Em todo o mundo, a cada minuto, uma criança menor de 15 anos morre em decorrência da aids, de acordo com a Unicef, órgão das Nações Unidas para a infância. Mais de dois milhões de crianças são portadoras do vírus HIV. Apenas no Brasil, entre 1980 e 2004, foram registrados 21 mil casos de aids na população infantil.

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Se o quadro da doença já parece preocupante o suficiente, um outro fenômeno torna a aids um problema ainda maior: nos últimos 15 anos, 15 milhões de crianças e adolescentes ficaram órfãos por causa da morte de seus pais em decorrência do mal, dos quais menos de 10% receberam ajuda pública, segundo a Unicef.

No Brasil, onde não há estatísticas referentes aos órfãos em decorrência da aids, essas crianças e jovens encontram muitas dificuldades. De acordo com a oficial de projetos de HIV/Aids da Unicef no Brasil, Daniela Ligiéro, além de perderem seus pais, elas sofrem discriminação, sendo portadoras ou não do vírus HIV. "A discriminação acontece porque as pessoas ficam sabendo que seu pai e sua mãe, ou um dos dois, morreram em decorrência da aids", afirma.

Para Daniela, as dificuldades das crianças órfãs que também têm o HIV são ainda maiores, já que elas necessitam de uma série de cuidados para sua saúde. Para atender essas crianças, existem inúmeros estabelecimentos em todo o país. O problema é que a maioria deles trabalha com a perspectiva de isolamento da criança e não de reintegração desse órfão a sua família e à comunidade, segundo a representante da Unicef.

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Segundo Daniela, o melhor a fazer é manter a criança junto a sua comunidade de origem. "Por causa do Estatuto da Criança e do Adolescente, os jovens têm uma série de direitos. A gente quer assegurar que as crianças portadoras do vírus, assim como as órfãs por causa do vírus, tenham esses mesmos direitos, de convivência familiar, do acesso ao ensino e do acesso à saúde. Mas isso só pode ser feito dando apoio aos familiares que vão cuidar das crianças. Não só apoio financeiro, como psicossocial e médico", diz.

O apoio, afirma a oficial da Unicef, pode ser feito diretamente pelo governo ou por entidades não governamentais. Em 2005, 32 casas de apoio receberam verbas do Ministério da Saúde para promover a integração de crianças à sua família remanescente. Uma dessas instituições é o Grupo Viva Rachid, de Recife, que atende a 150 famílias.

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Alaíde Elias da Silva é a responsável pela ONG, criada há 12 anos. "A gente sabe que a maioria das famílias tem uma dificuldade econômica tão grande que não permite a elas ficar com essas crianças órfãs, porque isso vai onerar muito o orçamento delas, que, na maioria das vezes, é de um salário mínimo ou uma aposentadoria de um idoso. A minha preocupação era que todas essas dificuldades fossem motivos para que essas crianças caíssem em um abrigo, interferindo na construção da identidade dela e da referência familiar", explica.

Com o apoio de psicólogos, assistentes sociais e terapeutas ocupacionais, o grupo faz uma ponte entre o órfão e um familiar que possa cuidar dele. Em seguida, a entidade ajuda a família com apoio psicológico, saúde preventiva e até moradia provisória.

Alaíde conta que cerca de cinco anos atrás, foi apresentada a duas crianças portadoras de HIV, de um e dois anos, que viviam apenas com a mãe doente de aids. Enquanto acompanhava a luta da mãe contra a doença, o grupo soube que a família queria dividir os dois irmãos. Um ficaria com a avó e outro ficaria com uma tia.

A entidade teve então que fazer todo um trabalho para conscientizar os familiares de que era importante manter os dois irmãos juntos. Hoje, cinco anos depois, a família permanece unida, sob os cuidados da avó e do pai, que era separado da mãe e que voltou a conviver com as crianças.