Foto: Ailton Santos/Jornal Hoje |
Manifestação pediu punição a matadores de Valmir Mota de Oliveira (a baixo). continua após a publicidade |
O dia de ontem foi de comoção e indignação pelas mortes de um sem terra e de um segurança no confronto na fazenda Syngenta, em Santa Tereza do Oeste, ocorridas no domingo. Em um ato de homenagem ao militante Valmir Mota de Oliveira, morto com dois tiros, integrantes da Via Campesina e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) lembraram a luta pela reforma agrária e seguiram em cortejo até o Cemitério Jardim da Saudade, em Cascavel, onde o corpo foi enterrado.
A polícia, por sua vez, promete solucionar os assassinatos do sem terra e do segurança Fábio de Souza, também baleado durante o conflito. Apesar disso, o coronel Celso José Mello, chefe do Comando do Policiamento do Interior, prefere não apontar culpados por enquanto. ?Não estamos julgando o movimento (Via Campesina) nem a própria empresa (NF Segurança, onde trabalhavam os seguranças que se envolveram no conflito). Estamos falando do fato em si, o qual terá de ser esclarecido?, diz.
De acordo com o policial, os despojos das balas resultantes da troca de tiros já foram colhidos pela perícia e devem ser confrontados com as armas dos crimes, pelas quais a polícia ainda procura. Os sete seguranças presos no domingo continuam detidos, mas se negam a prestar depoimento. A expectativa da polícia é que o dono da empresa, Nerci de Freitas, já localizado, relate o nome de quem comandou a intervenção armada.
Versões
As versões sobre os crimes, entretanto, são controversas. A Via Campesina atesta que os seguranças, depois de expulsos da fazenda, voltaram atirando contra os sem terra e perseguiram não apenas Valmir, mas outros líderes do movimento. De acordo com a Via Campesina, não foram feitos reféns. ?Quem mandou matar o nosso companheiro Keno (apelido de Valmir) foi a Syngenta e os ruralistas?, acusou Celso Ribeiro Barbosa, líder do MST.
Nerci de Freitas, porém, conta uma outra história. Segundo ele, os seguranças voltaram à fazenda para libertar três colegas capturados pelos sem terra. ?Só revidamos porque fomos recebidos a tiros. Eles têm armamento pesado?, acusa, referindo-se aos acampados. O segurança garante que todos os seus homens tinham autorização para portar armas e eram treinados. Freitas disse que vai se apresentar à polícia amanhã.
A Syngenta refutou com veemência a declaração da Via Campesina de que a empresa teria dado ordem para que se disparasse contra qualquer indivíduo. A Federação dos Vigilantes do Paraná repudiou o ato dos seguranças, considerando-o criminoso e denunciando que a NF, há duas semanas, foi invadida pela Polícia Federal sob acusação de contrabando de armas e munições do Paraguai.
Confronto gera polêmica na Assembléia
O confronto na fazenda experimental da Syngenta foi tema de discussão ontem na Assembléia Legislativa do Estado, em Curitiba. O deputado Hélio Rush (DEM) disse que há muito tempo o direito à propriedade está sendo desrespeitado no Paraná. Rush afirmou que é a favor da reforma agrária, ?mas tem que respeitar o direito à propriedade?, ressalvou.
O parlamentar Edgar Bueno (PDT) atribuiu a responsabilidade do episódio ao governo estadual, considerando um erro o estímulo à invasão da fazenda e culpando o governador Roberto Requião por proteger as ações dos sem terra e desafiar aqueles que se opõem ao movimento. Para Bueno, o governo se omitiu diante de um ?desastre anunciado?.
Já Elton Welter, líder da bancada do PT, respondeu dizendo que ?não se pode admitir que grupos privados sejam formados para atirar e assassinar sem terra?. E foi complementado pelo também petista Péricles Mello, que se referiu aos sem terra como um movimento que tem como causa a reforma agrária e aos seguranças como ?jagunços contratados para matar, pelos fazendeiros?. A bancada cobrou a apuração das mortes.
O deputado Tadeu Veneri (PT), que foi até a fazenda da Syngenta ontem para acompanhar o enterro do sem terra, disse que vai solicitar hoje à Polícia Federal intervenção no caso. ?Está havendo na região certa apologia à retomada de áreas não pela força pública, mas de forma individual. Há grupos pregando que daqui pra frente vai ser na bala?, disse.
Assim como a oposição, a seccional Cascavel da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) manifestou que os crimes refletem o descaso com que o tema vem sendo tratado pelo governo estadual. A Ordem lamentou, em nota, ?a fraqueza e falta de vontade de o governo fazer cumprir ordens judiciais e imprimir ao assunto viés político e ideológico? e ?as conseqüências da falta de regras da política fundiária estadual?.
A Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) repudiou as acusações justificando que cumpre a lei por meio das reintegrações de posse e negando omissão perante os conflitos que resultam em violência no campo.