A morte de jovens por causas violentas está diminuindo a expectativa de vida no Brasil. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o brasileiro (de ambos os sexos) vive, em média, 71,3 anos. Este índice poderia ser dois ou três anos maior se não fosse a interferência da trágica realidade de mortes prematuras de jovens por causas externas.
Dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), apontam que os homicídios de crianças e adolescentes aumentaram drasticamente nas últimas duas décadas. Dezesseis pessoas com idade entre 0 e 18 anos são assassinadas, por dia, no Brasil. As mortes violentas são a principal causa de óbitos de brasileiros nesta faixa etária.
A Análise da Violência contra a Criança e o Adolescente, segundo o Ciclo de vida no Brasil, apresentada pelo Unicef, no último mês de agosto, demonstra dados mais do que alarmantes. Os homicídios de crianças e adolescentes atingem particularmente os homens negros ou pardos. Dentre as mortes por causas externas no sexo masculino, os homicídios representam 41,8% dos casos, com a maior ocorrência entre os 15 e 24 anos. Nessa faixa etária são 95,5 assassinatos masculinos por 100 mil habitantes, sendo 71,7 ocasionados por armas de fogo. Entre as mulheres, o índice é bem menor em todas as faixas etárias. A taxa de homicídios do sexo feminino entre 15 e 24 anos é de 6,9 em 100 mil habitantes, com 4,1 causados por armas de fogo.
Óbitos
De acordo com o levantamento, em 2000, aconteceram 5.921 homicídios de crianças e adolescentes entre 0 e 18 anos no País, o que representa uma taxa de mortalidade de 9,15 por 100 mil habitantes somente nesta faixa etária. O número de assassinatos de homens entre 10 e 19 anos foi de 39 em cada 100 mil habitantes. Entre 15 e 19 anos, o índice é de 74 para 100 mil habitantes.
No Paraná, a taxa de mortalidade em homicídios em jovens masculinos entre 15 e 24 anos é de 63 por 100 mil habitantes. A taxa para as adolescentes mulheres é de 5 em 100 mil habitantes. Especificamente entre 15 e 18 anos, o Estado teve 179 casos em 2000, o que significa uma taxa de mortalidade de 23,3 para cada 100 mil habitantes da faixa etária correspondente.
Extermínio é produto da desigualdade
A oficial de projetos do Unicef no Brasil, Helena Oliveira, afirma que há uma crescente visão de que o adolescente é causador da violência urbana, principalmente os negros, pobres e que moram em favelas. O quadro é favorecido pela enorme desigualdade social existente no País. A constatação disso é o número de extermínios e execuções de jovens, além do internamento precoce em centros de recuperação para jovens infratores, como a Febem, por delitos que não precisavam desta medida. "Parte-se do pressuposto que, se já começou, vai continuar fazendo. Poderiam ser medidas mais alternativas ou internações mais leves", comenta.
O professor e coordenador do Centro de Estudos de Segurança Pública e Direitos Humanos da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Pedro Bodê, comenta que a sociedade pensa que a violência é exercida pelos jovens, enxergando-os como ameaças. "O que está acontecendo é algo tão terrível que há um impacto de dois anos na expectativa de vida populacional. A sociedade enxerga o adolescente como ameaça, mas ele é a vítima", conclui. A impunidade é outro fator que alimenta a onda de violência. "A falta de esclarecimento desses crimes é reflexo de como a sociedade entende isso", opina Bodê.
O secretário de Estado do Trabalho, Emprego e Promoção Social, padre Roque Zimmermann, diz que a sociedade "dá graças a Deus ou bate palmas" quando um adolescente é morto. "Falam que é um bandido a menos. Isso é uma tristeza. Os únicos que choram são alguns familiares e amigos. A situação está banalizada. A morte destes adolescentes é desejada e proposta", conta.
Ele admite que não há estatísticas profundas sobre o assunto no Estado, mas um estudo já foi solicitado às universidades e outros órgãos do governo. Segundo Zimmermann, é possível constatar a grave situação dos homicídios de crianças e adolescentes pelas notícias dos jornais. Ele cita o exemplo de Foz do Iguaçu, onde há entre 1 e 3 homicídios de jovens noticiados por semana.
Conforme o professor Bodê, o envolvimento com drogas e outros crimes ocorre em todas as classes sociais. "Mas os que morrem são os pobres. Por que o mesmo comportamento não acontece na classe média? A situação está tão abandonada que tanto faz matá-los", enfatiza Bodê, esclarecendo que o principal motivo de morte entre jovens da classe média é o acidente de trânsito. Helena Oliveira destaca que a sociedade precisa acabar com a equívoca associação entre pobreza e violência. "Por qualquer motivo pode se entrar para o crime. Se fosse assim, por que as crianças de classe média se envolvem com o tráfico de drogas? Entram pela diversão, pela euforia", questiona.
Foz do Iguaçu tem mais crimes contra jovens
Uma das cidades paranaenses campeãs de homicídios de adolescentes é Foz do Iguaçu, na região Oeste do Estado, cujo problema é agravado pela fronteira com a Argentina e o Paraguai. Neste ano, 25 adolescentes até 18 anos foram assassinados na cidade. Entre os jovens de 18 a 21 anos, foram 49 homicídios registrados no mesmo período.
O promotor de Justiça da 3.ª Vara Criminal de Foz, Marcelo Camargo de Almeida, que também atuou na Vara da Infância e Juventude da cidade, explica que os adolescentes assassinados têm, principalmente, 16 e 17 anos. A maioria das vítimas usa entorpecentes, possui baixa escolaridade, não tem qualquer tipo de qualificação profissional e comete atos infracionais, como roubo, furto e tráfico.
Acabam morrendo por vingança, queima de arquivo ou acerto de contas. Para o promotor, por ser área de fronteira, Foz tem uma peculiaridade em relação às outras cidades. Muitos jovens atuam como "mulas" no tráfico entre países, ou seja, levando a droga de um lado para o outro.