A reeleição de George W. Bush acalmou os mercados ao redor do mundo, mas nada pode fazer para a solução de um problema brasileiro: nossa perspectiva de uma magra festa de Natal. Esta, ao que consta, é conseqüência de ato do Conselho de Política Monetária que, em meio a nosso processo eleitoral, encurralado pelo medo da inflação, colocou o pé no breque do consumo pela via do aumento dos juros básicos. Resultado: o comércio, que esperava realizar bons negócios, já colhe a antecipada tendência de queda nos índices gerais de venda, que se manifestam também numa intrigante e menor consulta aos institutos de proteção do crédito. A alta dos juros inibiu as vendas a crédito, freando o ensaio triunfantemente anunciado do espetáculo do crescimento.
Não é alguma coisa ainda definitiva ou duradoura. Mas os primeiros sinais de alerta já estão dados. Aqui e acolá, num circuito comercial nervoso, surgem informações de liquidações precoces. Mercadoria em estoque – quem é do ramo sabe – é prejuízo certo, principalmente em tempos de vacas magras. E se o consumidor não encontra atrativo no crediário a perder de vista, devido aos juros básicos – ou supérfluos – em alta, é preciso cativá-lo com preço menor. Às vezes quase igual ao preço de custo. Ou, então, fechar o comércio antes que seja tarde.
Quem prestou atenção ainda lembra: no Planalto, o prognóstico era chegar dezembro com uma Selic (juro básico) de 12%. Ou 13% no máximo. Com a última canetada do Copom, já estamos em 16,75%. E há quem fale que até o fim do ano chegaremos em 17,5%. O custo do dinheiro na ponta extrema do consumidor endividado volta a assumir características de usura.
Não faz muito tempo o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, aconselhou o governo a que serve com denodo e dedicação a envidar seus esforços para alargar não apenas as fronteiras do comércio exterior – que vão bem, obrigado -, mas dar uma olhada com simpatia também para o grande mercado interno. Fazia eco ao que dissera várias vezes o vice-presidente da República, hoje ministro da Defesa e notório combatente contra os juros altos, José Alencar, para quem a política econômica do Planalto é equivocada quando premia a especulação e castiga os que querem produzir. O debate, entretanto, não prospera.
O tema econômico é, normalmente, árido. As pessoas falam difícil e dizem coisas que o cidadão comum quase não entende. Mas o bolso continua a ser a parte mais sensível do corpo humano. E juros altos mexem no bolso de qualquer um. Por isso mesmo, às vezes fica um pouco difícil para o governo explicar os motivos da alta dos juros, quando jura trabalhar pelo bem-estar dos cidadãos, que não existe sem a geração de empregos nem a oferta de oportunidades – entre elas a de realizar um Natal contente. Se o Natal é celebrado na retranca tanto para quem vende quanto para quem festeja, com certeza o início de ano, quando tudo pára, será ainda pior.
De olho na reeleição, o presidente Lula já deve ter tomado consciência que no próximo Ano Novo estará entrando em seu terceiro ano de mandato – tempo mais que suficiente para provar a que veio. Até bem pouco, ele repetia que o tempo de governo transcorrido era curto demais para realizar as promessas feitas na campanha bem sucedida que o levou à Presidência. Na próxima, não será suficiente prometer de novo. Terá que justificar os motivos pelos quais não fez ao menos as coisas simples que, conforme dizia, dependiam somente de vontade política. Premiar a especulação em detrimento da produção é ter péssimas vontades.
Um magro Natal é símbolo que passa, está certo. Mas, como a estrela de Belém que se avizinha, o Natal é sempre tido como ponto de referência para muita coisa, incluindo o da esperança. E o governo Lula acaba de iniciar a matança de mais uma das tantas esperanças despertadas pelo seu marketing eleitoral, já colocado em xeque até nas eleições municipais apenas concluídas.