Carceragens no Paraná em situação caótica

A fuga de 11 presos do 7.º Distrito Policial, em Curitiba, na semana passada, expôs mais uma vez as condições desumanas em que vivem os detentos no Estado. Embora o número de vagas no sistema penitenciário tenha aumentado nos últimos meses, a situação das carceragens de algumas delegacias e distritos do Estado continua caótica. Enquanto policiais civis fazem o papel de carcereiros e não têm tempo para investigar, presos se amontoam em celas superlotadas e fétidas e muitas vezes aguardam até dois meses para passarem pelo primeiro interrogatório na Justiça.

De acordo com a Secretaria Estadual de Segurança Pública (Sesp), há cerca de 8 mil presos nas delegacias e distritos do Estado. 30% deles já estão condenados e deveriam estar no sistema penitenciário. Porém, ainda segundo a Sesp, este número vem diminuindo desde o ano passado com a abertura de novas unidades prisionais. Mas para o promotor de Justiça da Vara da Corregedoria de Presos de Curitiba, Pedro Carvalho Assinger, o maior problema encontrado nas fiscalizações da corregedoria é a superlotação nas celas. Na opinião do promotor, é praticamente impossível resolver a superpopulação carcerária em delegacias, porque todos os dias ocorrem mais crimes e, conseqüentemente, mais marginais vão para trás das grades. ?O crime sempre vai existir. Mesmo que se construa mais e mais penitenciárias, a cada dia vão aparecer mais presos. É um círculo vicioso?, afirma o promotor.

Policiais civis que preferem não se identificar estão cada vez mais indignados com a situação. Eles afirmam que, por mais que alguns distritos da capital tenham suas carceragens desativadas, que é o caso do 1.º, do 3.º e do 8.º, o problema não se resolveu. ?Tiram eles de uma delegacia, mas colocam em outra. Isso não é resolver o problema, é aumentar. Agora nós não podemos nem mais entrar nas carceragens para fazer pente-fino, pois os corredores das celas estão todos ocupados porque não tem mais lugar dentro delas?, reclamou.

O presidente do Sindicato dos Policiais Civis de Londrina (Sindipol), Admilson Alves Batista, reconhece que a abertura de cerca de 900 vagas no sistema penitenciário da cidade pode até melhorar a situação a curto prazo, mas não é definitivo. ?Em Londrina, todas as nossas delegacias estão superlotadas, os policiais e a população correm constantes riscos. E além de termos o problema da falta de pessoal, os investigadores ainda têm que ficar vigiando preso. Se aqui em Londrina está assim, imagine no interior, que há menos policiais ainda?, afirmou. Para Batista, a solução é investimento em unidades novas. ?É claro que o crime tem suas causas sociais. Sabemos que polícia está trabalhando porque está prendendo. Porém, é uma necessidade que tenhamos unidades onde os presos possam cumprir a pena de verdade, sem fugir?, indignou-se.

Com relação aos problemas verificados em delegacias e distritos de polícia, o chefe da Divisão Policial da capital, Walter Baruffi, diz que o governo Requião tem inaugurado novos presídios com freqüência, e que isso vem resolvendo o problema na medida em que os condenados que estão em distritos passam ao sistema e, conseqüentemente, novas vagas são abertas nas carceragens distritais. ?Em apenas um ano esvaziamos dez distritos de polícia. Não podemos afirmar a data, mas acredito que em mais um ano resolveremos a situação das outras delegacias?, informou. Indagado sobre a rotatividade de detentos – que faz com que as celas vazias se encham rapidamente – Baruffi faz uma afirmação: ?Temos que perseguir o ideal de ver delegacias e distritos sem carceragem?.

Delegados apontam principais problemas

Foto: Fábio Alexandre/O Estado
Rubens: ?Sai pouca gente.?

A falta de rotatividade por conta da grande quantidade de presos detidos todos os dias, a morosidade da Justiça e a falta de vagas são os principais problemas apontados pelos delegados de polícia que acompanham de perto a situação do sistema carcerário no Paraná.

No 12.º Distrito Policial, em Santa Felicidade, há 103 presos em um espaço para apenas 16. Na opinião do delegado do local, Jairo Estorílio, é um absurdo o preso entrar na delegacia e ficar meses, quando o necessário seria apenas 24 horas para fazer o flagrante. Para o delegado, tudo se resolve com a questão das vagas. ?O sistema penitenciário não tem problemas com vagas. Mas não é um órgão público, se chega alguém lá eles não atendem. Mas aqui na delegacia eu tenho que atender o dia inteiro, enquanto a minha carceragem está explodindo. Ou seja: pega-se um órgão público e anexa-se um presídio. Não dá para entender. É uma questão histórica, não só desse governo, que todos nós temos que resolver?, afirmou.

Já para o delegado da Delegacia de Furtos e Roubos de Curitiba, Rubens Recalcatti, o maior problema com relação à superlotação das carceragens é a falta de rotatividade. ?Entra muita gente e sai pouca?, disse. Para ele, as vagas criadas pelo governo do Estado até podem amenizar a situação, mas não há como resolver tudo a curto prazo. ?Podemos até solucionar o problema temporariamente, mas o volume de gente sendo presa todos os dias é muito grande?, observa. Recalcatti acha que uma mudança profunda nas leis também poderia ajudar. ?Alguns crimes poderiam ser enquadrados na lei de juizados especiais, claro que com alguns critérios. Sem falar que também poderiam ser criadas pelo menos mais dez delegacias distritais, para aliviar o volume de trabalho daquelas que já existem?, opina.

Para Selma Braga Morais, delegada do 7.º Distrito Policial, a morosidade da Justiça gera o caos nas carceragens. ?A demora gera um efeito cascata. Tenho presos aqui que esperam até 40 dias para o primeiro interrogatório?, afirmou.

Morosidade da Justiça atrapalha

Valdemir de Jesus Abadias está preso no 7.º Distrito Policial de Curitiba há pelo menos sete meses. O local passou por uma fiscalização do Conselho Penitenciário da OAB-PR e também pela Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Paraná depois que surtos de sarna e varicela surgiram em meio aos 140 presos que estão confinados em celas onde cabem apenas 40. Abadias foi detido porque furtou um tacógrafo. Segundo ele, somente depois de dois meses de sua prisão é que foi realizado seu primeiro interrogatório na Justiça, quando o correto seria acontecer em no máximo 15 dias.

?O maior problema aqui é isso. Ficar esperando no meio de um monte de gente doente, com superlotação?, reclamou o preso. Situações como essa, de morosidade da Justiça, são comuns no Paraná. Isto porque não há advogados públicos suficientes para atender tanta gente que entra no sistema prisional todos os dias. Então, muitos deles acabam abandonados em celas fétidas, em situações insalubres, com ânsia de fugir. Para a coordenadora do Projeto OAB-Cidadania, Lúcia Beloni, a demora na justiça gera a falta de rotatividade e, como conseqüência, a falta de vagas. Por isso, a luta dos coordenadores do projeto é a criação de uma Defensoria Pública que tenha advogados com carreira, motivados a atender a população carcerária. ?Os defensores que existem hoje não são suficientes para atender à demanda?, afirmou a advogada.

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