Não passou de uma farsa o seqüestro de Marcelo Schweigert, 20 anos, que reapareceu em 23 de março depois de seis dias sem dar notícias. Acompanhado da mãe e do advogado, o jovem confessou ontem, em depoimento na delegacia de Campo Largo, que simulou o crime com objetivo de receber o seguro do carro. Enquanto a polícia o procurava e a família apelava à imprensa e distribuía panfletos para localizá-lo, Marcelo estava são e salvo num hotel em Florianópolis.
A Polícia Civil já desconfiava da veracidade do caso, uma vez que a família adiava o depoimento de Marcelo sob variados pretextos. “Conversamos muito, ele admitiu o erro e resolveu contar toda a verdade”, disse Helda Schroeder Schweigert, 43 anos, mãe de Marcelo e empresária do ramo leiteiro na Colônia Witmarsum, em Palmeira. O rapaz foi indiciado por falsa comunicação de crime e estelionato na forma tentada.
Sumiço
O desaparecimento de Marcelo comoveu a cidade. Ele foi visto pela última vez na noite de 16 de março, ao sair da casa da namorada Juliana, no bairro Jardim Social, em Campo Largo. No dia seguinte, o carro dele, uma Parati ano 1998, foi encontrado incendiado num matagal na direção oposta a que o jovem deveria ter seguido.
As primeiras hipóteses levantadas foram de seqüestro – embora não houvesse qualquer pedido de resgate – ou de uma briga por causa do som do carro – Marcelo sempre era visto passeando em Campo Largo com o máximo volume no som da Parati. A família percorreu vários meios de comunicação, implorando por alguma informação. A delegacia de Campo Largo fez diligências até em Palmeira, onde o jovem havia estudado, sem encontrar pistas.
Quando os parentes já perdiam as esperanças de encontrá-lo com vida, Marcelo apareceu na BR-277, entre Curitiba e Campo Largo, e foi reconhecido por funcionários de uma metalúrgica. Na ocasião, ele disse à PM e à família que havia sido raptado por dois homens e contou detalhes do fato. “Ele falou que foi encapuzado e colocado no porta-malas de um carro. Num cativeiro escuro, teria ficado seis dias sem falar com os supostos seqüestradores”, contou a delegada de Campo Largo, Maritza Haisi.
Desculpas
Depois de alguns “dribles” na polícia, Marcelo compareceu ao depoimento marcado para ontem. Na surpreendente confissão, disse ter simulado o seqüestro para receber R$ 15.500 do seguro da Parati. O jovem conta que tentou vender o carro, que apresentava problemas no motor, mas não recebeu ofertas maiores do que R$ 11 mil. “Poderia ter dado um sumiço no carro, mas achei que a história do seqüestro seria mais convincente”, disse ele.
Marcelo conta que, depois de sair da casa da namorada, ateou fogo na Parati e foi a pé até a entrada de Curitiba. De lá tomou um táxi até o centro da capital, e no dia seguinte foi de ônibus até o Estado vizinho, com R$ 1.200 no bolso. “Fiquei no Hotel Sumaré, no centro de Florianópolis. Só saía para dar umas voltas”, contou, sem dizer por que escolheu a capital catarinense. Ao voltar, tomou o cuidado de jogar fora a mochila com poucas peças de roupa e a carteira com documentos – objetos que poderiam denunciar a farsa de imediato.
Marcelo, que não tinha passagens pela polícia, foi liberado após a confissão. Segundo o superintendente da delegacia, Everson Haisi, o fato de o seguro do carro não ter sido acionado não elimina a tentativa de estelionato. “Ele engendrou toda a situação com este fim específico”, disse o policial. Marcelo vai responder ao inquérito em liberdade.
Assume a fraude e ganha o perdão da mãe
Foi durante uma viagem familiar, no último final de semana, que Marcelo Schweigert confessou à família ter inventado a história do seqüestro. Em conjunto, decidiram contar à polícia o que de fato aconteceu. “Via no semblante dele que havia algo de errado. Estava muito bem psicologicamente para quem diz ter ficado seis dias num cativeiro”, contou a mãe, Helda.
Durante a “estada” em Florianópolis, Marcelo conta que não telefonou para ninguém nem acompanhou o drama da família. “Sabia que iam ficar preocupados, mas não imaginava o tamanho da confusão que estava arrumando”, afirmou o jovem que, apesar de todo o transtorno, ganhou o perdão da mãe. “Quando um filho tropeça, é função dos pais ajudá-lo a levantar e ensiná-lo a caminhar”, disse Helda. O falso seqüestrado pediu desculpas aos pais e à comunidade “que se preocupou com ele”.
A polícia acredita que a versão apresentada ontem por Marcelo seja a verdadeira. “Houve boatos de envolvimento com droga, que não são verdadeiros. É uma família tradicional e católica, e o que aconteceu foi uma bobagem do garoto”, disse o superintendente Everson Haisi, da delegacia de Campo Largo.
Ações assustam povo curitibano
O seqüestro-relâmpago, tão noticiado em São Paulo e no Rio de Janeiro, também está assustando os curitibanos. A Delegacia de Furtos e Roubos não possui estatísticas sobre esse crime, mas indica que a prática está se tornando comum. Em média são registrados dois casos por semana. O delegado Rubens Recalcati explica que os seqüestros-relâmpago são marcados nos boletins de ocorrência como roubos, o que dificulta a constatação de quantos seqüestros desse tipo acontecem.
Os criminosos agem sempre da mesma forma: aproveitam o sinal vermelho, ou entradas de garagem, ingressam no carro e ameaçam constantemente a vítima, deixando-a sob mira de armas. Permanecem com ela por até quatro horas e passam em caixas eletrônicos para sacar dinheiro ou obrigam a pessoa a assinar cheques. “Os marginais escolhem as vítimas pelo modelo do carro e que aparentam ter padrão econômico alto. O alvo principal são as mulheres, pela fragilidade”, alerta Recalcati. De acordo com ele, não tem hora nem local para a ação dos seqüestradores. Mas os bairros com maior incidência são Champagnat, Cristo Rei, centro e Bacacheri.
Para o delegado, os motoristas precisam se prevenir. Ele dá diversas orientações, como manter sempre as portas do carro travadas; à noite, andar com as janelas fechadas, sobretudo ao parar em semáforos; durante a madrugada, calcular a distância e velocidade do veículo para não parar no sinal vermelho; ao chegar em casa, observar a presença de estranhos próximos ao portão; entre outros.
Se a pessoa já estiver sob mira dos seqüestradores, Recalcati avisa para a vítima, por exemplo, não reagir; fazer o que o criminoso mandar; comunicar antes de realizar qualquer gesto; tentar memorizar características dos assaltantes, procurando não encará-los. O delegado lembra que a vítima ou a testemunha do crime devem sempre avisar a polícia.