A taxa básica de juros (Selic), na casa dos 26,5% ao ano, dobra a cada três anos, enquanto todo bom negócio só consegue ser pago cinco anos ou mais após ser montado. A observação é de amigos e defensores da produção, da criação de empregos e do desenvolvimento, como o vice-presidente José Alencar, que segue sua estrada defendendo o que pensa em nome do bem geral do Brasil. E o que pensa e diz continua na contramão do que fazem os integrantes da equipe econômica do governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Enquanto o debate em torno dos juros evoluía em Brasília, Lula era vaiado em São Paulo, ao discursar sobre reformas e promessas de governo aos participantes do 8.º Congresso Nacional da Central Única dos Trabalhadores – CUT. A antigos companheiros, o ex-sindicalista aconselhou mais calma, paciência e prudência. Muitas pessoas morrem afogadas – sofismou – não porque não sabem nadar, mas porque não conseguem se controlar na hora do desespero. “Foi uma vaia residual”, observou outro vice (o da CUT), Wagner Gomes.
Não. Na verdade, foi a primeira vaia que o presidente Lula recebeu. E aconteceu logo em casa, isto é, no congresso da central sindical que ele criou (e moldou a seu gosto) no início dos anos 80. Prudente, Lula não falou de juros, mas de reformas. Reformas que – segundo disse – não lhe acrescentam amigos nem inimigos, mas que precisam ser feitas.
A despeito das recomendações sobre a forma “carinhosa” como o presidente deveria ser recebido no recinto, parte das conhecidas hostes petistas entoou cantos de guerra e de inútil agressão. “Um, dois, três, quatro, cinco mil, ou pára essa reforma ou paramos o Brasil”. Era previsível. No dia anterior não foram poupados nem os ministros da Previdência e do Trabalho, Ricardo Berzoini e Jaques Wagner, nem o presidente do PT, José Genoíno, assim como também a prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, fora recebida com desconsiderações. “Não me preocupo com vaias, porque eu acho a vaia tão importante quanto o aplauso”, filosofou um Lula visivelmente preocupado com a situação em que se encontrava.
Residual ou não (e, afinal, o que seria uma vaia residual?), vaias são o primeiro indicativo de que nem tudo vai bem. Têm a ver com os apitaços, panelaços e buzinaços promovidos a mancheias pelo partido e pela central sindical que Lula criou ou ajudou a criar inspirado na imagem do relembrado feixinho de gravetos que, alhures, deu nascença à logomarca do fascismo. “Vocês, a América do Sul, a América Latina vão se unir para se tornar um feixe difícil de ser quebrado”, recomendou o torneiro mecânico que perdeu três eleições sem desanimar.
Lula tem o discurso simples e fácil. Pediu para que todos olhem em seus olhos para terem a certeza de que não haverá de trair promessas, quebrar compromissos, fugir de responsabilidades. Transformou vaias em aplausos. “Não tenho vergonha do que fui, não tenho vergonha do que sou e não terei vergonha do que serei”, jurou em garantia. Melhor que protestar contra o FMI, é atirar a velha faixa fora e, em seu lugar, “dizer o que (tão preciosos companheiros) querem para a gente poder se entender”.
Assim, aliás, como faz o vice José Alencar, para não falar em Babá e outros “radicais” enquadrados que continuam o mesmo e surrado discurso contra a especulação extorsiva dos mercados de capitais, eleita como prioridade em detrimento do trabalho duro e suarento de brasileiros e brasileiras. Na velha Europa do euro, os juros anuais caíram mais meio ponto. Estão pouco acima dos 2%. Como se vê, lá, sem vaias residuais, o trabalho vale muito mais que a usura.
