Nem céu, nem terra. O novo salário mínimo poderá ficar aquém das expectativas gerais dos trabalhadores. Aquém mesmo das esperanças distribuídas pelo partido do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. Fala-se em R$ 230,00. Para quem continua com os R$ 211,00 na cabeça, pode representar alguma coisa. Mas, na prática, significa apenas dez reais acima do que seria o resultado do cálculo da inflação até aqui calculada com parcimônia. Em outras palavras, é menos que os R$ 220,00 de ontem. Um reajuste menor que dez reais, a sumir na compra de apenas um botijão de gás com preço majorado.
Neste jogo de números estão todas as fichas do atual e do futuro governo. Ambos dizem que, mais que isso, é jogar no escuro, irresponsavelmente. A platéia, entretanto, não bate palmas e assiste angustiada o desenrolar dos acertos que se desenvolvem em Brasília. Lá, todos olham o problema sob o mesmo prisma ? o do Orçamento Geral da União, uma espécie de cobertor que cada um puxa em sua direção, ao sabor dos interesses nem sempre sintonizados com o interesse de quem dele depende para mitigar o frio.
No meio das discussões que se travam entre partidos e economistas, anuncia-se um encontro, terça-feira próxima, entre o presidente eleito Lula da Silva e o presidente da Central Única dos Trabalhadores ? CUT, João Felício. Isso não significa, entretanto, que Lula vá pedir palpite a Felício, como não pedirá também a Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, da Força Sindical. Informa-se que, com os R$ 230,00, o PT tentará ganhar tempo entre a votação do orçamento e a data do novo reajuste, no início de abril. Na reunião agendada, Lula pediria a Felício para ficar quieto e dar-se por satisfeito em troca de uma surpresa, mais adiante.
E qual seria essa surpresa? Ano que vem, ao anunciar o novo salário mínimo, Lula já terá três meses de governo. Tempo suficiente para inventar uma boa história e verter bondades sobre os esperançados trabalhadores. Anunciaria, então, os R$ 240,00, como um esforço supremo. É por isso que o limite agora definido tem que ser menor que a possibilidade de conceder. Para poder conceder sem correr riscos.
O grande problema na área trabalhista, entretanto, não está na definição do novo salário mínimo. Este é um problema mais previdenciário. O debate principal será centrado nas reformas da legislação trabalhista, há muito preconizadas pelo PT, e principalmente na redução da carga horária, em cima da qual Lula pretende começar a construir o edifício de uma de suas principais propostas: dez milhões de novos empregos.
A idéia da redução pode parecer boa, teria inclusive o apoio do empresariado, caso viesse acompanhada de uma vigorosa reforma tributária (principalmente no aspecto da desoneração dos encargos sociais), mas já pegou pela proa a oposição histórica da Força Sindical. Paulinho diz que baixar a carga horária semanal de 44 para 40 horas é idéia ultrapassada. Muitos já estão fazendo. A grande luta agora seria para reduzir 10% – um pouco diferente, já que aproveita a todos, inclusive os que já trabalham menos. Aqui também ? vê-se, pois ? joga-se com números. Na prática, o brasileiro está trabalhando mais e ganhando menos.