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Assassinos de Ana Cláudia foram capturados na noite de sábado.

Estão presos os quatro envolvidos na morte da estudante universitária Ana Cláudia Caron, 18 anos, seqüestrada no centro de Curitiba, na noite de terça-feira passada, por assaltantes que agiram a mando de um traficante de drogas. Ela foi morta por asfixia e recebeu um tiro na boca, além de ter o corpo queimado em um matagal de Almirante Tamandaré.

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O assassinato – que provocou comoção nacional – foi praticado por dois menores – um de 15 anos e outro que completou 18 ontem.

Além deles, foram capturados Weryckson Ricardo Ponte, 19, acusado de tráfico, e Ângela Ferraz da Silva, 22, namorada do criminoso que atingiu a maioridade penal.

Daniel Dereveck
Pais da jovem assassinada acompanharam entrevista coletiva.

Em entrevista dada às 15h de ontem, no 1.º Distrito Policial (centro), o delegado Rubens Recalcatti – um dos que participaram das investigações -explicou que se tratou de latrocínio (roubo com morte) e não apresentou os criminosos para poupar a família de Ana, que acompanhava a coletiva.

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De acordo com o policial, o crime foi motivado pelo tráfico de drogas, uma vez que Weryckson – apontado como traficante – ordenou aos dois adolescentes que praticassem um roubo para conseguir dinheiro para ele.

Seqüestro

Ainda segundo a investigação policial, Ana Cláudia foi seqüestrada por volta das 19h, quando estacionava seu carro, o Palio azul placa AKI-5603, na Rua Paula Gomes, centro de Curitiba, para ir até uma academia de ginástica. Possivelmente os menores planejaram um seqüestro relâmpago. A jovem foi levada no carro e passou cerca de quatro a cinco horas rodando a cidade com os marginais. Como ela não carregava cartões de banco, e por ser muito bonita, a dupla decidiu levá-la para o matagal onde foi encontrada morta, no Jardim Marrocos, em Almirante Tamandaré, para abuso sexual.

Reação

Daniel Dereveck
Arma usada no crime foi apreendida com traficante.
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Para Recalcatti, Ana morreu porque deve ter reagido ao estupro. Os bandidos confessaram à polícia que decidiram asfixiá-la com um saco plástico na cabeça. Para ter certeza que estava morta, deram um tiro na boca da estudante e ainda atearam fogo ao corpo.

Na tarde de quarta-feira, os adolescentes teriam voltado ao local, jogado mais gasolina e incendiado novamente o cadáver, para tornar mais difícil a identificação.

Na manhã de quinta-feira, o corpo de Ana foi encontrado por um morador local. O carro dela só foi localizado, também queimado, na madrugada de sexta-feira, nas proximidades do Parque Tanguá. ?Eles mandaram lavar o carro, pensando que poderiam retirar as impressões digitais. Depois resolveram queimá-lo?, contou Recalcatti.

A prisão dos marginais foi possível graças ao retrato falado de um dos adolescentes, feito por uma testemunha do roubo e divulgado na sexta-feira, bem como as investigações realizadas por uma força-tarefa e a ajuda da sociedade. ?Muitas pessoas contribuíram com informações após a divulgação do caso?, revelou o policial.

Prisões na noite de sábado

Átila Alberti
Bandidos foram duas vezes ao local do crime.

As prisões dos acusados aconteceram na noite de sábado, quando Ângela e seu namorado foram encontrados em casa, na região do Parque Tanguá. No local foram apreendidos os pertences de Ana Cláudia, como roupas, brincos, bolsa e celular, reconhecidos pelo pai da vítima. Ângela – que além de ser conivente com o crime, ainda guardou o carro até que fosse queimado – levou a polícia até o outro adolescente, também preso em casa, na mesma região.

Horas depois, Weryckson foi detido. A polícia investiga o envolvimento dele com drogas e com o crime. No assassinato de Ana, ele teria participação ao ocultar a arma, uma garrucha calibre 32, localizada por volta das 13h30 de ontem. Os adolescentes foram reconhecidos pela pessoa que testemunhou o seqüestro. Por motivos de segurança, o local para onde os detidos foram levados não foi revelado.

Átila Alberti
Carro queimado para esconder pistas.

Os quatro foram autuados por homicídio qualificado. Apesar das declarações dos marginais, confirmando ter violentado a jovem, ainda não existe a comprovação científica do abuso. A perícia coletou secreções da vagina de Ana e irá confrontá-las com materiais genéticos dos detidos.

Mais de 150 policiais civis e militares participaram da força-tarefa, coordenados pelos delegados Riad Farhat, do Grupo Tático Integrado de Grupos de Repressão Especial (Tigre); Jairo Estorílio, de Almirante Tamandaré; Rubens Recalcatti, da Delegacia de Furtos e Roubos (DFR); e Miguel Stadler, do Centro de Operações Policiais Especiais (Cope); além da Delegacia do Adolescente. Na rua, todos ainda tiveram o apoio de agentes do serviço reservado da Polícia Militar.

Consternação geral

Patrícia Cavallari

O brutal assassinato da estudante Ana Cláudia Caron chocou, comoveu, e fez mais uma vez a sociedade refletir e exigir mais segurança. Dezenas de e-mails de leitores chegaram à redação da Tribuna questionando ?até quando ficaremos à mercê de marginais, sem podermos contar com o mínimo de segurança para estacionar o carro no centro da cidade??. A mobilização de grupos de elite da polícia também levantou outra questão, como escreveu um dos leitores: ?Como cidadãos, esperamos tratamento igual para todos, sejam pobres, ricos, bem ou mal relacionados. A polícia deve agir sempre e com o mesmo rigor e não somente quando alguém de sua família é afetado?.

Assassinato de estudante reacende discussão sobre maioridade penal

Ciciro Back
Dálio Zippin: ?Eles ficarão no máximo 3 anos apreendidos?.

O assassinato da estudante Ana Cláudia Caron, 18 anos, cometido por dois adolescentes, reacende mais uma vez a polêmica quanto a redução da maioridade penal. Um dos assassinos completou 18 anos ontem, quatro dias depois de cometer o crime. Por ter matado a garota quando ainda era menor de idade, ele será punido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e ficará no máximo três anos apreendido.

De acordo com o advogado criminalista Dálio Zippin Filho, para a Constituição Federal vale a idade que o assassino tinha quando cometeu o crime.

A medida mais severa que os assassinos da estudante poderão cumprir (um deles completou 18 anos e outro tem 15) será o internamento de três anos em uma unidade sócio-educativa, provavelmente no Educandário São Francisco.

Vale lembrar que esse tempo máximo de internamento é aplicado apenas em casos de crimes considerados graves, pois nos demais delitos o tempo é ainda menor. Depois desse período eles ganharão liberdade e o assassinato de Ana Cláudia será apagado da ficha criminal deles. ?De nada adiantará a medida sócio-educativa se eles não tiverem um acompanhamento psicológico. Esses meninos poderão sair piores do que entraram e cometer um crime ainda mais bárbaro?, disse Dálio.

Pena

Ana Cláudia foi seqüestrada, violentada sexualmente, asfixiada com um saco plástico, ferida com um tiro na boca e queimada.

Os criminosos ainda roubaram o carro e os pertences da garota. De acordo com Zippin, se eles tivessem mais de 18 anos e fossem condenados por todos estes crimes, a pena poderia ser de 34 a 52 anos de prisão. A lei permite a progressão do regime fechado em um sexto da pena. Se fossem beneficiados ficariam presos no mínimo cinco anos e meio, mais tempo de pena do que cumprirão como menores de idade. ?Sou contra a redução da maioridade penal, pois isso só iria aumentar as nossas cadeias. Hoje temos mais de 428 mil presos no Brasil e pagamos por cada um deles entre R$ 1.500 e R$ 2.000.

O necessário seria investimento em escola, saneamento básico e outros projetos que certamente ajudariam a diminuir a incidência dos adolescentes em crimes?, finalizou o advogado.

Minuto de silêncio

Giselle Ulbrich

Valquir Aureliano
Léo Matos, do Paraná Clube.

Antes do jogo entre o Paraná Clube e o Juventude, na Vila Capanema, às 16h de ontem, jogadores do Paraná entraram em campo vestindo camisetas com a foto de Ana Cláudia Caron. O caso chocou a sociedade curitibana e os atletas fizeram um minuto de silêncio em homenagem à estudante, antes de iniciarem a partida.








Outras mortes sem ?força-tarefa?

Apesar do corpo de Ana Cláudia Caron ter sido encontrado em Almirante Tamandaré – e fazer lembrar o rumoroso caso em que 21 mulheres foram assassinadas no município entre 1999 e 2002 – o delegado Rubens Recalcatti, da Delegacia de Furtos e Roubos, afirmou que o latrocínio da estudante nada tem a ver com os demais episódios violentos.

Em 2002, 16 acusados dos assassinatos – entre eles policiais civis e militares – foram detidos e permaneceram presos até dezembro do ano passado. Com a liberdade deles – coincidência ou não – mais cinco mortes de mulheres, excetuando a de Ana, foram registradas no município. Sobre esses a Secretaria de Segurança Pública se limita a dizer que há investigadores trabalhando para resolvê-los, mas não revela detalhes, prisões ou novas descobertas.

Sônia Regina da Silva Flores de Souza, 42 anos, foi a última das mulheres mortas no município. Ela foi vista pela última vez no sábado dia 11 de agosto, saindo de um bailão na garupa da moto de Adenival Tavares Nogueira, 42. O corpo só foi localizado mais de uma semana depois, boiando num córrego do bairro Tranqueira, em Tamandaré.

Adenival permanece foragido e seria responsável, em maio de 2002, pela morte de Creusa Aparecida Ferreira. Na casa dele a polícia encontrou farto material pornográfico e vários recortes da Tribuna sobre os casos das mulheres mortas em Tamandaré. Apesar do bom trabalho da delegacia local em identificar Adenival, a Secretaria de Segurança não determinou nenhuma força-tarefa para prendê-lo, como fez no caso da morte da estudante Ana Cláudia.

Burocracia atrapalha

Daniel Derevecki
Paulo pediu agilidade.

Paulo Caron, pai de Ana Cláudia, interrompeu a coletiva, ontem, para criticar a demora no atendimento do 190 – número de emergência da Polícia Militar. Ele revelou que, quando telefonou à polícia informando do roubo do carro da filha, o atendente solicitou que a própria testemunha do assalto telefonasse dando informações, para que o alerta fosse passado à rede de policiamento. Minutos preciosos foram perdidos pela burocracia e Paulo, enfático, garantiu que não se sentiu nem um pouco amparado pela polícia naquele momento.

Para familiares e amigos de Ana, as quatro prisões transformaram-se em alívio, mas não em justiça feita. O pai de Ana afirmou que, se a lei lhe permitisse, faria justiça com as próprias mãos. A mãe da estudante disse que justiça só acontecerá quando ela vir os quatro na cadeia. ?A polícia diz que eles estão presos, mas eu não vi. Me daria por satisfeita vendo a cara de cada um atrás das grades?, desabafa a mãe.