1. Unicidade sindical: O atual inciso II do artigo 8.º define o sistema sindical vigente, de unicidade, em suas linhas mestras, desde a década de 30, ao prescrever: ?Art. 8.º… II – é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior a área de um Município?. O atual sistema sindical tem as seguintes bases: a) uma só entidade representativa de categoria profissional ou econômica na mesma base territorial, o que se entende por unicidade sindical um só sindicato, uma só Federação, uma só Confederação; b) base territorial limitada a, pelo menos, um município, impossibilitando, assim, o sindicato de empresa, mas não vedando sindicatos intermunicipais, estaduais, interestaduais e nacionais; c) direito do trabalhador ou empregador definir a base territorial, possibilitando, portanto, o desmembramento da entidade sindical que detenha a base em mais de um município.
2. Liberdade e autonomia sindical: Ao mesmo tempo, a Constituição Federal de 05 de outubro de 1988 fixou com clareza o princípio da liberdade e autonomia sindical também no art. 8.º, em seu inciso I: ? a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical?. Portanto, é livre a fundação da entidade sindical, mas a aquisição de sua personalidade jurídica fica na dependência de registro no órgão competente, vedando ao Ministério do Trabalho e Emprego ou de outro organismo do Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical.
3. A prática sindical: Tanto o princípio da unicidade sindical, como e da liberdade e autonomia sindical, foram confirmados por históricas decisões do Supremo Tribunal Federal, assim como a necessidade do registro no Ministério do Trabalho e Emprego. Portanto, liberdade e unicidade sindical coexistem no sistema, assim como a garantia das mesmas pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Mas esta aparente contrariedade tem sido motivo de amplo debate judicial, na medida em que na prática sindical ocorre (a) a livre fundação da entidade (b) o pedido de reconhecimento pelo registro no Ministério do Trabalho e Emprego (c) a possibilidade da impugnação por entidade sindical que for atingida em sua representatividade sindical ou na sua base territorial (d) as decisões judiciais que decidem, em definitivo, as disputas em torno das controvérsias surgidas. Assim, em primeiro plano, é em torno do registro no Ministério do Trabalho e Emprego que as disputas entre as várias correntes do movimento sindical se degladiam. Pois, a partir da decisão, favorável ou contrária daquele organismo público, que o Poder Judiciário decidirá sobre a infringência ou não dos princípios constitucionais que norteiam a organização sindical brasileira.
4. Histórica decisão do STF: Vide histórica decisão do Supremo Tribunal Federal, de 1995, ao decidir sobre ação direta de inconstitucionalidade:
?REGISTRO SINDICAL E LIBERDADE SINDICAL: – A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no interpretar a norma inscrita no art. 8.º, I, da Carta Política e tendo presentes as várias posições assumidas pelo magistério doutrinário (uma, que sustenta a suficiência do registro da entidade sindical no Registro Civil das Pessoas Jurídicas; outra, que se satisfaz com o registro personificador no Ministério do Trabalho e a última, que exige duplo registro: no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, para efeito de aquisição da personalidade meramente civil, e no Ministério do Trabalho, para obtenção da personalidade sindical) -, firmou a exigência de registro sindical no Ministério do Trabalho, órgão este que, sem prejuízo de regime diverso passível de instituição pelo legislador comum, ainda continua a ser o órgão estatal incumbido de atribuição normativa para proceder à efetivação do ato registral. Precedente: RTJ 147/868, Rel. Min. Sepúlveda Pertence. O registro sindical qualifica-se como ato administrativo essencialmente vinculado, devendo ser praticado pelo Ministro do Trabalho, mediante resolução fundamentada, sempre que, respeitado o postulado da unicidade sindical e observada a exigência de regularidade, autenticidade e representação, a entidade sindical interessada preencher, integralmente, os requisitos fixados pelo ordenamento positivo e por este considerados como necessários à formação dos organismos sindicais? (ADI 1121-9,Tribunal Pleno, STF, DJ 6.10.95, ementário 1803-01, relator Ministro Celso de Mello).
Destaca o acórdão que o Ministro do Trabalho se obriga, ao decidir sobre o registro sindical, adotar ?…resolução fundamentada, sempre que, respeitado o postulado da unicidade sindical e observada a exigência de regularidade, autenticidade e representação, a entidade sindical interessada preencher, integralmente, os requisitos fixados pelo ordenamento positivo…?. Exatamente a observância de tal postulado é que balisará, se houver, a decisão judicial que confirmará ou negará o despacho ministerial.
5. A salvaguarda da unicidade sindical: Por isso, que já anteriormente, em 1993, o Supremo Tribunal Federal definia o caráter do despacho ministerial sobre registro sindical em acórdão em mandado de injunção: ?1. O que é inerente à nova concepção constitucional positiva de liberdade sindical é, não a inexistência de registro público o qual é reclamado, no sistema brasileiro, para o aperfeiçoamento da constituição de toda e qualquer pessoa jurídica de direito privado -, mas, a teor do art. 8.º, I, do texto fundamental, ?que a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato?; o decisivo, para que se resguardem as liberdades constitucionais de associação civil ou de associação sindical, é, pois, que se trate efetivamente de simples registro ato vinculado subordinado apenas à verificação de pressupostos legais -, e não de autorização ou de reconhecimento discricionários. 2. A diferença entre o novo sistema, de simples registro, em relação ao antigo, de outorga discricionária do reconhecimento sindical não resulta de caber o registro dos sindicatos ao Ministério do Trabalho ou a outro ofício de registro público. 3. Ao registro das entidades sindicais inere a função de garantia da imposição de unicidade esta, sim, a mais importante das limitações constitucionais ao princípio da liberdade sindical?. (Mandado de Injunção 144, Tribunal Pleno, DJ 28.05.93, ementário 1705-1, relator Ministro Sepúlveda Pertence).
6. Súmula 677: É fundamental salientar que o STF indica, com clareza, a essência do ato ministerial que é de simples registro,. mas basicamente para garantir o princípio constitucional da unicidade sindical, ou seja, a função de salvaguarda. Esta diretriz se consubstanciou na Súmula 677 do STF: ?Até que lei venha a dispor a respeito, cabe ao Ministério do Trabalho proceder ao registro das entidades sindicais e zelar pela observância do princípio da unicidade?.
7. Portarias do MTE: Neste sentido, a Portaria n.º 376, de 23.5.2000, do MTE, reformulou a Portaria n.º 343, de 4.5.2000, no que concerne aos efeitos do despacho ministerial relativo à decisão sobre a impugnação ao pedido de registro sindical, in verbis: ? Art. 6.º … Parágrafo único: O exame de admissibilidade da impugnação restringir-se-á à tempestividade do pedido, à representatividade do impugnante, nos termos do caput do art. 5.º, à comprovação de seu registro no Ministério do Trabalho e Emprego e de recolhimento do valor relativo ao curso da publicação, não cabendo a este Ministério analisar ou intervir sobre a conveniência ou oportunidade do desmembramento, desfiliação, dissociação ou situação assemelhada?.
A própria portaria ministerial limita o despacho da autoridade pública que não poderá ?analisar ou intervir? sobre a conveniência de desmembrar, desfiliar, dissociar ou atender a qualquer outro pedido assemelhado relativo ao registro sindical requerido.
Justamente sobre este ponto é que surgem as atuais questões relativas às decisões ministeriais sobre registro sindical, em contraponto com a obrigação de zelar pelo princípio constitucional da unicidade sindical.
Edésio Passos é advogado, ex-deputado federal (PT/PR) e membro da Comissão Nacional de Direito e Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego. E-mail: edesiopassos@terra.com.br.