Adrianópolis, a 122 quilômetros de Curitiba, é tão calma, que em alguns meses a Polícia Militar não chega a atender mais de cinco ocorrências, a maioria perturbação de sossego. Na madrugada de ontem a tranquilidade deu lugar ao terror. Uma quadrilha acuou a tiros de fuzil os únicos três policiais de plantão, para arrombarem dois bancos em frente ao destacamento da PM, na Avenida Marechal Mascarenhas de Moraes, a principal da cidade. Em cerca de 30 minutos, mais de 100 tiros foram disparados contra o destacamento e uma família que cruzava a cidade, foi feita refém. Ninguém ficou ferido e os bandidos fugiram sem dinheiro, por não conseguir abrir os caixas eletrônicos.

continua após a publicidade

Por volta das 3h45, os bandidos deram as primeiras rajadas contra o destacamento da PM e gritaram da rua, que os policiais não atirassem nem saíssem se não quisessem morrer. Os policiais, munidos com pistolas com 32 tiros cada, ficaram quietos, protegidos nas quinas de paredes. Periodicamente, os bandidos atiravam contra o prédio para evitar que os policiais saíssem. Paredes, portas, janelas e móveis foram perfurados por tiros. Uma viatura e uma Parati e um Fusca apreendidos, que estavam no pátio, também foram atingidos. Cápsulas de calibres 380, 9 milímetros, que são usados em pistolas; 12, para municiar espingardas; e 556, usado em fuzis, foram recolhidos na avenida e no destacamento.

Cigarro

O taxista aposentado Edevor dos Santos, 72 anos, mora bem ao lado do destacamento, e contou que ouviu os estampidos. Mas como teve festa na noite anterior, pensou que fossem fogos de artifício. Os gritos, acreditou que fosse um bêbado, e voltou a dormir. Às 7h30, quando acordou, soube o que aconteceu. Contaram para ele que um dos bandidos ficava escondido atrás de seu Monza, estacionado na garagem, atirando contra o destacamento. “Me falaram que ele gritava dizendo que não queriam machucar ninguém. Que só queriam o dinheiro”, contou Edevor.

continua após a publicidade

Sival Barbosa, 49 anos, mora e tem um bar do outro lado da rua, quase em frente ao destacamento. Naquela madrugada, por causa do frio, não fumou seu cigarro na calçada e preferiu o quintal. Escutou os estampidos e logo desconfiou que o banco pudesse estar sendo assaltado. Pela janela do bar, viu que alguém escondido atrás do poste e percebeu que era uma pessoa atirando contra o destacamento.

Janela

continua após a publicidade

O homem andava de um lado a outro na calçada, até que o morador do sobrado em frente ao bar acendeu a luz do quarto. Quando o morador abriu a janela, o marginal mandou-o voltar para dentro e ficar bem quieto. “Não é nada com vocês. Queremos só o dinheiro do banco”. O morador obedeceu, fechou a janela e apagou as luzes. Enquanto os bandidos atiravam na PM, Sival notou uma van branca parar na rua lateral do bar, mas não conseguiu ver quantas pessoas estavam no veículo, nem a placa.

Apenas dois policiais fariam o plantão daquela madrugada. Mas um PM dormiu lá para viajar na manhã seguinte. Outro policial, hospedado por perto, ouviu os tiros e pelo celular dava coordenadas aos colegas acuados no destacamento. O destacamento até possui câmeras de segurança, novas e aparentemente de boa qualidade. Mas no calor intenso que fez em fevereiro, com sensação térmica perto dos 50 graus, as câmeras pararam de funcionar e não foram consertadas.

Fuga

Os bandidos fugiram sentido Curitiba e abandonaram uma Tucson prata, em Tunas do Paraná, muito provavelmente onde outra parte do bando esperava. Há relatos de que ainda tentaram abordar um caminhoneiro, para derrubar o caminhão na pista e bloquear a passagem, mas sem sucesso. A Tucson tinha sido roubada no Bigorrilho, em Curitiba, no fim da tarde anterior.

Tiroteio no meio da viagem

Átila Alberti
Família passou na avenida, e foi rendida pelos marginais.

Adrianópolis fica na divisa com São Paulo, à margem do Rio Ribeira. Sobre a ponte, os marginais espalharam ouriços, pregos embolados, para furar pneus de carros e evitar apoio de policiais de Ribeira, cidade paulista da outra margem. De lá veio a família que foi feita refém.

Os membros da família tinham acabado de sair de viagem, em dois carros, para resolver assuntos pessoais em Curitiba. Decidiram sair bem cedo para voltarem ainda dia para casa. Quando passavam pela avenida principal de Adrianópolis, viram os marginais armados no meio da rua e tentaram dar marcha à ré. Porém foram rendidos e serviram de escudos, para forçar os policiais a não atirarem contra a quadrilha. Todos foram liberados sem ferimento. A PM não soube informar se eles voltaram para casa ou se continuaram a viagem.

Dinamite

Com os policiais “presos” na companhia, outros marginais instalavam dinamites nos caixas eletrônicos do Banco do Brasil e do Itaú, do outro lado da avenida. Eles não conseguiram explodir as dinamites e gastaram tempo tentando arrumá-las para explodir de novo. Mesmo assim, não conseguiram detoná-las, desistiram e foram embora. Os policiais dizem que a ação durou cerca de 10 a 15 minutos. Já os moradores acreditam que a ação durou entre 30 e 40 minutos.

Nem todas as bananas de dinamites foram retiradas, ontem, dos caixas eletrônicos, pelo Esquadrão Antibombas do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), da Polícia Militar. Duas ainda ficaram dentro de um dos terminais do Banco do Brasil (BB) e devem ser retiradas hoje ou amanhã. Os terminais do BB só podem ser abertos por técnicos especializados do banco, pois a abertura incorreta pode detonar os explosivos. Os dois bancos ficaram fechados para reparos, com meia pista da avenida isolada por faixas. Acredita-se que foi a calma da cidade, dificuldade de comunicação e estradas estreitas, porém com rotas de fugas por áreas rurais, que fizeram a gangue da dinamite escolher Adrianópolis.