Uma ossada embaixo da casa. Mistério começa a ser desvendado.
(Fotos: Arquivo)

O Carnaval daquele ano foi animado. Os festejos nos bares e boates começaram na sexta-feira, 3 de março de 2000, e só foram terminar, como de praxe, na madrugada de Quarta-feira de Cinzas. A polícia teve o trabalho costumeiro para os dias de reinado de Momo, ou seja, muito trabalho. O sargento da Polícia Militar Júlio Grecheski sentia-se aliviado por ser quinta-feira e toda a folia ter acabado. Lotado no serviço de informações de seu Batalhão, cuidava dos afazeres quando o telefone tocou. Anônimamente, uma pessoa lhe contou que o corpo de João Antônio Leonardo estava enterrado embaixo da casa onde ele morava, numa fossa. E que a mulher, Orlinda, e o amante dela, Ademir, eram os responsáveis pelo assassinato. O informante dava conta, inclusive, que havia duas fossas na casa, uma delas desativada e coberta com uma pilha de lenha, e que Orlinda estava preocupada com o mau cheiro exalado pelo cadáver, tendo jogado muita creolina (anti-séptico) no local, para disfarçar o odor.

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O que sobrou  do corpo de João foi levado para o IML.

O sargento imediatamente comunicou o delegado Rogério Haise, que, na hora, pediu à juíza Luciane Ludovico um mandado de busca e apreensão para vasculhar a casa de Orlinda. A juíza expede a ordem no mesmo dia, porém a diligência é deixada para ser feita no dia seguinte. Entram em ação o policial civil Mesquita e o funcionário da Prefeitura Municipal, que prestava serviços na delegacia, conhecido por ?Luizão?. Embora sua atuação devesse se limitar só aos serviços internos da DP, ?Luizão? agia como policial e assim era reconhecido por todos.

Ambos seguiram para a casa de Orlinda, na Rua Paranaguá. Ela os recebeu e assim que soube do mandado de busca, autorizou a entrada na casa. Eles, porém, não tiveram nenhum trabalho. Talvez por remorso e certamente por lembrar que durante uma bebedeira de Carnaval revelou a algumas pessoas que o cadáver do marido estava embaixo da casa e precisava se livrar dele, ela indicou onde estavam os ossos. ?Ele foi assassinado. O que sobrou do corpo está embaixo da casa?, apontou a mulher, indicando sacolas plásticas que guardavam os restos de João Antônio.

Orlinda recebeu voz de prisão e foi um ?escândalo?, segundo vizinhos que até hoje recordam do caso. O Instituto Médico-Legal e o Instituto de Criminalística foram chamados. Recolheram o que restou do cadáver: parte da mandíbula, algumas costelas, um fêmur e outros ossos menores. Ali mesmo ela apontou Ademir como sendo o assassino e disse que escondia o corpo porque se sentia ameaçada. Algemada, foi levada para a delegacia e sustentou a versão de que João Antônio foi morto por Ademir, no sobrado que Ademir construía na Rua Wilson Gomes Ramos, 699, bairro Santa Terezinha, no limite entre Curitiba e Almirante Tamandaré.

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Começo do calvário

Os restos do pintor estavam enterrados na fossa, no porão.

Enquanto Orlinda contava sua nova história à polícia, uma equipe de policiais militares seguiu até o local de trabalho de Ademir, em Curitiba. Ele estava conversando com amigos, quando, pelo alto-falante, foi chamado até a portaria. ?Foi a primeira vez que me chamaram daquele jeito?, conta o acusado, que não desconfiou que sua vida iria mudar radicalmente. Ao se aproximar do portão principal, identificou-se e foi imediatamente preso. Soube que havia sido denunciado por Orlinda, como o assassino de João.

Pálido e trêmulo, Ademir chegou na delegacia com as mãos algemadas para trás. Logo depois sofreu o primeiro interrogatório e negou envolvimento no caso. Mais uma vez admitiu ter tido um relacionamento rápido com Orlinda, mas que há meses não a via nem sabia o que tinha acontecido com João. A imprensa, que já cobria o encontro dos ossos, entrevistou o casal. A cena chegava a ser patética. Algemados um ao outro, em frente a uma viatura, no pátio da delegacia, Orlinda, descabelada, acusava Ademir, assegurando que era para ?apertá-lo? que ele iria falar a verdade. Ademir, nervoso, dizia que a mulher estava maluca e que era ela quem deveria saber o que realmente havia acontecido, uma vez que escondera o corpo do marido embaixo de casa. No bate-boca, houve um ?empate técnico?. Cada um dizia o que queria. Caberia à polícia arrumar as provas que confirmassem a versão de um ou de outro e apontassem o culpado.


Orlinda, Ademir e o trabalho dos peritos, no dia em que o crime
foi finalmente descoberto pela polícia, em março de 2000.

*Na edição de amanhã, Ademir assina a confissão do crime. Cinco anos depois, explica por que assinou o documento.

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