Cobradores temem pela vida durante o trabalho

Uma vida pode valer muito pouco para os marginais, mas vale muito para os motoristas e cobradores que todos os dias correm o risco de ser mortos por assaltantes. Não por reagir, mas muitas vezes por não ter a quantia pretendida pelos marginais na caixa coletora. Este ano, segundo dados do Sindicato dos Motoristas e Cobradores nas Empresas de Transportes de Passageiros de Curitiba e Região Metropolitana (Sindimoc), um cobrador foi assassinado, outro ficou incapacitado e oito foram baleados.

“O secretário da Segurança anunciou que os índices de criminalidade estão caindo, mas a realidade é o outra. Os motoristas e cobradores estão sentindo na pele. É triste, mas é a pura realidade”, lamentou Denilson Pires, presidente do Sindimoc. “O pior de tudo isso é que procuramos o secretário, o coordenador da Promotoria de Investigação Criminal (PIC), o comando da Polícia Militar, da Polícia Civil, e nada. Só queremos achar uma solução para o problema, mas ninguém nos atende. Marcam reuniões e depois desmarcam alegando que têm outros compromissos. É um descaso com os trabalhadores. Estamos desesperados”, salientou.

“O pior de tudo é que não é só a categoria que sofre. Agora os marginais estão fazendo arrastão. Além de roubar o dinheiro do caixa, limpam os passageiros. Será que ninguém vê isso? Será que os governantes não lêem jornais, não vêem televisão e não escutam rádio?”, indaga desesperado o presidente do Sindimoc.

Aumento

Com planilhas nas mãos, Denilson mostra que, do dia 1.º de janeiro deste ano até 31 de julho, já foram registrados 3.576 roubos contra coletivos e estações-tubos. No mesmo período do ano passado, foram 2.751. “Durante todo o ano passado foram 4.515 assaltos. Este ano vai passar muito disso. É preciso fazer alguma coisa”, assegura.

Segundo o sindicalista, em 2001 – nos sete primeiros meses do ano -, foram registrados 2.695 roubos. E em 2000, 1.442. “Como podem ver só aumenta. Se continuar deste jeito, onde vamos parar?”, pergunta. A revolta de Denilson é de todos os trabalhadores, que já ameaçam parar de trabalhar nas linhas mais visadas pelos marginais. “Quem vai pagar por isto é a população. Não é justo. Mas também não é justo que os presos tenham garantias asseguradas na Lei e os trabalhadores não”, desabafou.

Números

Para tentar arrumar uma solução para o problema, o presidente do Sindimoc tem dados organizados, numerando as 20 linhas de ônibus e das 20 estações tubo, mais atacadas pelos malandros.

No ranking de linha de ônibus, o primeiro lugar é a linha Trabalhador, que atende o Carmo, com 97 roubos. Em segundo, com 85 assaltos, está a linha Sabará, no Pinheirinho. O terceiro e quarto lugares ficam com o Cajuru, a Acrópole registrou 73 roubos, seguida pela Solitude com 68.

Quanto às estações-tubo, em primeiro lugar em número de assaltos está a Vila Nova, no Capão da Imbuía, com 70 roubos. Em segundo a Antônio M. Sobrinho, no Cajuru, com 64; e em terceiro a estação Teófilo Otoni, também no Cajuru, com 47. Quase encostada, em quarto lugar, está Paulo Kissula, no Cajuru, com 45 assaltos.

“Polícia prende e Justiça solta”, diz sindicalista

Segundo dados do Sindimoc, nos seis primeiros meses deste ano, 69 pessoas foram presas em flagrante assaltando ônibus ou estações-tubo. O presidente do Sindimoc, Denilson Pires, diz que a maioria desses presos é solta em seguida pela Justiça e volta a atacar os motoristas e cobradores. “Temos acompanhado todas as prisões. Criamos um setor no sindicato só para isso. Queremos garantir que estas

pessoas cumpram suas penas e não sejam beneficiadas pela Justiça. O problema é muito grave”, argumentou Denilson.

Cobrador assaltado três vezes em oito dias

“Nove assaltos em oito anos de serviço”. Está é a história do cobrador S.B.C., 29 anos, casado, pai de um garoto de 3 anos – a mulher está grávida de sete meses. Ele conta que seu horário é pela manhã. Pega no batente às 6h11 e vai até às 11h37. A linha é a Solitude, a quarta mais visada pelos marginais, segundo estatística do sindicato da categoria.

Nos últimos oito dias ele foi assalto três vezes. Um dos roubos ocorreu às 7h, outro às 10h30 e o último às 9h30. “Acabei de ser assaltado novamente. Desta vez levaram R$ 19,80”, salientou.

S.B.C. contou que na semana passada, uma mulher o assaltou. “Ela quase me matou porque no caixa só tinha moedas. Tive que tirar R$ 5,00 do bolso para entregar a ela e não ser assassinado. Ela me ameaçou com uma faca”, contou. A mulher, que o assaltou foi Tainá Aparecida Campos, a “Gaúchinha”, 26 anos, presa em flagrante pela Polícia Militar, às 20h50 de segunda-feira, após praticar um roubo contra outro ônibus, também da linha Solitude. “Tem hora que fico indignado. Ser assaltante parece que é melhor do que trabalhar. Eles nem precisam de arma. Às vezes pegam uma pedra, enfiam embaixo da blusa e dão voz de assalto. Mas nunca dá para arriscar, porque às vezes é arma mesmo. Além disso, vão para a cadeia e logo estão dentro do ônibus de novo, levando o dinheiro”, relatou o cobrador.

O cobrado, diz temer pela vida, principalmente quando chega no ponto final do Solitude. “Nem a polícia vai lá. É bandido em cima de bandido”, reclama o cobrador. “Todos os dias quando vou trabalhar, saio com medo. Quando acabo o serviço, agradeço por estar vivo e no outro dia começa tudo de novo”, desabafou o jovem.

DFR busca identificação de criminoso

O cobrador de ônibus José Piechotta, 38 anos, foi executado a tiros, no dia 26 de abril durante um assalto dentro do coletivo Vila Verde, Cidade Industrial. O motivo: ele só tinha R$ 10,00 no caixa e o bandido queria mais dinheiro. Como não “arrumou a grana” pagou com a própria vida.

O inquérito foi instaurado na Delegacia de Furtos e Roubos, sob o n.º 125/2003, mas até agora o autor do latrocínio continua impune. Nem sequer foi identificado. Talvez esteja roubando ônibus ainda, colocando vida de trabalhadores em risco.

De acordo com a DFR, há dificuldades para elucidar este latrocínio, pois as testemunhas se negam a reconhecer o criminoso ou prestar informações que ajudem na identificação do criminoso.

Golpes de marreta deixam motorista inválido

Ferido a marretadas durante um assalto, a vida do motorista Celestino Martino Leite, 55 anos, mudou. O roubo ocorreu às 22h do dia 24 de fevereiro deste ano, quando o trabalhador fazia a linha Jardim Gramado, em Almirante Tamandaré. O coletivo foi invadido por três marginais. Além do motorista, a cobradora do ônibus e um passageiro também foram feridos.

Celestino estava contando os dias para sair de férias e em seguida iria dar entrada no pedido de aposentadoria. Mas teve seu sonho despedaçado pelas marretadas. Ele iria se aposentar com um salário de R$ 1.100,00 e agora vive com apenas R$ 450,00 da Previdência, já que foi aposentado por invalidez. O pior disso, é que aquele homem saudável, disposto a carregar centenas de passageiros por dia, agora passa o dia no sofá de casa, no bairro Cachoeira, em Almirante Tamandaré. Para se locomover precisa ser ajudado por familiares ou amigos.

Roubo

O motorista e a cobradora faziam o trajeto de rotina. Quando passavam pelo Jardim Gramado, três homens embarcaram e anunciaram o roubo. Um dos marginais apanhou a marreta, usada para verificar a calibragem de pneus e começou a bater na cabeça de Celestino, que não havia esboçado nenhuma reação. Vendo o colega de trabalho ser espancado, a cobradora Telma Regina da Cunha, 39 anos, tentou socorrê-lo e também foi agredida. O passageiro Vladimir Alves de Lima, 26 anos, tentou impedir que os marginais matassem os dois trabalhadores, e também foi ferido levando uma facada e marretadas.

Pouco depois, dois dos marginais foram presos. Saulo Ribeiro Zaczeski, 18 anos, e Everaldo de Assis, de 19. Eles foram apanhados porque Saulo também se feriu no assalto e procurou ajuda no Hospital Cajuru. Lá foi reconhecido pelo passageiro ferido e terminou sendo preso pela PM.

Saulo e Everaldo continuam presos na Delegacia de Almirante Tamandaré, mas o dano que causaram ao motorista Celestino e sua família é irreparável.

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