Radar multa carro duas vezes no mesmo horário e local

A utilização de radares eletrônicos como forma de educar ou punir motoristas, que infringem as leis de trânsito e abusam da velocidade, às vezes, trazem à tona situações inusitadas. Erros na aferição de radares ocorrem e cabe ao motorista – que se sentir injustiçado – buscar seus direitos. A condutora do veículo Renault Scenic, que será identificada apenas por Vânia, foi uma das vítimas “do erro dos radares” e resolveu denunciá-lo. Contrariando todas as leis da física, o radar flagrou a motorista cometendo uma infração de trânsito na BR-277 e a multou por duas vezes, no mesmo dia e horário, com velocidades diferentes, e conseqüentemente, punições diferenciadas.

De acordo com as multas recebidas, Vânia foi flagrada por um radar eletrônico da Polícia Rodoviária Federal quando passou pelo quilômetro 76 mais 700 metros da referida rodovia, às 17h15 do dia 11 de abril deste ano, município de São José dos Pinhais. Em uma das notificações aparece ela conduzindo seu carro a 97 km/h (velocidade aferida) numa via onde é permitido rodar a 80 km/h. Pela falta, considerada grave, ela deve ser punida com a perda de cinco pontos em sua Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e pagar multa no valor de R$ 127,69, caso não apresente outro condutor.

No mesmo dia, Vânia recebeu mais uma notificação de autuação, onde foi pega transitando a 102 km/h no mesmo local (rodovia e quilometragem) e, inacreditavelmente, mesmo horário. Por essa falta, poderá ser punida com sete pontos em sua CNH, falta gravíssima, e cujo valor da multa a ser paga é de R$ 574,62.

Sem confiança

Situações descabidas como a relatada pela motorista, onde há dualidade de informações e, pior, que envolvem o “bolso” da vítima, colocam a credibilidade e confiabilidade no sistema de autuações (radares) em dúvida. Demonstra, que apenas aceitar a punição (multa) – emitida por equipamentos eletrônicos que cometem erros – é algo a ser questionado.

A emissão das duas notificações – no caso feita pelo Departamento da PRF – contendo dados equivocados também coopera para a falta de uma maior fiscalização no controle das multas. Ficam as perguntas: qual das notificações está correta (se alguma delas está?) e como provar sua veracidade diante de tal falha?

Os radares são equipamentos idealizados com a única função de revelar a velocidade real em que os carros transitam nas ruas, avenidas e rodovias, para que sirvam como prova, caso os motoristas infratores desrespeitem a sinalização vigente nesses trechos. Se o aparelho não consegue desempenhar de maneira exata seu trabalho, ele não serve. Ou então, há uma outra função para os radares além de tentar educar os motoristas paranaenses.

Defesa denuncia “fábrica de dinheiro”

O caso de Vânia está sendo analisado por profissionais de um escritório especializado na defesa de motoristas que acreditam ter sido multados de maneira irregular. De acordo com Carlos Eduardo Macedo, responsável pelo escritório, a notificação aplicada contra a motorista demonstra claramente os equívocos cometidos pelos radares. “Este é um caso excepcional onde comprova a notória falta de aferição dos aparelhos”, disse. Segundo ele, a eficiência dos radares deve ser questionada pelos motoristas, principalmente porque as notificações podem transformar a vida de pessoas que tenham seu dia-a-dia relacionado à prática de dirigir. Um radar desregulado pode emitir multa numa determinada velocidade que não é a real e, essa diferença, de poucos quilômetros numa notificação, pode acarretar na suspensão de uma CNH e, conseqüentemente, prejuízos a pessoas que dependem do carro.

Reclamação

Pelos dados do escritório, vários motoristas estão entrando com pedidos de defesa contra multas emitidas através dos radares da PRF. A principal reclamação é quanto a localização dos aparelhos e da falta de sinalização adequada indicando a presença deles. “Em ocasiões de feriados, devido ao grande movimento, são aplicadas mais de mil multas. Transformaram os radares em fábrica de dinheiro”, completou Carlos.

A Polícia Rodoviária Federal se defende. De acordo com o seu Departamento de Comunicação Social, pela nova legislação, não há necessidade de se indicar, precisamente, com sinalização horizontal ou vertical, o local onde está instalado o radar. No caso dos radares móveis – equipamento mais utilizado pela PRF – não há como informar aos motoristas onde será colocado. Além disso, os radares não são instalados aleatoriamente. São realizados estudos e estatísticas que revelam pontos onde há maior incidência de acidentes e atropelamentos. Próximos desses pontos os equipamentos são colocados.

A assessoria informou, também que existem placas indicativas em toda a estrada da velocidade máxima permitida em seus variados trechos. Quando há mudanças nos limite de velocidade também há placas informando. No caso de Vânia, ela foi flagrada transitando em velocidade superior ao permitido naquele trecho da rodovia (São José dos Pinhais) e por isso foi multada, justifica a PRF.

Aferição em dia

De acordo com a lei, os radares eletrônicos (portáteis ou estáticos) devem ser aferidos pelo Inmetro (órgão responsável para desempenhar essa função) a cada seis meses, pois os aparelhos têm que ser precisos em sua marcação, caso contrário, podem representar danos financeiros a motoristas e a falta de credibilidade do produto. No caso de Vânia, conforme o documento de notificação, o radar que a multou foi verificado pela última vez em 10 de outubro de 2003, exatos seis meses e um dia da data da aplicação da multa e dentro do prazo satisfatório.

A grande “bronca” da motorista é a falta de sinalização do radar. Ela retornava do litoral paranaense pela BR-277, quando foi multada. “Devido ao feriado a estrada estava cheia e não deu para ver a placa de sinalização mostrando que aquele trecho é para 80km/h”, explicou. Segundo ela, a colocação de um radar naquele local da rodovia tem apenas uma explicação: uso de má fé. “No trecho anterior da rodovia o limite permitido era de 110 km/h. De repente, sem uma sinalização adequada, o limite baixa para 80km/h e eles colocam o radar logo nesse ponto. O quê posso pensar a respeito disso?”, pergunta. Ainda conforme a motorista, o fato de ela receber duas notificações que se contradizem demonstra que o equipamento está com defeito. “Caso seja condenada a pagar essa multa, vou entrar com mandado de segurança”, afirmou.

A alteração de cinco quilômetros horários entre as notificações (97 km/h e 102 km/h) representam uma diferença de quase R$ 450,00 na conta a ser acertada. A dúvida que fica é: caso condenada a pagar a multa, qual dos valores prevalecerá: R$ 127,69 ou R$ 574,62?

Erros estão sendo comuns

No ano passado, a Tribuna comprou briga com a autoridade responsável pelo trânsito em Curitiba em várias ocasiões, sendo que, em duas delas, com casos de grande repercussão. Em ambas, comprovou erros no sistema. A matéria intitulada o “Caminhão Voador” denunciava o possível erro de um radar que teria multado (por três vezes) um caminhão por excesso de velocidade em agosto de 2003. As notificações mostravam que o veículo transitou pela Avenida Wenceslau Braz (Portão), uma subida moderada, nas velocidades aferidas de 104 km/h, 118 km/h e 86 km/h, em três dias diferentes e no mesmo ponto.

Diante dos dizeres contraditórios envolvendo o motorista Márcio Antônio Simas e a Diretran, a Tribuna conseguiu agendar um “tira-teima”. No teste, que contou com a presença e supervisão da Diretoria de Trânsito, foi comprovado que o motorista é quem tinha razão e o radar havia marcado errado a velocidade.

A outra matéria colocou em xeque o sistema de apresentação de condutores da Diretran. Denúncias apresentadas à Tribuna indicavam a existência de um possível esquema envolvendo “laranjas” e que permitia aos motoristas infratores que seus pontos de advertência não fossem computados em suas CNHs. Os “laranjas” assumiam as pontuações e livravam os verdadeiros infratores de punição e só descobriam que foram “usados” quando eram notificados pelo Detran com a perda do direito de dirigir.

Depois da matéria, o diretor da Diretran na época, Lanis Randal Prates, admitiu que era crescente o número de fraudes em apresentação de condutores e culpou os escritórios de recursos de infrações como os propagadores das fraudes, solicitando aos motoristas cuidado para não deixar suas habilitações em mãos alheias.

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