Há sete meses foram encontrados, boiando sobre as águas do Rio Barigüi, na Fazendinha, pedaços do corpo de um mulher. As duas pernas e uma braço com a mão foram levados ao Instituo Médico-Legal, e até hoje não se sabe a identidade da vítima, muito menos quem cometeu o crime. Este é apenas um dos 29 corpos que aguardam identificação no IML, ou que não foram reclamados pela família. Eles, provavelmente, se somarão a centenas de outros cadáveres enterrados nos cemitérios como indigentes.
Diariamente o IML recebe para necropsia corpos de pessoas vítimas de morte violenta ou natural (sem assistência médica). Quando a família identifica o corpo ele é liberado em menos de 24 horas. Porém, as pessoas que foram encontradas sem documentos ou que não foram procuradas por familiares, ficam guardadas nas ?geladeiras? do instituto. Das 69 câmaras frias, metade aguarda manutenção.
Depois de permanecer 30 dias sem ser identificados ou reconhecidos, os corpos aguardam autorização judicial para o sepultamento. Dos 29 cadáveres recolhidos no IML, 12 então em processo para sepultamento. Entre eles, os de seis pessoas identificadas.
Depois de autorizado o enterro, em 15 dias, o corpo é levado a um dos cemitérios de Curitiba. Porém, a superlotação de covas faz com que os corpos fiquem ainda mais tempo nas ?geladeiras?. Na lista dos chamados ?NI? (não identificados), também estão dois fetos e um bebê que nasceu morto.
Segundo funcionários do IML, muitas vezes as famílias procuram pelos parentes depois que eles já foram sepultados como indigentes. Por isso, os cadáveres são fotografados antes de ser enterrados. A partir das imagens, os parentes fazem o reconhecimento e entram com processo para oficializar o óbito. Eles podem então escolher outro local para fazer novo enterro.
As pernas e o braço da mulher, que teria entre 20 e 30 anos, ainda não têm data para serem enterrados. ?Provavelmente ela era de outro estado, por isso, às vezes, a família nem desconfia que foi morta aqui. Ela era uma mulher nova e bem cuidada?, disse um dos funcionários do IML que coletou as impressões digitais da mão encontrada.
Cemitérios lotados
Ao lado de milhares de túmulos bem cuidados e ornamentados com flores e pequenos jardins, está uma ala que se poderia dizer abandonada do maior cemitério municipal de Curitiba – o Cemitério do Santa Cândida, fundado em 1957. As cruzes de madeira, sem pintar, marcadas apenas por números, indicam o local onde há um corpo enterrado. Ali não há fotos ou nome dos falecidos.
É nesse local que, durante anos, foram sepultados corpos de pessoas carentes ou que não foram identificados ou reconhecidos por familiares. Porém, o cemitério, que abriga mais de 8 mil túmulos, não tem mais espaço para esses casos. Há quatro anos o local não recebe mais corpos, pois o fato de eles serem colocados direto na terra fez com que houvesse contaminação no lençol freático que passa pelo local. Para tentar solucionar o problema, foram construídas algumas gavetas de cimento, mas elas também já estão lotadas.
Segundo um funcionário do cemitério, apenas nos próximos três anos haverá vagas nessas gavetas. ?Depois desse período, os ossos são recolhidos e colocados no ossário geral do cemitério?, explicou. Por causa da superlotação das covas os corpos dos indigentes e carentes estão sendo sepultados no Cemitério Parque São Pedro, no Uberaba.
Instituto só recolhe quem não tem assistência
O Instituto Médico-Legal recolhe corpos de pessoas vítimas de morte violenta, ocorrida na capital e em outros 32 municípios próximos à cidade. No caso de morte natural sem assistência médica, o serviço é feito apenas na capital, cabendo ao sistema de saúde de cada município responsabilizar-se pelo corpo. Por isso, quando alguma pessoa morre nessas condições, a família deve procurar o IML para identificar a vítima. Depois, deve ir até a delegacia responsável (geralmente a Delegacia de Homicídios em Curitiba, ou do município, no caso da Região Metropolitana) munida de documentos seus e do falecido. Nos distritos policiais é expedida a guia de necropsia, que deve ser levada ao IML para a liberação do corpo.
A necropsia é feita em algumas horas. Quando o cadáver dá entrada no órgão depois da meia-noite, o exame só é feito pela manhã, uma vez que é proibida a necropsia durante a madrugada. O telefone do IML é 3281-5602.