Foto: Átila Alberti e Daniel Derevecki

Adair foi surpreendido a tiros ao chegar em casa. José estava trabalhando quando foi morto.

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Moradores do Jardim Santa Maria, em Fazenda Rio Grande, Região Metropolitana de Curitiba, acordaram assustados ontem. Três homens, armados com escopetas e pistolas e usando gorros, percorreram as ruas do bairro e, por volta das 8h, assassinaram dois trabalhadores em locais distintos. Um terceiro indivíduo foi ferido, mas conseguiu escapar dos matadores. Policiais civis e militares do município cercaram a região e solicitaram apoio a Rondas Ostensivas de Natureza Especial (Rone) para tentar prender os marginais, que se refugiaram em um extenso matagal.

Apesar das buscas, que duraram por toda a manhã, nenhum suspeito foi detido.

O catador de papel Adair Correia, 41 anos, foi o primeiro a ser executado. Ele foi surpreendido pelos matadores quando voltava para casa, na Rua Caxias do Sul. "Não sei de nada", teria sido a última frase da vítima, executada com um tiro de escopeta nas costas e outros – de arma de menor calibre – no peito.

Após a execução, os assassinos saíram andando, ainda empunhando suas armas. Subiram uma quadra, até a Rua Uberaba, e mataram a segunda vítima. Quatro homens trabalhavam na construção de uma casa quando viram os assassinos se aproximarem. Três deles saíram correndo, mas o pedreiro José Carlos Samuel, 48, não reagiu e permaneceu na obra.

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Os marginais atiraram em direção aos "fujões" e teriam atingido no braço um indivíduo conhecido por "Edinho". Mesmo ferido, o homem conseguiu fugir. José permaneceu na construção, provavelmente por não ter a que temer, e foi executado brutalmente com um tiro de escopeta na cabeça.

Mais uma vez, demonstrando frieza, os assassinos saíram sem pressa alguma depois da execução. Inclusive, passaram em frente a moradores que circulavam pelas ruas da Vila Santa Maria, com as armas em mãos.

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"Do jeito que estavam armados, portando armas grandes e vestidos com coturnos e gorros, pensamos que eram policiais fazendo ronda por aqui", relatou um grupo de moradores.

Vingança

Várias versões para os crimes foram surgindo, desde acerto de contas devido ao duplo homicídio ocorrido naquela região na semana passada, até uma disputa por terras. Nessa segunda hipótese, os matadores seriam antigos moradores que foram expulsos do local.

Para a polícia, entretanto, as execuções aconteceram por vingança. "Dois dos matadores nós já identificamos e estávamos atrás deles por outros crimes. Eles cometeram as mortes por vingança, acreditando que haviam sido delatados à polícia por essas pessoas", comentou o superintendente da delegacia de Fazenda Rio Grande, Eusébio Pereira da Silva.

Um dos mortos tinha 12 filhos

Daniel Derevecki
Inês em total desespero.

A brutalidade descabida dos matadores contra as vítimas chocou os moradores da Vila Santa Maria. Segundo os familiares dos mortos, Adair e José eram homens trabalhadores e não tinham inimigos. De acordo com Inês Cardoso, esposa de Adair, ele saiu cedo pois queria ir até a Prefeitura da cidade tratar do carregamento de utensílios que ganhara como doação. Antes, porém, passou em um boteco. Quando retornava para casa foi assassinado.

Não foram encontrados documentos em poder de Adair. Ele portava apenas uma garrafa de pinga e uma faca de cozinha presa na cintura. Inês lamentou a morte do marido e se desesperou ao imaginar como educaria sozinha os seus 12 filhos. Atualmente, 11 deles, com idades que variam entre 5 meses e 20 anos, residem com ela. Apenas um garoto, de 17 anos, mora e trabalha em Curitiba.

Adair tinha antecedente criminal por homicídio e já havia cumprido sua pena, segundo a família.

Outro

José Carlos Samuel foi assassinado sem nada dever. A opinião dos parentes é compartilhada inclusive pela polícia. "Pelo que foi apurado, os matadores queriam "Edinho", que estava junto com José na construção", comentou o superintendente Eusébio. De acordo com o filho da vítima, Flávio Henrique, o pai sempre foi um homem trabalhador e que não tinha rixa com ninguém.

Moradores em pânico e revoltados

Daniel Derevecki e Átila Alberti
Manifestantes com medo.

A audácia dos assassinos, responsáveis por duas execuções ocorridas na manhã de ontem, em Fazenda Rio Grande, desencadeou uma manifestação na Vila Santa Maria. À tarde, cerca de 200 pessoas fecharam a BR-116 para reivindicar mais policiamento e agilidade nas investigações.

O protesto começou por volta das 14h30, quando mulheres grávidas, homens e crianças se uniram, fecharam a rodovia e queimaram galhos de árvores. A pista só foi liberada meia horas depois, com a chegada das polícias Militar e Rodoviária Federal. De acordo com o policial rodoviário Negrão, os manifestantes foram retirados da rodovia porque o fogo estava se alastrando para as margens do asfalto e também existia o risco de engavetamento no final da fila de veículos obrigados a parar.

Mesmo retirados da pista, os manifestantes ficaram às margens da rodovia até a chegada da imprensa. A preocupação de todos é de que novos crimes aconteçam, uma vez que os marginais continuam soltos. Buscas foram feitas no local na tentativa de capturá-los, mas até a tarde de ontem a Polícia Militar não tinha pista dos assassinos.

Medo

PMs realizaram buscas.

Sara Cristina de Oliveira, 30, grávida de oito meses e mãe de quatro filhos, garante que está com medo até mesmo de deixar as crianças brincar em frente do portão de casa. "Não posso deixar meus filhos sozinhos, pois estão matando em plena luz do dia. O problema é que a gente chama a polícia e ninguém vem até aqui", disse indignada. Outro morador ,Ronie Peterson Gonçalves Severino, 27, que trabalha como mecânico, completou: "Nós corremos o risco de estarmos em casa, de alguém bater no portão e de quando a gente abrir a porta levar um tiro. Queremos uma solução, mais segurança e polícia, pois está um caos morar aqui", finalizou.

O clima de pânico fez com que as ruas da região ficassem vazias durante todo o dia. Depois das mortes a Unidade de Saúde da Vila Santa Maria fechou as portas e as aulas na escola municipal do bairro também foram suspensas. No portão do estabelecimento de ensino um recado resumia o sentimento de medo e revolta que assola os moradores do município. "Senhores pais, informamos que hoje e amanhã não haverá aula por motivo de luto". (PC)