Falta de peritos atrasa processos no Paraná

A morte de uma criança; o assassinato de um preso; a queda de um avião; o desmoronamento de uma fábrica. São tragédias do cotidiano que aparentemente nada tem em comum. No entanto, para que cada um destes casos e milhares de outros – que vão desde simples crimes de estelionato até megafraudes do colarinho branco – possam ser devidamente esclarecidos, precisam passar pelas mãos de um grupo de profissionais que colocam a ciência a serviço da Justiça: os peritos criminais. Nos bastidores das investigações, eles esmiuçam as ocorrências, buscando nos detalhes e no conhecimento científico, a prova que leve ao culpado.

Um conhecido seriado norte-americano (o CSI – Crime Scene Investigation), deu certa notoriedade aos peritos, hoje também chamados de investigadores modernos. Mas a realidade, como sempre, é muito diferente do que aparece na TV. A falta de pessoal, o excesso de trabalho, remuneração inadequada, pouco investimento em cursos e aperfeiçoamentos e falta de equipamentos, são alguns dos fantasmas que assombram os peritos.

O Instituto de Criminalística do Paraná (ICP), que funciona aos mesmos moldes das outras unidades da federação, já ostentou, há alguns anos, o título de o melhor do Brasil em qualidade de laudos e em eficiência. Hoje padece de investimentos e principalmente de novos profissionais.

Como nasceu

Apesar das dificuldades, profissionais se esforçam nos trabalhos.

O Instituto de Criminalística do Paraná foi criado em 1935. Em outubro de 2001 desvinculou-se da Polícia Civil e junto com o Instituto Médico-Legal (IML) passou a formar a Polícia Científica do Paraná, uma nova unidade da Secretaria de Segurança Pública (Sesp), administrativa, técnica e financeiramente independente. Instalado num prédio da Avenida Visconde de Guarapuava, 2652, centro de Curitiba, abriga quatro sessões de atendimento externo: crimes contra a pessoa; crimes contra o patrimônio, engenharia legal e acidentes de trânsito. E possui 14 sessões técnicas que abrangem desde o laboratório de DNA, até os de informática, passando pelos de hipnose forense, fonética forense, balística forense, e de química e microanálise. O de balística é um dos mais requisitados: só no ano passado realizou 2.395 exames.

Os peritos de plantão se deslocam para o local da ocorrência, seja acidente de trânsito, assassinato, desmoronamento, incêndio ou uma explosão. Já os demais recebem material em suas sessões, para os necessários exames. Quase nada passa despercebido para estes profissionais, que carecem de treinamento e atualização constantes, para não perder o fio da meada. Infelizmente, muitas vezes, o crime caminha mais rápido que a polícia científica.

Desvendando o mistério

Um cachorro passa ao lado, sem se importar com o sangue que escorre pela calçada e também não se assusta com as pessoas que cercam o morto, para observar o trabalho da polícia. Só quando chega o perito criminal é que o animal se afasta. Com sangue frio, paciência e muita observação, o profissional dá início à perícia.

A primeira medida é observar se o local de morte está preservado ou se houve interferência. Tudo precisa ser meticulosamente anotado. Depois medido e fotografado.

Realizados os levantamentos, que podem durar horas, o perito forma uma prévia do que pode ter acontecido. Mais tarde, analisando dados, detalhes, medidas e descrições, confecciona o laudo que será enviado à autoridade policial. Através deste documento, a polícia confirmará ou não suas investigações, podendo acusar ou não um suspeito. Quando o local não é ,isolado, o trabalho fica prejudicado.

Atenção

“O local destruído é o que chamados de pobre. Já aquele que não foi mexido é um local rico”, explica o matemático e físico Edimar Cunico, 51 anos, chefe da sessão de Crimes Contra a Pessoa do Instituto de Criminalística do Paraná, onde trabalha há mais de 20 anos. Cunico não é didático, justamente para não revelar coisas que possam ajudar um criminoso. Mas conta que os laudos são peças descritivas e que o perito precisa “ler” o que o local do crime lhe revela. A posição do corpo, as roupas da vítima, o que existe ao redor do morto, o que ele segura nas mãos, tudo é da maior importância. “Cada local requer uma técnica de trabalho. Se a morte foi por tiro, há um jeito de fazer o levantamento. Se foi por asfixia, há outro. É ali, no local, que se começa a desvendar o mistério”, conta Cunico. (MC)

Grande acúmulo de trabalho

A carência de pessoal é o drama que hoje mais aflige a Criminalística. Falta gente para tudo. O acúmulo de trabalho é evidente e isso provoca atraso nos laudos, que atrasam os inquéritos e investigações, que atrasam os processos e estes, por sua vez, quando atrasados, podem beneficiar um réu. O efeito cascata compromete até a Justiça. Em 2007 o governo do Estado abriu concurso para reforçar os quadros da Polícia Civil e da Polícia Científica. Mas eram apenas oito vagas para peritos, que até agora não foram preenchidas, sem nenhuma explicação da Secretaria de Segurança Pública. Os peritos que estão na ativa se desdobram para cumprir as tarefas. Sem auxiliares, eles dirigem a viatura, fotografam os casos e apuram dados. Muitos são deslocados de suas sessões e levados para os plantões, de forma que o atendimento à população não fique prejudicado. Além disso, fazem viagens para cidades do interior, onde ficam por períodos de 10 dias para cobrir a deficiência de pessoal. (MC)

Análises detalhadas e exames

Estudiosos da criminologia, os peritos analisam pingos de sangue, lascas microscópicas em roupas, líquidos, manchas e cadáveres. Cada laudo trás uma conclusão com base na ciência e em estudos dos mais diferentes ramos. A larva de uma mosca que sobrevoa um cadáver pode indicar, quando examinada, há quanto tempo aconteceu o crime. E mais, pode provar que a vítima era usuária de drogas e apontar qual produto consumia. Exames de DNA, mais do que identificar uma paternidade, podem indicar um assassino, por exemplo. A análise das letras numa carta podem confirmar um suicídio ou uma falsificação.

Nem mesmo o estudo da mente humana fica de fora. A hipnose forense é uma realidade praticada no Paraná. O perito Rui Sampaio – que é médico psiquiatra e único a atuar nesta área – quando necessário, faz suas incursões pela mente de vítimas e testemunhas, hipnotizando-as para ajudá-las a lembrar da fisionomia de assaltantes ou homicidas. (MC)

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