Para combater um esquema de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e sonegação fiscal, a Polícia Federal desencadeou na manhã de ontem a Operação Monte Éden. A ação contou com o apoio da Receita Federal, do Ministério Público Federal e a cooperação de autoridades do governo uruguaio. O objetivo dos policiais era cumprir cerca de 30 mandados de prisão e, aproximadamente, 80 de busca e apreensão, expedidos pela Justiça Federal. Os alvos eram as pessoas e escritórios de advocacia ligados ao esquema. As ações aconteceram nos estados do Paraná, São Paulo, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Ceará e Pernambuco. No total, além de mais de 50 servidores da Receita Federal, 500 policiais federais cumpriram buscas e prisões.
Para acompanhar as diligências nos escritórios de advocacia, foram convocados representantes da organização classista dos advogados (OAB). O esquema de fraudes da organização criminosa faz uso de sociedades anônimas "off-shore", com sede no Uruguai, em nome de "laranjas", para ocultar e dissimular valores e bens dos "clientes" beneficiários. Entre os investigados estão membros de escritórios de advocacia, "laranjas" e grandes empresários.
O esquema
Após a criação de "off-shores" no Uruguai, a quadrilha, utilizando-se das empresas estrangeiras, constitui sociedades limitadas no Brasil. Estas, por sua vez, adquirem o patrimônio dos clientes, transferindo a propriedade dos bens. Entretanto, através da investigação, foi possível comprovar que tanto as empresas estrangeiras como as sociedades nacionais encontram-se em nome de interpostas pessoas, meros "laranjas". O objetivo de tal sistemática é permitir que os crimes de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e sonegação fiscal sejam realizados sob aparência de legalidade, sendo denominado pelo grupo criminoso de "blindagem patrimonial".
Um dos desafios dos investigadores foi identificar as diversas técnicas da quadrilha, uma vez que para cada empresário era criado um esquema diferenciado, de acordo com as necessidades do "cliente". Para dificultar ainda mais a ação da polícia na identificação dos criminosos, a quadrilha aperfeiçoava sempre o modelo de fraude.
Valores
Inicialmente, eram celebrados contratos de prestação de serviços, com valores superiores a R$ 100.000,00, entre a quadrilha, formada por advogados e contadores, e os "clientes", por meio do qual as empresas nacionais e estrangeiras eram utilizadas para "blindar" o patrimônio do "clientes". Apenas para abrir uma sociedade anônima financeira (SAFI) no Uruguai são cobrados, em média, US$ 3.500, sendo posteriormente cobrados aproximadamente US$ 2.500 por ano para a manutenção da "off-shore".
Para receber pelos valores decorrentes de sua atividade, o escritório de advocacia investigado criou e utilizou mais de uma dezena de empresas nacionais, sempre interpondo sociedades anônimas uruguaias como proprietárias. Apenas no ano de 2004, foram movimentados cerca de R$ 20 milhões em nome das empresas de "fachada" que, de fato, pertencem ao escritório de advocacia.
Os prejuízos causados à União são, até o momento, incalculáveis, considerando-se os inúmeros modelos de "blindagem patrimonial" oferecidos pelo escritório de advocacia para os vários clientes identificados.
Empresas
Entre as empresas "clientes" do esquema criminoso estão indústrias de grande e médio porte da área têxtil, de combustíveis, plásticos, avícolas, construção civil e informática. No total, são mais de 40 pessoas jurídicas envolvidas com a fraude.
Os crimes cometidos pelos integrantes e beneficiários do esquema são: lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, evasão de divisas, sonegação fiscal, falsidade ideológica e participação de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crimes previstos na Lei de Lavagem de Dinheiro (art 1.º parágrafo 2.º , II, da Lei 9.613/1998).
Duas prisões em Maringá
Durante a operação da Polícia Federal batizada de Monte Éden, foram presos em Maringá o diretor do frigorífico Canção, Rogério Martini Gonçalves, e o contador da empresa, Jurandir Vieira de Lima. Os dois foram surpreendidos em casa pela polícia, no início da manhã. Na sede do frigorífico a PF também recolheu documentos que serão analisados para comprovar a participação dos dois em fraude. Já em São Paulo, entre os presos, deve estar o advogado Milton de Oliveira Neves, conhecido por defender o ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, preso por desvio de verbas na construção do Fórum de São Paulo.
O diretor do frigorífico, Rogério Gonçalves, é acusado de ser um "clientes" do esquema, e apesar da empresa não ser usada como fachada, os recursos dela eram desviados ilegalmente. O contador seria o responsável por "regularizar" os trâmites do envio do dinheiro. Os dois continuam detidos na Delegacia da Polícia Federal, em Maringá, onde deverão permanecer por cinco dias, prazo dado na prisão temporária.
Ainda ontem eles foram interrogados sobre o suposto envolvimento no crime. O interrogatório será enviado para a coordenação central da operação, em São Paulo. Só depois de analisadas as informações será definido se eles serão liberados ou ouvidos novamente, na capital paulista. Na sede da empresa em Maringá, ninguém quis falar sobre o assunto.