Fotos: Mara Cornelsen e Rotam 12.º BPM |
Grupo ajuda quem é pego pela PM. |
Deitado na marquise da calçada, nas esquinas da Alameda Cabral com Rua Jesuíno Marcondes, centro de Curitiba, o rapaz de idade indefinida parece estar dormindo ao lado de outro, sentado sob a chuva, com olhar distante, hipnótico. Desfigurados pelas drogas, eles são o que a polícia costuma chamar de ?criaturas da trevas?. Habitam as ruas a partir das 20h, em busca de pedras de crack, cocaína e maconha. São capazes de qualquer coisa para obter a droga, inclusive matar. Antes do nascer do sol vão desaparecendo já dopados e bêbados. Não se sabe para onde vão, mas, com certeza, no próximo anoitecer estarão outra vez pelas mesmas ruas, a menos que a morte os encontre antes.
Maioria usa a noite para consumir drogas. |
A rotina dos traficantes e viciados que perambulam pelo centro da capital é assustadora. Prostitutas com pouco mais de 20 anos e aparência de muito mais, fazem a ponte entre fornecedores e usuários.
A maioria delas não consome a droga, mas, com ela, garante o sustento diário que já não é obtido pelo corpo que rapidamente perde os atrativos, já que a concorrência é feita por meninas muito mais novas, algumas com menos de 12 anos. Por R$ 5,00 ou R$ 10,00 elas vendem as pedras de crack (dependendo do tamanho) e por quantia igual também fazem os programas, desde que o cliente pague o hotel ou aceite transar em uma esquina escura.
Esconderijos
O submundo das drogas habita bueiros, orelhões, fendas nas calçadas e paredes. Até mesmo galhos de árvores.
Pedras em toda parte. |
Os policiais militares que fazem o patrulhamento no anel central, com ênfase no combate ao tráfico, precisam de astúcia e olhos de lince. A área é de competência do 12.º Batalhão da PM (que também atua em outros 35 bairros da cidade). Esta semana, a Tribuna pegou carona em uma das rondas noturnas e constatou – com tristeza – a destruição física e moral provocada pelos entorpecentes.
Ao mesmo tempo que a polícia apura suas táticas para encontrar os traficantes, eles e os usuários aprimoram suas formas de ludibriar os PMs. Ser apanhado com drogas representa uma temporada na cadeia. Se o ?bagulho? está em outro lugar, a polícia não tem como provar de quem ele é. Por isso, os bueiros transformaram-se em esconderijos perfeitos. Neles tudo é guardado. Roupas, tênis, drogas, cigarros dividem espaço com ratos, baratas, e outros bichos. Durante uma blitz, não há como deixar de abrir os bueiros e revirar o que tem dentro. Trabalho duro, indigesto e insalubre.
Polícia faz abordagens freqüentes. |
Hoje em dia, todo policial em ação usa luva cirúrgica (ou luva de couro) para se proteger de doenças. E uma potente lanterna. Enquanto uns revistam os suspeitos, outros vasculham bueiros, frestas nas paredes, calçadas e também os telefones públicos, que são perfurados, desmontados ou simplesmente destruídos para que o crack seja escondido. Em quase 100% das investidas pelo menos uma pedra é encontrada.
A violência de todos os dias
Depois de fumar a terceira pedra de crack e saber que não tem dinheiro para mais uma, ?Pernambuco? não tem dúvida. Apanha a faca que traz na cintura, pára numa esquina e espera o semáforo fechar. Se algum motorista estiver ?desligado?, com a janela aberta ou falando ao celular, pronto! O problema está resolvido. Saca a faca, dá voz de assalto, leva o telefone, ou a carteira, ou a correntinha, ou qualquer outra coisa que esteja mais à mostra, e sai correndo. Mistura-se com outros de seu grupo, passa a muamba pra frente e logo alguém a faz chegar às mãos de um fornecedor. O negócio é fechado e novas pedras são obtidas para consumo.
Luva é necessária. |
Se o usuário-assaltante estiver armado com revólver, o problema é ainda maior. Se a vítima titubear, leva balaço no rosto. Ele não está pra brincadeira. Vale qualquer coisa para conseguir mais algumas pedras, vale até mesmo uma vida. ?Pernambuco?, um sujeito de 26 anos que já passou por várias capitais do País, perdeu há anos o emprego e os laços familiares. Chegou em Curitiba e começou a guardar carros. Viciou-se em crack e hoje também vende algumas pedras, para poder sustentar o vício. Já esteve preso algumas vezes, mas nem liga mais pra isso. Uma certeza ele tem: está em um caminho sem volta. Assim como ele, dezenas de outros…