Não sei se estamos ficando conformados ou perdemos a vergonha na cara. Fato é que a violência já não nos impressiona mais. São dezenas de mortes por dia, centenas de acidentes, atropelamentos, arrombamentos, violações e escândalos que ninguém mais se surpreende com tanto crescimento.
As estatísticas batem todos os recordes. Não vemos mais notícias na imprensa de que a polícia venceu o ladrão, que o crime foi punido ou que algum setor tenha sido recuperado em favor do bem.
Os mocinhos estão perdendo, e feio, para os bandidos. E a moda, em todos os cantos, está sendo virar bandido.
Outro dia, ouvi um comentário de uma estudante, falando sobre piercing, tatuagens e comportamento dos jovens e ela se referia de que não dá mais para seguir os padrões da sociedade comportada, que “só gosta de rostinhos de bunda de bebê”. Um outro passou com uma camisa de clube e alguém protestou por brincadeira e ele respondeu na lata: “Está te incomodando? Então estou feliz, isso me faz bem!”
Ninguém mais se preocupa em traçar um plano de bem para o futuro. O importante é “viver o presente”, curtir o imediatismo, passando por cima das pessoas com a pressa e com o peso de um rolo compressor, não importando as conseqüências, os sacrifícios ou prejuízos que terceiros possam ter com esses comportamentos.
A sociedade caminha para um perigoso despenhadeiro de forma incontrolável e avassaladora.
Coisas simples mostram o quanto estamos desligados dos problemas. Recentemente a Assembléia Legislativa do Paraná criou uma lei proibindo a venda de bebidas alcoólicas em postos de combustíveis. O motivo é claro: volante não combina com embriaguez. Agora, há cerca de uma semana, o ex-vereador do PT e agora deputado Natálio Stica apresentou uma lei que reabre a venda, mas que impede o consumo da bebida dentro do posto de combustível. Quer dizer: basta atravessar a rua para ter o direito de encher a cara e sair dirigindo descontrolado pelas nossas ruas. O motivo é que o movimento dos postos caiu sobremaneira e isso vinha acarretando prejuízos. E o que mais me surpreendeu é que o deputado disse numa emissora de rádio que ele mora ao lado de um posto de gasolina e que não agüentava mais a algazarra promovida pelos motoristas da madrugada.
Essa lei parece aquela que já vigora na Holanda, onde é possível se comprar um baseado no bar, onde é proibido fumar. Quer dizer: vendo o baseado se você for fumar lá fora.
Estamos perdendo a noção da importância das coisas, dos valores familiares, de gestos de amor. Já esquecemos o que é carinho, compreensão. Afago se tornou uma expressão fora de moda e o gesto então não passa nem perto de uma atitude humana.
Nossa geração está envelhecida, mas o perigo está em entregarmos nossos filhos à sorte de uma vida incerta. A disputa, o poder a qualquer custo, a riqueza sem ética, a lei de levar vantagem em tudo está prevalecendo. Já não podemos ter a certeza de que vamos acordar amanhã diante dos mesmos princípios que deixamos quando deitamos ontem. O mundo está girando rápido demais e estamos sendo atropelados por uma avalanche de acontecimentos que não nos permitem mais parar para pensar.
Estamos quase chegando na realidade da música de Raul Seixas: “Pare o mundo que eu quero descer”.
Não dá mais: os homens já estão matando em nome de Deus e da paz!
Osni Gomes é jornalista (osni@pron.com.br), editor em O Estado e escreve aos domingos neste espaço.