Tem havido, ultimamente, intensa discussão acerca da situação econômica e social brasileira, seguida de manifestações ideológicas, de analistas de plantão, de semeadores do caos e dos que, com racionalidade e equilíbrio, projetam quadro de possibilidades concretas no avanço dessa questão.
Na campanha eleitoral, fruto da natural empolgação de palanque, consagrou-se a prática generalizada de divulgação de dados que, vistos na sua expressão mais direta, traduziam o retrocesso, a falta de perspectiva e o desencaminhamento. Catastroficamente, havia a sinalização de que a última década guardava traço de similitude com a de 80, considerada perdida por significativa parcela de analistas econômicos.
A recente divulgação de dados sobre o estado geral do Brasil, nos últimos dez anos, teve a virtude de demonstrar que, mesmo diante de um cenário de desigualdade, com fortes disfunções na distribuição de renda e nas disparidades regionais, houve avanços significativos em vários setores do desenvolvimento, projetando resultados que permitem visualizar transformações importantes no conjunto da sociedade.
Os números revelam situações paradoxais, mas espancam de vez qualquer quadro recessivo ou de expectativas sombrias. A distribuição de renda apresenta quadro ruim em 66% do conjunto de 5.750 cidades, o que teve reflexo no Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM). Mesmo assim, esse importante componente avançou em 100% das cidades, trazendo na sua esteira progressos significativos na educação, longevidade e qualidade de vida.
No plano municipal, sedimentou-se o papel das cidades menores, geralmente de população inferior a 50 mil habitantes, onde a educação e a expectativa de vida ganharam novos contornos. Apesar de experimentar desenvolvimento mais demorado e pouca evolução da renda, traduzidos em relativo atraso em relação à média de crescimento nacional, eles foram o centro das atenções, especialmente no IDHM. A educação, em particular, ganhou destaque no seu processo de evolução, influindo decididamente nas conquistas. Sem entrar no mérito da qualidade de ensino e da própria taxa de analfabetos, esse segmento cresceu substancialmente, agregou contingente elevado de pessoas e se destacou como fator preponderante de inclusão social. Tanto que as matrículas aumentaram, as técnicas de ensino evoluíram e os planos alimentares, capitaneados pela merenda escolar, alcançaram contingente expressivo de alunos. Os municípios, com destaque para os menores, desenvolveram políticas públicas consistentes, num trabalho sério e consentâneo com as necessidades locais.
Numa comparação inversa, as macrorregiões metropolitanas sofreram consideráveis perdas na qualidade de vida. Assim, grandes cidades como o Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife e Salvador foram fortemente atingidas na renda e no contingente de pobres. Esses centros, de enorme expressão geográfica, acabaram diretamente alcançados por pressões sociais generalizadas, particularmente os decorrentes da migração, e da busca de melhor emprego e equilíbrio familiar, caracterizando enorme desafio ao gestor público.
No âmbito dos estados, Santa Catarina ganhou destaque no conjunto da federação, com um desenho social e macroeconômico exemplar, conquistando expressão nacional. Basta mencionar que, das dez mais destacadas regiões metropolitanas do País, seis estão localizadas nesse estado, aparecendo a Grande Florianópolis como detentora do melhor IDHM da globalidade das 33 regiões existentes no Brasil. Milagre? Não. Apenas visão estratégica na definição de pólos regionais de desenvolvimento, com forte e constante investimento, acoplados a uma política permanente de apoio governamental, numa marcada simbiose privado-pública, longe de mazelas, interesses subalternos e miopia decisória.
O Paraná, nesse contexto, precisa apressar projetos de desenvolvimento para se destacar mais no concerto federativo. O Estado, inegavelmente pujante, ressente-se de políticas públicas estruturadas, de base macroeconômica, e que, à semelhança da vizinha Santa Catarina, adquiram sustentabilidade e caráter permanente, longe do estigma de Churchill, para quem os políticos fazem planos apenas para as próximas eleições. Exemplos recentes de planejamento governamental, em que projetos e recursos acabaram estigmatizados pelo viés político, de base oportunista, dão bem a dimensão da realidade, em se considerando que idéias acabam por soar como construções no vácuo e a materializar visível descompasso com as demandas da coletividade, além de revelar descontinuidade que entrava o desenvolvimento e legitima o atraso.
É inadiável a definição de programas sociais vigorosos, com ênfase na educação e saúde e a sedimentação de pólos de industrialização de forma bem descentralizada, para expandir o mapa do desenvolvimento, cujo nome é a justiça social.
A opção pelo progresso é impostergável e a mobilização para o caminho da modernidade não tem volta. Por isso, é forçoso revalidar a política como instrumento de um processo aberto que privilegie o bem comum, a linguagem da democracia e os interesses da sociedade, pois não é mais possível improvisar, impor vontades deletérias, procrastinar realizações. Longe de resultados, de indicadores econômicos e sociais concretos, de eficiência e de mecanismos consistentes de governança, não se chegará a lugar algum.
Rafael Iatauro é conselheiro do Tribunal de Contas do Paraná.