Anderson Tozato |
Morte de Elvis provocou revolta nos moradores do bairro. |
No dia em que traficantes de drogas aceitaram dar uma trégua à favela do Parolin, para a realização de uma festa em prol da paz, crianças se armaram e trocaram tiros no meio da rua, em plena luz do dia. Os disparos interromperam a comemoração do Dia das Mães na casa do estudante Elvis Henrique Iriguti, 10 anos. Ele foi atingido por uma bala perdida, que perfurou seu coração. Morreu na Rua Professor Porthos Velozo, quase esquina com a Rua Brigadeiro Franco, no meio do caminho entre a festa e a casa dele.
De acordo com Tomatsu Iriguti, avô de Elvis, o garoto ia à farmácia comprar remédios para o irmão, que está gripado. O estudante ainda não havia chegado no estabelecimento quando foi atingido pelo tiro, por volta das 13h20. ?Ele não se metia com nada errado. Era um garoto bonzinho. Tudo que pedíamos pra fazer, ele fazia, sem reclamar?, disse o avô.
A tia de Elvis, transtornada, gritava: ?Olhe o que minha irmã ganhou de presente!?.
Indignados, moradores locais externavam revolta contra a violência no bairro. ?Quando isso vai parar?? ?Isso não tem fim.? ?Ninguém pode mais sair de casa. Hoje foi ele. Amanhã pode ser você, eu, meus filhos, seu neto?, eram as frase mais ouvidas. Daniele, moradora do Parolin há um ano, explicou que o pavor tomou conta de todos. Mesmo querendo que os filhos estudem, para ter um futuro melhor, ela e outras mães da favela estão com medo de mandá-los à escola. Até o culto evangélico, que sempre ocorre à noite, está perdendo fiéis.
Trégua
Alguns moradores contaram que os traficantes do bairro, ao saberem da festa em prol da ?paz?, aceitaram dar à favela um dia de ?descanso?, sem tiros e violência. No entanto, a fatalidade teria ocorrido entre crianças, aproximadamente da mesma idade de Elvis, que se armaram e teriam começado um tiroteio próximo ao barracão do evento. Testemunhas viram três garotos correndo e atirando, mas não sabem exatamente com quem eles trocavam tiros. Dois deles foram identificados pelos moradores – através de seus apelidos – e são apontados como autores de outras mortes na região. Um deles, de acordo com uma moradora, teria sido pego por policiais militares, no final de semana anterior, e levado a um morro, onde teve sua arma confiscada. Apesar de revelarem estes fatos à imprensa, os moradores não quiseram dar as informações aos investigadores Lopes e Dias, da Delegacia de Homicídios, que estiveram no local.
A realidade da violência
?A violência na favela do Parolin está pior que nas favelas do Rio de Janeiro e São Paulo. Lá, a briga é entre os traficantes. Aqui, ainda não sabemos explicar ao certo, mas a violência é generalizada, por motivos que, além do tráfico, estamos estudando.? A constatação é de Adegmar José da Silva, o ?Sombra?, presidente do Centro Cultural Humaitá, que organizou uma festa em prol da paz, na tarde de ontem, no bairro. Com o lema ?Guarde seus calibres. Descanse suas armas. É tudo nosso?, o 1.º Encontro Cultural do Parolin Pela Paz foi interrompido a tiros, logo nos seus primeiros 20 minutos. As cerca de 500 pessoas que estavam no local dispersaram e o pátio do barracão da FAS, onde ocorria o encontro, só voltou a ficar movimentado duas horas depois da morte do garotinho Elvis Iriguti.
Os tiros foram disparados por garotos quase da mesma idade do estudante morto. Mesmo diante do crime, os organizadores decidiram não interromper o evento e continuaram a incentivar os jovens e crianças a entrar no barracão e participar de práticas esportivas, brincadeiras, oficinas de arte e apresentações de bandas de rap. Mesmo sendo um ato pela paz, ?Sombra? e seus colegas surpreenderam-se com uma criança, que brincava no local com uma pistola de plástico. A arma foi quebrada e jogada no lixo.
?Percebemos que o Parolin precisa de mais atenção. Esse bairro carece de atividades culturais e esportivas?, diz ?Sombra?, que está iniciando um projeto para estudar o perfil da favela e quais atividades culturais a população local mais gosta. A intenção é pegar os dados dessa pesquisa e colocá-los em prática, através de novos eventos culturais, com o objetivo de trazer mais paz ao tão violento Parolin.