Nas velhas comédias, eram comuns as cenas hilariantes de soldados, marchando em pelotões, trocando as pernas, seguindo para a direita quando a ordem era para a esquerda e vice-versa. Num filme até que é engraçado. Mas nada hilário quando acontece com um povo que erra o lado preferido ao eleger comandos equivocados.

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Pesquisa da DataFolha revela que 47% do nosso eleitorado, quase a metade, se define como de direita. Outros 23% se dizem de centro e 30% de esquerda. Seria engraçado, não fosse trágico. Esse eleitorado, dizendo-se de direita, concentra seus votos nas candidaturas que se declaram de esquerda. O que consola é o lamentável fato de que as ideologias políticas estão mortas ou agonizando. Não se governa mais com idéias. Nem mesmo com programas. Governa-se com papo-furado, disseminando mentiras e apegando-se ao debate de pessoas, nomes, o que é a mais evidente inclinação para a mediocridade.

Ao inquirirem a opinião pública, não perguntam se o eleitor prefere um candidato competente e que tenha idéias da ordem que o eleitor prefere. Indaga-se se é honesto, como se isto bastasse como diploma para elevar um cidadão à condição de legislador ou executivo. Fosse possível esse milagre de pinçar no ninho de cobras da política os honestos e elegê-los, poderíamos operar o milagre de colocar no poder gente que por fundados pudores não rouba; e, por cegueira ou incompetência, deixa roubar. E, como legislador ou dirigente, nada faz de bom pelo país, pelo povo, por não saber o que e como fazer. A honestidade, neste caso, é uma virtude, desde que não esteja associada à incompetência.

Ser honesto deveria ser regra e não exceção entre os candidatos. Condição ?sine qua non?. O exigível e imprescindível é, ou deveria ser, a competência. E no exercício dessa competência devem ser motores as idéias e programas que, numa divisão cada dia mais simplória e enganosa, seriam vislumbráveis como de direita, de centro e de esquerda. E o eleitorado não trocasse as mãos pelos pés, atento para o fato de que a maioria dos políticos troca os pés pelas mãos.

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Numa definição grosseira, mas que nem por isso deixa de ser verdadeira, de direita são aqueles que acreditam no uso da força sobre a razão; preferem regimes truculentos à força das leis democráticas. Querem que tudo fique como está para ver como é que fica e ainda sonham em aprofundar as diferenças e acentuar as injustiças, pois crêem que há uma elite mandante que nasceu com as partes pudibundas voltadas para a Lua. E o resto é o resto. O povo existe para curvar-se à minoria direitista e ser seu capacho.

Digerida esta definição necessariamente grosseira, pensemos nos de centro. Estes são os que ficam em cima do muro. Não sabem se o governo deve ser do povo ou o povo do governo. Se os políticos devem fazer o que o povo manda ou mandar os outorgantes de seus poderes fazer o que lhes convém como minoria abençoada por pretensos direitos divinos. Já de esquerda são os que põem o povo acima do governo, este a serviço daquele e, para realizar esse milagre, não poucas vezes aceitam como instrumentos indispensáveis a chibata, as prisões e os paredões. As esquerdas que, em nome do bem, aceitam os métodos ditatoriais para impor a justiça social. Nas vitrines, hoje mais visíveis são os sistemas econômicos que hibridamente são adotados.

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A direita tem como seu direito divino a posse das riquezas; e, como fato inexorável, a miséria do povo. O centro acredita que existe a solução intermediária, que tem a vantagem de não exigir uma escolha de lado. Dança-se conforme a música. A regra é uma espécie de ?lei de Gerson?, em que cada um procura levar vantagem em tudo, não importa para onde caminhe a sociedade. A esquerda une todas as virtudes do bem e, para preservá-las e aplicá-las, aceita para o povo todos os castigos, de joelhos sobre o milho atrás da porta aos paredões das liberdades fundamentais. Os sistemas produtivos, as riquezas, são do povo e não dos cidadãos. Para tornar essa meta tão bonita uma realidade, vale tudo, do mensalão à expropriação. E justificam-se a ineficiência e o fracasso no campo econômico, seus males como o desemprego, a miséria e a fome, como caminhos e não como fins. Caminhos sem fim em que o caritativismo estatal passa a ser uma máquina eficiente e permanente de captura de votos. E de mão no jarro.

Tudo isso é exemplificativo. Mostra, à evidência, que estão trocando os pés pelas mãos e que o povo que quer ir para uma direção usa as eleições para beatificar exatamente os que seguem para o lado contrário. E assim caminhamos, a campanha e as eleições parecendo os velhos filmes de Chaplin. O mandante brincando com o Brasil como se fosse um globo de brinquedo inflado e o eleitor trocando as pernas, tropeçando e, mais uma vez, arriscando-se a esborrachar-se no chão.