Quatro policiais militares, lotados no 12.º Batalhão, são acusados de ter torturado e matado o disk-jóquei (DJ) Cléverson Guimarães Pinheiro, 26 anos, dentro de sua residência, na Rua 25 de Abril, Vila Nori, Pilarzinho, às 21h30 de quinta-feira. De acordo com a esposa e colegas da vítima, que também sofreram agressões dos PMs, Cléverson foi agredido e asfixiado com um saco plástico e morreu antes de ser encaminhado por um viatura do Siate ao Hospital Evangélico.
Para piorar a situação, os PMs também são acusados de tentar implantar evidências (pequena quantidade de maconha) no local do crime, para justificar a abordagem e a ação truculenta. Os quatro PMs já foram identificados e afastados de suas funções de rua, segundo o Comando do Policiamento da Capital (CPC) da Polícia Militar.
Suspeita
Duas viaturas patrulhavam a região, quando os PMs abordaram duas garotas que carregavam pequena quantidade de maconha. Indagadas sobre a origem da droga, elas teriam informado que compraram de um homem conhecido por Cléverson, o "Bolacha". Diante de tais informações os policiais fizeram buscas e localizaram a residência onde "um Cleverson" residia. A partir daí, teve início uma seqüência de irregularidades por parte da polícia.
Na versão apresentada pelas vítimas – cujos nomes não serão divulgados por segurança – os PMs quebraram o muro que divide a residência de Cléverson com um matagal e invadiram o terreno. Ao ouvir o barulho, o DJ saiu de sua moradia para verificar o que estava acontecendo e foi surpreendido pelos policiais. O cachorro que toma conta da moradia foi defendê-la e recebeu um tiro. Em seguida, Cleverson foi algemado e levado para dentro de casa.
Agressão
Na moradia estavam a esposa de Cléverson e mais cinco colegas, além de três crianças (5, 6 e 7 anos), reunidos para ouvir música e conversar. O clima de festa entre os amigos foi quebrado pela invasão policial. Segundo relato deles, todos os adultos foram obrigados a deitar no chão e o DJ começou a ser agredido, mesmo estando algemado. De acordo com um dos colegas da vítima, os PMs perguntavam a todo instante: "Quem é o bolacha?" e "Cadê as drogas e a arma?".
Cléverson teria sido levado para o banheiro da residência, onde teve início a sessão de sufocamento. Segundo as testemunhas, os policiais utilizaram um saco plástico para asfixiar o DJ, que teria desmaiado por três vezes.
Morte
No intervalo das agressões contra Cleverson, os demais ocupantes da casa também teria sido agredidos. Toda a ação foi acompanhada pelas crianças, dentre elas os dois filhos do casal. Como os PMs não obtinham respostas e, durante a revista na casa nada foi encontrado, a sessão de tortura contra Cléverson não foi interrompida.
Porém, em determinado momento, a situação fugiu ao controle e um dos policiais entrou em desespero ao ver que o DJ estava desacordado e não respondia aos estímulos. Antes, um dos policiais teria tentado "plantar" maconha na casa e ordenava aos moradores que contassem onde estava o resto das drogas.
O Siate foi acionado e reforço policial também. Enquanto o DJ era atendido pelo Siate e encaminhado ao hospital, os policiais acusados de tortura aproveitaram a presença de outros soldados para escapar da situação, segundo depoimento de uma testemunha.
Conforme os colegas da vítima, o apelido de Cleverson era "Aladim" e entre eles não havia ninguém conhecido por "Bolacha".
Policiais são afastados
Na manhã de ontem, o coronel Avelino José Novakoski, responsável pelo Comando do Policiamento da Capital (CPC), prestou informações à reportagem da Tribuna sobre a delicada situação que envolve quatro de seus subordinados. Segundo o coronel, os acusados já foram afastados de suas atividades operacionais por tempo indeterminado e recolhidos ao quartel, do 12.º Batalhão, para desempenhar funções administrativas. Também foi instaurado Inquérito Policial Militar (IPM) para apurar responsabilidades. "Determinei uma rigorosa apuração das circunstâncias dos fatos e vou cobrar total imparcialidade", afirmou Novakoski.
Para que não haja nenhum tipo de corporativismo, segundo nota divulgada pela Secretaria da Segurança Pública, o coronel convidou a esposa da vítima para que acompanhe pessoalmente as apurações, ou, caso prefira, através de advogado ou de outro familiar. "A família e a população podem ter certeza que, antes de mais nada, o interesse em esclarecer o caso é da própria Polícia Militar", afirmou, segundo a nota.
Oficial
Durante a manhã de ontem, familiares e algumas supostas vítimas dos PMs conversaram com o coronel. A equipe acusada é formada por um aspirante, um cabo e dois soldados. Ontem, os PMs citados iriam prestar os primeiros depoimentos para o IPM. Os policiais afirmaram a seus superiores que apresentam lesões corporais, devido a uma possível luta durante a ocorrência.
O secretário da Segurança Pública, Luiz Fernando Delazari, anunciou que acompanhará as investigações e determinou ao Comando Geral da PM que as apurações sejam feitas com o máximo rigor. "Caso seja comprovado que o abuso foi a causa da morte do rapaz esses homens sentirão o peso da lei. A conduta abusiva de qualquer policial é inadmissível neste governo", disse o secretário.
Cléverson sustentava mulher e filhos como DJ
A atuação truculenta e desnecessária da PM causou indignação nos vizinhos de Cléverson. Alguns deles, inclusive, estavam na moradia quando ocorreu a sessão de tortura. Um amigo do DJ, de 23 anos, relatou que outro comportamento adotado pelos policias chamou a atenção. Enquanto agrediam os ocupantes da casa, os policiais teriam cantado rap, com letras que debochavam das vítimas.
Os vizinhos relataram que a casa de Cléverson era usada como ponto de encontro dos amigos e que, pelo menos uma vez por semana, era realizado um churrasco de confraternização. O DJ também era tido como uma pessoa trabalhadora e responsável por colocar dinheiro em casa e, assim, sustentar a mulher e dois filhos pequenos. Um dos garotos, completa seis anos neste sábado, e já havia uma certa euforia entre a família para a comemoração da data.
Ainda na tarde de sexta-feira, familiares e amigos da vítima realizaram uma manifestação para protestar contra a atuação da PM e pedir justiça e prisão aos responsáveis pela morte do jovem.