Educandário São Francisco pode ser interditado

Violência, fugas, doenças e falta de infra-estrutura. Problemas que, segundo o Sindicato dos Servidores da Secretaria da Criança e da Juventude (Sindesc), fazem parte da rotina no Centro de Sócio Educação (Cense) São Francisco.

Motivado pela última rebelião que resultou em lesões graves num funcionário da instituição, o Sindesc protocolou, no último dia 13, um documento junto ao Ministério Público, onde pede a interdição do centro, caso o número de adolescentes ultrapasse o limite de 80 internos.

Segundo o presidente do Sindesc, Mario César Monteiro, o educandário mantém atualmente 140 menores infratores. De acordo com o site oficial da Secretaria de Estado da Criança e da Juventude, o Cense São Francisco teria capacidade para 130 internos.

?O número acima da capacidade do centro incentiva que alguns adolescentes ganhem a liberdade antes do que deveriam, à medida que novos internos chegam à unidade?, afirma Monteiro.

Para Monteiro, esse fator faz com que o trabalho psicológico para que haja uma ressocialização do menor não aconteça. ?Ele sai pior do que entrou. Além de ficar por tempo insuficiente, no período em que ficam internados os adolescentes têm contato com drogas e ficam submetidos a violência de outros internos?, diz.

O documento entregue ao MP faz uma listagem dos problemas que alguns educadores afirmam existir no Cense São Francisco. O sindicato relata que a falta de infra-estrutura coloca em risco a segurança dos funcionários e dos próprios adolescentes. Segundo o Sindesc, as agressões a servidores são freqüentes porque não há número de educadores que intimidem eventuais investidas dos menores.

?Essa rebelião mostra o quanto é importante o número de educadores adequado, para que o Estado possa se impor?, diz Monteiro que ressalta que a relação ideal seria de cinco adolescentes para cada funcionário. Para o Sindesc, o excedente de menores na unidade contribui para que novas agressões aconteçam.

?No São Francisco tem garotos que fazem parte do crime organizado. Alguns têm uma força física avantajada e, em número superior ao de funcionários, não encontrariam dificuldades em assumir o ?comando? e promover uma rebelião?, conta.

Para Monteiro, o clima tenso diário no educandário faz com que a direção encontre dificuldades para escalar o já insuficiente número de funcionários. ?Tivemos funcionários que mesmo sem sofrer agressões na última rebelião precisaram ser afastados por ordem médica, para tratamentos psicológicos.?

Além das agressões, Mario relata que os internos são vistos fazendo uso de drogas. ?O uso de maconha virou uma instituição lá dentro e o funcionário não pode coibir, porque ele sabe que pode ser vítima de eventuais investidas dos menores dentro da Cense.?

Quanto às denúncias feitas ao MP, a assessoria de imprensa da Secretaria de Estado da Criança e da Juventude afirmou que o órgão só deve se pronunciar caso seja oficializada.

Cense Joana Miguel Richa serve de exemplo

Um exemplo de que o objetivo de ressocialização pode ser alcançado quando o Estado provê a estrutura necessária para isso, é o Centro de Sócio Educação Joana Miguel Richa, exclusivo para a recuperação de meninas que cometeram infrações penais.

A unidade atende todos os quesitos que especialistas afirmam ser fundamentais para a recuperação de menores e infratores.

A instituição oferece, além de cursos profissionalizantes, atividades recreativas e artísticas durante todo o dia. Lá, as meninas freqüentam escolas e, quando saem, são encaminhadas para vagas providas pelo programa Menor Aprendiz, do Governo Federal. Além disso, a orientação para que haja um educador para cada cinco internos é respeitada.

Entretanto, mesmo com toda essa estrutura, para a diretora do Centro, Mariselni Vital Piva, é a estrutura familiar o fator que pode realmente efetivar a ressocialização. ?Temos um índice de reincidência baixo. As menores que fazem parte desse índice voltam para cá porque não têm uma família que possa as acolher.?

Um desses casos é da adolescente P.C.S. Para Mariselni, a menor é uma prova de que não existe infra-estrutura que ofereça uma recuperação plena para jovens infratores, se não houver uma referência familiar para tal.

P.C.S., hoje com 16 anos e grávida de quatro meses, conta que perdeu o pai com três anos e que sua mãe enfrenta problemas com a bebida.

A menina também afirma que sofreu abusos sexuais do padrasto.

Reincidente de tráfico de drogas, P.C.S. está internada pela terceira vez. Na primeira, a menina tinha 14 anos quando foi presa com crack em Cascavel. Quando deixou o Centro, a garota ganhou um emprego numa lanchonete e foi morar com uma família acolhedora, com quem não ficou por muito tempo.

?Não me senti em casa porque não era minha família de verdade?, conta. Entretanto, a menor diz que foi a possibilidade de faturar dinheiro alto que fez com que ela caísse novamente no mesmo crime.

Hoje, a garota fala em reabilitação e pensa em ficar longe dos delitos por causa do filho que está pra nascer. (NA)

Reincidência ainda é alta

Segundo a Secretaria de Ação Social, o índice de jovens que cometem infrações reincidentes ainda é alarmante no Paraná.

Em 2005, 42% dos jovens que foram encaminhados para a internação provisória retornaram aos centros de sócio educação. Outros 23% são reincidentes que foram internados por tempo determinado.

Conforme a promotora Valéria Teixeira Grilo, do Centro de Apoio Operacional da Promotoria da Criança e do Adolescente do Ministério Público do Paraná, não há exatidão nos dados, já que alguns ex-internos, já maiores de idade, vão para penitenciárias quando voltam a cometer delitos.

Grilo acredita que o sistema que atua na recuperação de adolescentes está caminhando para a plenitude da ressocialização de menores infratores. No entanto, ela entende que esse sistema é passível de modificações.

A promotora afirma que a ressocialização é bem mais complicada quando a internação priva o jovem infrator de sua liberdade. ?Queremos o cumprimento das medidas sócioeducativas em meio aberto. As ações centradas na reintegração social do jovem no próprio meio social têm mais possibilidades de êxito?, comenta.

Quanto ao excedente de internos nos centros de sócio educação no Paraná, a promotora admite que é uma questão que bate de frente com a ressocialização. (NA)

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo