Vinte e um presos escaparam pela porta da frente da Delegacia de Piraquara, às 6h30 de ontem. Eles aproveitaram o momento em que a cela era aberta para render o único policial de plantão e escapar, levando uma arma e uma viatura. Apenas quatro deles haviam sido recapturados até o início da tarde de ontem.
A confusão se originou com a prisão de quatro indivíduos, durante a madrugada. A Polícia Militar interceptou um Apollo verde, no Jardim Guarituba – carro que estaria sendo usado em assaltos na região – , e encontrou um revólver calibre 38. Três indivíduos suspeitos, juntamente com um menor de idade, foram detidos por porte ilegal de arma.
Levados à delegacia de Piraquara, os quatro foram agredidos ao entrarem no xadrez já superlotado – cerca de 36 presos se espremiam num espaço que comporta apenas oito. O investigador de plantão, identificado apenas como Martins, abriu a cela para separar os “novatos” e colocá-los numa cela improvisada. Neste instante os demais detentos renderam o policial, o agrediram com socos, chutes e golpes de barra de ferro. Cerca de 20 homens que preferiram ficar nas celas ajudaram o investigador, ferido principalmente nas costas, mas sem gravidade.
Grades
Uma das grades do solário havia sido serrada, mas os fugitivos saíram pela porta de entrada. Seis dos presos partiram com uma viatura policial e os outros correram. Uma arma também desapareceu da delegacia. Nas proximidades, dois carros foram tomados em assalto – um Fiat Palio vermelho, localizado horas depois na BR-376, em São José dos Pinhais, e uma Kombi escolar, encontrada mais tarde em Piraquara. A viatura também foi recuperada, depois que os ocupantes se envolveram num pequeno acidente.
Quatro dos fugitivos foram recapturados pela Polícia Militar: Claudecir da Silva, Eder Oliveira Veloso, Mirailton M. das Neves, Marciano Silva Maia. Continuam foragidos os presos Anderson de Jesus, Antônio Carlos da Silva, Celso Luiz Gonçalves, Claudemir S. Batista, Devais Marcos Marchetto, Edemílson Ribeiro, Fernando Westphalen Magalhães, Gemir Carlos dos Santos, Geovane F. Clemente, Josué Pietrowski, José Simão Pietrowski, Júlio Leonardo Correa, Paulo Henrique C. Moraes, Ricardo Rodrigues de Souza, Roberto Selinski, Sidney Dias Moreira, Márcio Duarte da Silva, Jeferson Rodolfo Schell.
Superlotação
O excesso de presos em delegacias e distritos da capital e da Região Metropolitana é um problema que há tempos o governo do Estado promete resolver, porém não consegue (veja quadro). Mesmo com a construção de novas unidades penais, como a Casa de Custódia de Curitiba (CCC), na Cidade Industrial, e um presídio provisório, em Piraquara (ao lado da Penitenciária Central), para justamente desafogar as cadeias, a situação continua crítica. Tentativas de fuga são registradas freqüentemente e algumas, como a ocorrida em Piraquara ontem, dão certo. Moradores próximos das delegacias vivem temerosos de, a qualquer momento, encontrar um criminoso em fuga no quintal de casa. Risco este também corrido por alunos de um colégio estadual, existente ao lado do 7.º Distrito (Vila Hauer). Apenas um muro divide a cadeia da escola, em cujo pátio até tiroteio já aconteceu. Pais e professores exigem a desativação da carceragem da delegacia, que já foi interditada pela Justiça. Há dois anos a cadeia do 7.º DP foi completamente esvaziada e houve promessas de que jamais iria continua a funcionar. Menos de três meses depois, já estava novamente lotada e assim continua até hoje.
Desvio
Fora o perigo oferecido à população, a superlotação também irrita os policiais. Desviados de suas funções, muitos deles deixam de proceder investigações e desvendar crimes para “cuidar” de presos. A carreira de carcereiro já foi extinta da Polícia Civil há mais de 10 anos, justamente para que os reclusos não permanecessem em delegacias mais do que o tempo necessário para a lavratura de um flagrante ou a realização de uma investigação. Depois disso, pela lei, eles deveriam ser transferidos para um presídio provisório, como o existente no bairro do Ahu. Mas a lei não é cumprida e muitos presos chegas a ficar todo o tempo de sua pena recolhidos em uma cela entupida de gente, mal-cheirosa, sem banho, sem sol e com todo o tempo disponível para pensar em fugas, rebeliões e, provavelmente, em novos crimes.
Protesto com greve de fome na Casa de Custódia
Familiares de presos da Casa de Custódia de Curitiba, na Cidade Industrial, passaram o dia de ontem em frente o mini-presídio fazendo protesto e algumas denúncias. Segundo eles, os presos iniciaram uma greve de fome para que sejam atendidas algumas reivindicações. Uma das acusações é que os presos estão sendo agredidos na unidade e depois colocados no castigo, por dez dias. A direção do presídio confirmou o protesto, mas justificou que somente alguns detentos aderiram à greve de fome.
Dirce Pinheiro, mãe de um detento acusado de tráfico de drogas, denunciou que seu filho apanhou dos agentes porque pediu assistência médica. “Ele tem cólica de rim e não estava agüentado de dor. Ao invés de medicá-lo, eles bateram e depois o colocaram de castigo”, disse ela.
Alexandra Martins, mulher de um interno acusado de latrocínio (roubo com morte), disse que o marido ficou dez dias no castigo porque pediu aos agentes que levassem um colega de cela ao médico. “Ele apanhou e depois ficou dez dias no castigo até sumirem as lesões”. Cristiane Lima também denuncia: “Isto é o que acontece aqui. Hoje mesmo ouvi gritos e eles ligaram o som alto para a gente não escutar”, acusou.
Reivindicações
Mulheres e mães de detentos, que se concentraram na tarde de ontem em frente a Casa de Custódia, informaram que os presos requisitam que a visita semanal seja por um período maior (hoje é de duas horas semanais) e que as crianças visitem os pais mais do que uma vez por mês. Eles também pedem a chance de trabalhar na cadeia; que os condenados sejam removidos para o sistema penal e os que têm pena para cumprir no regime semi-aberto sejam transferidos para a Colônia Penal Agrícola, em Piraquara. Os detentos pedem também visita íntima e assistência médica adequada.
A diretora da Casa de Custódia, Cíntia Bernadete, informou que realmente alguns presos aderiram à greve de fome. Através da assessoria de imprensa da Secretaria de Justiça, foi informado que ontem os detentos tomaram café da manhã, sendo que alguns se recusaram a almoçar. Cíntia garantiu que a dinâmica da unidade foi normal e que o tempo de visita segue a política criminal do Estado. Quanto às visitas íntimas, não são possíveis porque os presos que estão recolhidos na unidade são provisórios. Já o tempo da visita não pode ser esticado devido a segurança do local. Quanto a transferência dos condenados, Cíntia salientou que isto é competência do juiz da Vara de Execuções Penais (VEP). A diretora alegou que não há agressões contra os presos na unidade.
