Reajuste salarial superior a 85%. Aumento no efetivo. Equipamentos, como computadores, armas, instrumentos de comunicação, novos. Estas são algumas das reivindicações que a Polícia Federal unida coloca na mesa de negociação do governo, nem aí até agora para o tumulto causado em todo o País, principalmente nos aeroportos e fronteiras.
Repete-se mais ou menos o que aconteceu com os servidores da Previdência, seguido dos peritos da mesma Previdência que, arrastando uma greve por longo período, até hoje deixaram filas, atrapalhos e muita gente prejudicada. Também os fiscais da Receita já desafiaram o governo, que diz simplesmente não ter dinheiro para tantos pedidos. Agora vem uma notícia que fará abril (e o povo brasileiro em geral) tremer: ex-aliados do PT nas esperanças setorizadas, servidores federais preparam uma paralisação geral. Prometem o caos se o governo não atender.
Os funcionários públicos têm direitos, ninguém nega. Como qualquer outro trabalhador, devem esses trabalhadores essenciais para o funcionamento dos serviços públicos dizer onde aperta o sapato ou onde dói o calo. Só precisam prestar atenção no calo dos outros, se não é maior que o deles. Afinal, eles existem em função dos demais brasileiros que lhes pagam salários e, em alguns casos, mordomias. Também precisam ter atenção, ou algum limite, no que pedem. Alguns pedidos – o que é isso, companheiro? – funcionam como afronta à pobreza nacional.
É importante observar que até aqui a chamada raia miúda está quieta. Não são os que ganham pouco que se manifestam. Fizeram greves categorias que podem usar o estrago causado contra terceiros para emparedar o governo. Como o governo não dá bola, emparedam a sociedade. As atuais filas nos aeroportos, por exemplo, constituem um exemplo típico de desrespeito da Polícia Federal a outros que nada têm a ver com seus problemas. O pressionado deveria ser o governo, pagador, não o contribuinte, usuário. Da mesma forma, os usuários da Previdência buscavam nos serviços e órgãos do governo a solução de problemas, muitos deles de vida ou morte, e encontravam a porta fechada. Os funcionários em greve, na condição de agentes do governo, negaram-lhes socorro. Fiscais da Receita e agentes da Polícia Federal, por outro lado, quando entram em greve realizam o que chamam de “operação tartaruga”, ampliando (e às vezes exorbitando) suas funções. Em nome de direitos seus, pisam sobre direitos de terceiros, ou seja, da sociedade toda.
A repetição de tais fatos remete a discussão para outro, sempre recorrente nessas circunstâncias: a necessidade de regulamentação das greves em serviços públicos e atividades essenciais. Não é possível que uma cidade inteira fique refém indefinidamente, por exemplo, de uma categoria de motoristas, cobradores ou de quem quer que seja. Ao assegurar o direito de trabalhadores de realizarem sua greve ou protesto, a Constituição precisa cuidar da parte que assegura o direito geral de todos. A vida em sociedade não pode ser uma floresta.
Algumas reivindicações já colocadas indicam total falta de sensibilidade para a realidade brasileira. Como se o céu fosse o único limite, a Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e Ministério Público da União ensaiam reajuste geral de 2,67%, mais uma reposição de 127% que, segundo diz, pertence ao período de governo de Fernando Henrique Cardoso. Querem, assim, mais que dobrar os salários de uma única vez. Para isso, prometem paralisar a Justiça por tempo indeterminado, como “imposição da conjuntura”. Outras categorias se organizam para pedir coisa semelhante. Desconhecem que do couro sai a correia, isto é, para que tenham tal reajuste, a sociedade será convocada a pagar mais tributos. E a nossa estonteante carga tributária já é apontada como uma das principais causas da fila do desemprego. Resta saber como o governo do PT vai lidar com isso.