Justiça. Por conta disso, Saadi foi convidado a falar com os parlamentares em sessão reservada após a finalização dos trabalhos. O tenente-coronel Neves, que também apelou para o direito de permanecer calado, também foi chamado para falar em sessão sigilosa.

Propriedade

O relator da CPMI, deputado João Alfredo (PT-CE) perguntou a Neves sobre a propriedade da fazenda que tem em Ponta Grossa. Neves disse comprou a terra e que tem o contrato comprovando. "Está correndo um processo na Justiça Federal, requerendo o usucapião. Tenho a posse justa, mansa e pacífica da terra". Alfredo pediu a certidão da terra e disse que não é possível pedir posse de terrenos públicos, conforme a Lei Federal, uma vez que a fazenda de Neves fica numa área de propriedade da Embrapa.

A desocupação da fazenda Santa Gertrudes, em 9 de julho de 1998, também foi lembrada na audiência. Neves chefiava o Grupo Águia na época e comandou a operação, considerada uma das mais violentas já realizadas no Estado. O coronel não quis responder.

Briga

Quando o senador Sibá Machado voltou a reclamar do comportamento de Neves, ao se recusar a responder as questões e alegar perseguição política, o assessor do deputado estadual Plauto Miró gritou do fundo da sala, chamando o senador de "cabeça chata". Foi o que bastou para armar a confusão. Houve muita discussão, gritaria e empurra-empurra. Emílio Alfredo Ribas foi preso pela PF por desacato e injúria qualificada.

Trabalhos serão prorrogados

O depoimento do coronel Neves se estendeu por mais de três horas. Ao lado de familiares do militar, estavam Celina e Beatriz Abage, que acusam Neves de tortura na época do processo para investigar a morte do menino Evandro. Os parlamentares brigavam entre si sobre o suposto tratamento privilegiado conferido a Neves. Este, por sua vez, ria, irritando o relator, deputado João Alfredo, que disse que Neves estava desdenhando a CPI.

"Temos indícios muito fortes de que se trata de uma pessoa reacionária, verdadeiro militante da causa dos ruralistas. Já solicitamos à PF o inquérito e vamos investigar a fundo o caso. É clara a estratégia dele de incriminar ao invés de responder as questões, para não cair em contradição."

Senador Álvaro Dias, presidente da comissão, disse que as denúncias feitas por Neves são graves e não poderão ficar impunes. Tanto Delazari como Zimmerman serão chamados para prestar esclarecimentos à CPMI. "Foram levantados diversos fatos novos e relevantes e vamos pedir a prorrogação dos trabalhos", disse.

Até o início da noite de ontem, a CPMI não havia escutado todos os convocados. Foram chamados o coordenador da Comissão Pastoral da Terra no Paraná, Dom Ladislau Biernaski, e o empresário Cecílio do Rego Almeida. O presidente da UDR no Paraná, Marcos Prochet.

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