Um navio sem timoneiro de tino

O brasileiro reclama da sorte. A sorte, como diria Brecht, não nos abandona. Uma colônia de Portugal, que deixou de ser potência, sobrevive incólume aos séculos, com grande território, unidade e língua nacionais, tolerância que, se não é das melhores, está léguas da xenofobia e ódio racial no resto do mundo. O Brasil tem sol, terra, água. Não tem terremotos, furacões, vulcões, guerras. E, por que não é potência, se tudo conspira a favor? Por que ainda os milhares de miseráveis?

O Brasil não teve, ainda, uma grande liderança. A única na era moderna foi Getúlio Vargas, com seus defeitos e qualidades. Uma liderança, no caso, pode ser um homem ou um grupo de homens e mulheres. E o País não teve uma elite competente e eficiente à altura de sua vocação histórica. Vícios coloniais nos assolam como pecados perdoados nas confissões dominicais. As relações típicas da colônia sobrevivem no Brasil moderno, como a insensibilidade com a miséria alheia e a crônica falta de espírito coletivo. Um código não escrito de privilégios sobrevive sem muitas alterações até os dias de hoje, punindo competência e premiando uma fórmula jocosamente cunhada por jeitinho brasileiro.

Enquanto não se aperfeiçoarem as relações sociais para que tenham equilíbrio, não haverá potência por aqui. Porque o País teve suas chances nos últimos 60 anos e terá outras. O Brasil saiu da Segunda Guerra Mundial com reservas, consumidas sem produzir riquezas para a sociedade. Um presidente, Juscelino Kubistchek, bagunçou as finanças públicas ao construir uma nova capital federal, sem que produzisse riquezas. O período militar foi uma lambança sem tamanho. Na era Geisel a aventura estatizante de ruborizar soviéticos fez a economia ser um reflexo dos humores da União, sem que a maioria das empresas levasse para a sociedade qualidade, pesquisa tecnológica, produtividade, eficiência e uma dinâmica que as justificassem. No fundo, dependiam do Tesouro Nacional.

Sarney foi inepto ao não reformular o Plano Cruzado. Collor, um doidivanas, surrupiou a poupança do País. Uma ministra da Fazenda dançou tango com o ministro da Justiça, e foi abandonada em Paris enquanto ele retornava ao Brasil para ir ao dentista. Nem bêbado engendraria um roteiro tão infame. Itamar Franco decretou o retorno do Fusca, como se fosse problema de Estado e foi flagrado ao lado de faceira vedete sem calcinha em pleno Carnaval. Com uma gente deste tipo ao redor, é sorte nossa ainda estarmos vivos!

FHC também delirou, quis ser um novo JK, como não bastasse o anterior. Carlyle disse que os povos avançam conduzidos por um grande líder. Soou direitista. Mas, façamos justiça ao povo do Brasil, é um grande povo, em um grande país, conduzido por uma elite de arraial que produz líderes de arraial. O Brasil é grande como um grande navio e precisa de um grande timoneiro, que seja lúcido e corajoso. Temos tido bagunceiros, que bagunçam nossas vidas, a economia e no concerto internacional não sabem se posicionar como grandes líderes, que negociem em benefício do País.

Aqueles que nos sucederem que digam coisas diferentes de nós, porque é isso que temos vivido. Mas, por sorte, a nossa história ainda está sendo escrita.

Edilson Pereira

(edilsonpereira@pron.com.br) é jornalista e editor em O Estado.

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