Detentos amotinados fazem refém em São José dos Pinhais

Apesar de as autoridades ignorarem que movimentos como Primeiro Comando da Capital (PCC) e Primeiro Comando do Paraná (PCP) agem no Estado, presidiários tentaram dar mais uma demonstração de força, ontem. Às 11h, eles se rebelaram em três galerias do Centro de Detenção Provisória de São José dos Pinhais. Um agente penitenciário foi mantido  refém, com estoque no pescoço, por quase cinco horas.

As autoridades também não confirmaram a ligação do motim com a prisão do advogado André Lanzoni Pereira, ocorrida anteontem. Ele seria o responsável por estender à capital paranaense os movimentos da facção criminosa paulista (PCC). "Um dos detentos que conversou com este advogado estava envolvido na rebelião, mas nada ficou caracterizado", disse o comandante do Batalhão de Polícia de Guarda (BPGD), Amauri Lubian.

Rebelião

A rebelião começou quando um agente penitenciário foi levar um preso de volta à galeria quatro, ocupada por 31 detentos, e foi rendido pelos detentos. O movimento se espalhou pelas galerias cinco e seis, mas foi contido rapidamente, com a presença de cerca de 70 homens de grupos de elite da Polícia Militar e do Centro de Operações Policiais Especiais (Cope). Com o estoque no pescoço do agente, que não teve o nome revelado, os presos exigiram a presença da imprensa e do juiz corregedor. Por volta das 14h, uma equipe da TV Educativa e a assessora de imprensa da Secretaria da Segurança Pública entraram no prédio. Outros veículos de comunicação não puderam entrar.

Alguns presos tentaram se comunicar com a imprensa e jogaram um bilhete enrolado em uma pedra. Um repórter chegou a apanhar o recado, mas antes que pudesse lê-lo, um policial arrancou-o de suas mãos.

Por volta das 14h30, duas ambulâncias do Siate chegaram ao local para socorrer os presos feridos com balas de borracha, usadas pelos policiais para conter o tumulto. Às 15h30, vários agentes que estavam em frente ao presídio comemoraram a libertação do refém. Era o fim da rebelião.

Chiadeira geral do lado de fora

Após o fim do motim e sem notícias, os familiares do presos começaram a ficar irritados e denunciaram que os presos estariam passando fome dentro do presídio. "Meu marido já emagreceu 15 quilos. Não deixam a gente trazer comida para eles Não tem visita íntima, não tem banheiro para as visitas. A gente é humilhada aqui. Já falamos com o diretor para tentar resolver, mas nada foi feito", denunciou uma mulher, que apesar de mostrar o rosto para as câmeras de televisão, preferiu não dar seu nome. "Todos estão revoltados aí dentro", disse uma outra mulher, aos gritos. "Eles só têm direito de ficar deitados e escutar rádio. Erraram e têm que pagar por isto, mas são gente, não são bicho", denunciou outra mulher. "A última refeição é às 17h30 e às 22h apagam as luzes", disse Sirlene, que tem um filho preso.

As reclamações dos familiares eram as mesmas dos presos, que entregaram uma carta ao juiz corregedor pedindo melhorias no sistema. "As reclamações são relacionadas a comida, horário de sol e banheiro. Dentro de um período, acredito que sejam atendidas", disse o coronel Amauri Lubian, comandante do Batalhão de Polícia de Guarda (BPGD). Outra reivindicação dos detentos era revisão de penas.

Facção criminosa queria Curitiba igual a São Paulo

Lígia Martoni

O advogado Dálio Zippin Filho, que acompanhou anteontem (15) o flagrante de prisão do advogado André Lanzoni Pereira, acusado de tentar incitar rebelião no Centro de Detenção Provisória de São José dos Pinhais, disse ontem que a idéia da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) era iniciar as rebeliões nos presídios em São Paulo e Curitiba simultaneamente. O próprio André Pereira teria contado a intenção, dizendo que estava sob ameaça do comando da facção criminosa.

Segundo o advogado preso, outros advogados foram "nomeados" para fazer o mesmo alerta aos presos em Curitiba e RMC. "Além do Centro de Detenção de São José, a ordem era incitar rebeliões na Prisão Provisória de Curitiba e na Casa de Custódia", afirmou Zippin, que agora tem Pereira como seu cliente. Conforme informou, o advogado estava sob forte ameaça do PCC, uma vez que o recado deveria chegar aos presos na sexta-feira. "Ele não obedeceu e estava sendo já ameaçado de morte. Como estava amedrontado, falou com os presos em voz alta propositalmente para alertar os agentes penitenciários." Foi a partir da suspeita dos funcionários que a polícia foi acionada e prendeu o advogado.

Lista

Dálio Zippin informou ainda que havia uma lista de dez presos que seriam alertados pelo PCC para iniciar as rebeliões nos três presídios. Ele chegou a ver a lista – que é mantida em sigilo pelo Centro de Operações Policiais Especiais (Cope) -, mas disse não haver nenhum nome de presos conhecidos. "O recado era simplesmente: ?Vocês sabem o que fazer. A hora é agora’?, afirmou Zippin.

Risco para funcionários

O tumulto no Centro de Detenção Provisória de São José dos Pinhais teria sido instigado por integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC), segundo a presidente do Sindicato dos Servidores Penitenciários, Sandra Márcia Duarte. Ela disse que isso traz grandes riscos para os agentes penitenciários.

"As autoridades devem respeitar esses comandos, que colocaram uma metrópole de joelhos", disse, referindo-se à onda de violência que atingiu São Paulo. "Felizmente, aqui em São José dos Pinhais, a rebelião não foi de grandes proporções, mas é um recado para o Estado, que deve tomar precauções. Deve reforçar a segurança e alterar a rotina", salientou.

Sandra disse que, atualmente, há somente 12 agentes penitenciários trabalhando no período da noite no Centro de Detenção de São José dos Pinhais. "Dizer que não tem integrantes do PCC e do PCP nas nossas penitenciárias é uma ingenuidade. Precisamos de uma movimentação rápida do judiciário. O aviso já foi mandado no dia 7 de abril", alertou. Ela se referia à morte do estudante Miguel Baron Neto, 15 anos, filho de um agente penitenciário de Piraquara, executado a tiros dentro de sua casa, no Bairro Alto. Ao lado do corpo, os criminosos deixaram uma faixa branca, escrita "abaixo a opressão".

Agente fala da morte do filho

O pai do estudante Miguel Baron Neto, agente de segurança lotado no Complexo Médico Penal, em contato com a Tribuna – ontem – negou que a morte do garoto de 15 anos tenha sido planejada pelo PCC. Ele admite que o assassinato ocorreu "por engano". Os criminosos estavam atrás de outra pessoa, ligada ao sistema penitenciário, cujo sobrenome é parecido com o seu. E o motivo estaria ligado ao tráfico de drogas. De acordo com o agente, a Delegacia de Homicídios já tem investigações avançadas sobre a ocorrência e deve, em breve, prender os autores. Quanto a ele, nunca manteve nenhuma ligação com o crime organizado nem sofreu ameaças de qualquer organização criminosa. "A morte do meu filho foi um grande engano. Ele era um excelente garoto", afirmou.

Secretaria culpa Zippin pela rebelião

Em nota, a Secretaria da Segurança Pública afirmou que "a divulgação irresponsável feita ontem (anteontem) pelo advogado Dálio Zippin para toda a imprensa a respeito da prisão do advogado André Lanzoni Pereira foi a principal causa para o tumulto que aconteceu nesta terça-feira (16) no Centro de Detenção Provisória de São José dos Pinhais". Segundo a secretaria, "a informação foi mantida sob sigilo para evitar que os presos se rebelassem contra a prisão do advogado". O repasse das informações pelo advogado teriam incentivado a ação, acredita a Secretaria.

Dálio Zippin rebateu a acusação com apenas uma pergunta: "Se foram as minhas declarações que incitaram a rebelião, por que então ela só aconteceu no presídio onde os presos foram avisados e não nos outros dois?". O advogado promete processar o secretário de Segurança Pública por causa da acusação.

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