Uma fogueira de vaidades. Talvez seja este o motivo pra que a ?chacina de Carambeí? até hoje permaneça em mistério. Muitos policiais, muitos delegados, muitas investigações e nenhum resultado. Houve brigas entre eles, que buscavam motivos e suspeitos destoantes. Todos queriam resolver o caso à sua maneira, sem entrosamento. Clóvis Galvão Gomes, delegado de Ponta Grossa, nunca acreditou na versão de assalto. Até hoje ele diz, categoricamente, que o que ocorreu foi uma briga em família. Em seu entendimento, Mirian estaria tendo um caso amoroso com o sogro, Adrianus. Ambos teriam sido surpreendidos por Dirk e Mariana no Sítio Sete Quedas e houve uma briga generalizada, na qual as três crianças também foram espancadas. Depois, Mirian teria simulado o assalto, pra justificar a carnificina. ?Nunca conseguimos provar isso. Existiam tantos interesses escusos, muito dinheiro na história. A polícia não conseguiu trabalhar?, garante ele, que ainda faz parte do quadro da Polícia Civil do Paraná e diz que o não-esclarecimento da chacina tornou-se um marco de frustração em sua carreira.
Já o antigo delegado do Cope, Raimundo Nonato Siqueira, hoje aposentado, mas ainda trabalhando na área de segurança e investigações, vai mais longe. Ele não crê em assalto, muito menos em briga de família. ?Foi um crime encomendado?, assegura. As muitas investigações realizadas por Siqueira apontavam pra um suspeito: Sieb Greydanus de Geus. Agropecuarista, dono da Fazenda Santa Cruz, Sieb morreu há seis anos. Seu filho, Pedro Greudanus de Geus, continua a administrar a propriedade e outros bens da família, situados ao lado do Sítio Sete Quedas. Sieb era um tipo ranzinza, que brigava por qualquer coisa. Tinha uma rixa com um parente, também seu vizinho, e viviam trocando insultos e ameaças.
Este parente – Auke Dijkstra – era dono da Chácara Dirk, colada à fazenda de Sieb. O parente confidenciou a Siqueira e ao promotor de justiça Altair Pissaia (designado em caráter especial para acompanhar o caso) que era pra ser ele o alvo dos assassinos: ?Ao invés de irem à Chácara do Dirk, como chama a minha propriedade, foram ao Sítio Sete Quedas, cujo dono se chamava Dirk?, explicou.
A insinuação fez com que os trabalhos policiais de Siqueira se voltassem para o holandês não muito bem quisto. Descobriram que ele respondia a inquérito policial em Paranaguá, por comprar uma carga ilegal de adubos. Apuraram, também, que ele tinha interesse em adquirir o Sítio Sete Quedas, por causa do Rio Pitangui, que passa nos fundos da propriedade.
A suspeita é de que ele teria contratado os assassinos pra dar um ?susto? na família Boer, de forma que vendesse a propriedade. Sieb gastou uma fortuna com advogado, pra se dizer inocente. Nada foi provado contra ele.
Hoje, Pedro – filho de Sieb -garante que gostaria de ver o caso novamente investigado, pra que não pairasse mais nenhuma dúvida com relação à sua família. ?Toda essa história foi muito violenta e mal investigada. Gostaria muito que a polícia retomasse as investigações e descobrisse os culpados?, afirma.
A terceira versão – e a única que resultou na prisão de um suspeito – foi a de que houve realmente um assalto. Quem prendeu o suspeito foi o delegado Daniel Issberner (já falecido), na época chefe da Divisão de Polícia Especializada (DPE). Seu braço direito era o investigador apelidado de ?João Caceteiro? (já falecido). Seguindo pistas, eles chegaram até o favelado Luiz Paulo Choma, na época com 16 anos. Choma era o que se podia chamar de ?freguês? da delegacia de Ponta Grossa, tantas eram suas passagens pela polícia. Ele chegou a confessar o crime, apontando dois comparsas.
Foi, num primeiro momento, reconhecido por Mirian. Fez uma reconstituição controversa (alguns acham que deu informações valiosas, outros, que o trabalho foi um grande fiasco). Mais tarde, já orientado por advogado, passou a negar o crime, disse que havia sido torturado pra confessá-lo. Mirian, em novo reconhecimento, voltou atrás, afirmando não ter certeza de que se tratava do mesmo indivíduo que invadiu o sítio. Por ser menor de idade, o inquérito passou a correr em segredo de justiça. Muito mais tarde, por falta de provas, Choma sequer foi denunciado. Colocado em liberdade, desapareceu.
O inquérito nunca foi concluído e deve, segundo interpretação de alguns advogados, prescrever em dois anos.
O caso atualmente
Sebastião está com o inquérito e achou um novo suspeito. |
Em 2003, o delegado Marcus Vinícius Sebastião assumiu a delegacia de Carambeí e também o 2.º Distrito Policial de Ponta Grossa. Através do ex-advogado de Choma, Edson Stadler, recebeu a informação de que um dos autores da chacina era o assaltante Urbano Kutcher. Procurou por ele e o encontrou, entrevado numa cadeira de rodas, morando em Ponta Grossa. Urbano cumpria pena domiciliar, porque havia sofrido um derrame cerebral e estava paralítico. Mesmo assim, foi interrogado e negou participação no caso.
Dando continuidade ao trabalho, Sebastião procurou por Mirian, pois queria que ela fizesse o reconhecimento do suspeito. Não a encontrou. ?Apuramos que ela estaria morando em Brasília, mas não tínhamos o endereço?, assegurou. Transcorrido algum tempo, Urbano morreu. O delegado ficou apenas com as fotos do suspeito, na esperança de que Mirian, um dia, se disponha a fazer um novo reconhecimento. Através da reportagem da Tribuna, Sebastião tomou conhecimento que Mirian está morando em Carambeí, e deverá procurá-la para que, ao menos, veja as fotos que estão anexadas ao interminável inquérito policial.
*Amanhã, a Tribuna trará ao leitor a história de Choma, o único suspeito preso, e o sofrimento de Mirian Boer.