Mandados de prisão se acumulam nas ?gavetas?

Uma infinidade de mandados de prisão expedidos pela Justiça e nunca cumpridos pelas polícias se acumulam em todo o País. Historicamente, segundo dados citados pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), o Brasil superou no ano passado meio milhão de determinações do tipo sem cumprimento, o que significa que mais de 500 mil pessoas em desconformidade com a lei deixaram de ser punidas. No Paraná, a realidade de não dar conta de todas as ordens emitidas também existe, mas os números não são facilmente conseguidos: esbarram na falta de um levantamento preciso e informatizado, embora, anos atrás, o Estado já tenha divulgado dados nesse sentido.

O diretor do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Maurício Kuehne, afirma que, deste montante, porém, boa parte vai permanecer sem efeitos. ?Muita gente já morreu, muitos já prescreveram, outros devem estar em duplicata. Digamos que sobraria cerca de uns 200 mil ainda passíveis de cumprimento?, calcula. A prescrição (ou seja, perda do efeito do mandado) acontece entre dois e vinte anos, dependendo do crime.

Mas essa progressão de acúmulos seria normal, segundo o diretor do Depen. ?A população cresce, os crimes vão aumentando e, por outro lado, deve-se levar em conta as respostas da polícia e do Poder Judiciário?, explica.

No entanto, Kuehne concorda que dar conta de cumprir hoje ainda que menos da metade dessa pendência seria uma utopia. O primeiro motivo tem a ver com o aparelhamento das polícias. ?Depois, vem a falta de estabelecimentos penais, tanto cadeias como penitenciárias. E não adianta só construir. É preciso muni-las de infra-estrutura e pessoal capacitado?, aponta.

Segundo os últimos levantamentos do Depen, de dezembro do ano passado, o Brasil possui mais de 422 mil detentos recolhidos em estabelecimentos penais, sendo que o total de vagas não chega a 276 mil. ?Isso já mostra um déficit de mais de 147 mil vagas. Se não tem para os que já estão presos, imagine os que ainda faltam ser recolhidos.?

Com isso, diz o diretor, a polícia acaba submetida todos os dias à escolha de quem vai ou não ser preso. ?Leva-se em conta a quantidade de pena, o perfil do condenado, antecedentes criminais. Vai muito do faro policial?, conclui.

Nem a VEP tem números

O delegado Gerson Runpfe atesta que existem conversas para viabilizar a contagem dos mandados não cumpridos junto à Justiça. Nem mesmo a Vara de Execuções Penais (VEP) diz estar apta a fornecer essa estatística.

Mas, por enquanto, o levantamento ainda está no campo da solicitação. ?O que posso assegurar é que em nenhum lugar do mundo o número de ordens de prisão emitido é cumprido em sua totalidade. Demos um passo importante com o Polícia Online (que permite a qualquer policial acessar a ordem de prisão pela internet e cumpri-la), mas agora precisamos avançar para esta segunda etapa.?

Estrutura

A falta de um balanço nos números expressa também a impossibilidade de controle do crescimento dos mesmos.

?O acúmulo dessa cifra negra demonstra que, por um lado, a polícia investiga de menos. No entanto, prende demais, se olharmos a estrutura do sistema penal?, afirma o presidente do Conselho Penitenciário do Paraná, Joe Velo. ?O Brasil intensificou as leis nos anos 90, mas não investiu nas polícias e no sistema penal. Essa cultura do encarceramento gerou uma conta desequilibrada, de forma que, embora os investimentos tenham retornado nos últimos anos, já vieram atrasados?, conclui. (LM)

Problema se repete no PR

No Paraná, embora o número de mandados pendentes já tenha sido divulgado anteriormente, hoje, ele não existe de pronto para ser fornecido pela Secretaria de Segurança Pública. Segundo a secretaria, levaria meses para fazer as contas, uma vez que não existe um sistema que faça essa sondagem.

Em 1999, O Estado divulgou que o Paraná possuía cerca de 50 mil mandados de prisão nunca cumpridos, acumulados na Delegacia de Vigilância e Captura (DVC), em Curitiba, que centraliza as ordens emitidas no Estado. Os dados da DVC mostravam que, naquele ano, apenas 14% dos mandados de prisão recebidos haviam sido cumpridos.

Em 2003, mais uma vez a imprensa paranaense divulgou o número. Desta vez, já alcançava os 60 mil e, em 2004, os 76 mil. Atualmente, porém, o delegado da DVC, Gerson de Melo Runpfe, afirma não ter o dado. ?Falta um sistema informatizado que unifique essas informações entre o Poder Judiciário e a polícia?, justifica. Além disso, apesar de a delegacia centralizar as ordens, nem sempre a comunicação entre todos os entes aptos a comunicar o cumprimento é efetiva. ?Acontece de a Polícia Militar ou a Guarda Municipal prenderem alguém no interior, comunicar o juiz da comarca e não chegar a nós a informação.? (LM)

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