O horizonte do Poder Judiciário no Brasil é consolidar-se como poder independente e autogovernável em todas as instâncias. Discute-se, e em boa hora, o sistema de composição do Supremo Tribunal Federal, em busca de mecanismos que subtraiam a vulnerabilidade do método atual. Se por um lado podemos nos orgulhar de termos uma corte suprema e um controle de constitucionalidade muito além dos estreitos limites do que a ela se confere em países europeus (sendo exemplo clássico a França), por outro, os ingredientes de sustentabilidade e legitimidade do Poder Judiciário estão sob debate nacional, haja vista o projeto de reforma do judiciário e sua intrincada ligação com influências externas e interesses internos capitaneados por agentes conservadores avessos às necessidades de democratização e da liberdade do ato de julgar. Porém, o maior problema, talvez, seja nosso, interno, e diz respeito à formação jus-política, à motivação para exercer o mister jurisdicional com olhos atentos à realidade social e, principalmente, à dificuldade de inserção nos grandes debates do mundo contemporâneo.
O atual contexto bio-tecnológico e a crescente globalização política e cultural (a econômica é fato já consumado), em alguns recantos do judiciário brasileiro são fenômenos desconhecidos. O paradigma do distanciamento da política, como meio de preservar a imparcialidade e trazer respeitabilidade, alça a decisão judicial ao etéreo e leva o magistrado ao estrangulamento de suas potencialidades como homem comum, cidadão e agente de um dos poderes do Estado, constituindo-se, na verdade, em causa de burocratização da justiça e de descrédito popular. O juiz tem de despir-se da vestimenta cartorial da qual é impregnado, tem de ter a grandeza de velar pelo princípio constitucional da impessoalidade na prática dos atos administrativos , e a racionalidade de adaptar-se às mudanças éticas reclamadas pela sociedade.
Em recente conclave promovido pelos órgãos de classe da magistratura estadual, federal e do trabalho, em que os candidatos ao governo do Estado estiveram presentes na Escola da Magistratura do Paraná para debate, os candidatos se posicionaram favoráveis à oficialização dos cartórios, à unificação dos tribunais de justiça e alçada e às eleições diretas por todos os magistrados à cúpula dos Tribunais; postularam diálogo aberto com a magistratura e externaram preocupação com a morosidade da justiça. Foi momento ímpar na história da magistratura estadual, iniciativa pioneira e indicativa de novos tempos. A todos os magistrados cabe a responsabilidade de participação na formulação e decisão dos rumos do Poder Judiciário, o que não se esgota na função jurisdicional, ao contrário, demanda reflexão e ação positivas no campo extra-processual, tanto para concretizar anseios de uma melhor convivência interna, como, especialmente, para fazer crescer nos cidadãos sentimentos de confiança, exemplo e orgulho para com o Poder Judiciário.
Joscelito Giovani Cé
é juiz de Direito, auxiliar da vice-presidência do Tribunal de Justiça.