O Pleno do Tribunal de Alçada do Paraná criou o Núcleo de Conciliação, inovação já inserida no Regimento Interno da corte – RITA – e em fase de regulamentação pelo presidente da corte, juiz Josué Deininger Duarte Medeiros, prevendo-se para breve o seu funcionamento em caráter experimental, o que poderá representar um grande passo para acelerar os julgamentos nos tribunais. Primeiro, foi a especialização de Câmaras. Depois, a edição de 42 enunciados, que visam uniformizar e divulgar o entendimento das diversas câmaras sobre as matérias mais comuns nos recursos. Agora, os juízes do Tribunal de Alçada avançam e criam um órgão de conciliação em segundo grau.
A notícia é auspiciosa. A par de contribuir para o desafogo do volume de recursos, a iniciativa antecipa aquilo que a Reforma Constitucional do Judiciário, ora em tramitação no Congresso Nacional, prega como um dos postulados básicos: a busca da solução consensual dos conflitos. Não é fácil, todavia, implantar-se uma nova mentalidade. Somos muitas vezes resistentes às mudanças. Desde 1995, o legislador autorizou que o juiz seja auxiliado por um conciliador, nas audiências do procedimento sumário (CPC, art. 277, § 1.º). Pode-se porém contar nos dedos aqueles que adotaram essa prática e capacitaram devidamente um conciliador, como é preciso, para exercer essa tarefa. A audiência prevista no art. 331 do CPC, igualmente, anda um pouco desprestigiada, não sendo raro juntar-se a ela a instrução e julgamento, dando-se pouca ênfase à conciliação que, por sinal, ganhou mais força, no art. 125, IV, do mesmo código. Isso tudo se deve à nossa formação. O processo civil brasileiro, nas palavras do desembargador Kazuo Watanabe, adota a cultura da sentença ou a cultura do litígio, de modo que poucas vezes advogados e juízes recorrem a outros meios de solução de conflitos. Ocorre diferentemente em outros países, sobretudo os anglo-saxões, onde a estatística é de que apenas 5% dos processos recebem sentença, uma vez que o restante é solucionado antes por outros mecanismos.
A maioria dos operadores do direito, no Brasil, tem mais afeição à cultura do litígio do que à da negociação em função da nossa formação acadêmica, que nos ensina a peticionar, a contestar, a dar pareceres, a julgar, mas não privilegia o ensino das técnicas de autocomposição, ou seja, de não impor nenhuma decisão para o litígio, mas de trabalhar com as partes para que elas próprias encontrem a solução para o seu conflito. Mas as coisas estão mudando. Vendo o modelo de outros países, a Escola Nacional da Magistratura e o Instituto Brasileiro de Direito Processual estão apresentando projeto de lei, subscrito pela deputada Zulaiê Cobra, propondo a mediação incidental como uma fase obrigatória do processo de conhecimento (salvo em alguns casos, em que esse procedimento não seria cabível). Embora conciliação e mediação sejam vertentes distintas, têm gênese comum.Assim, a medida de iniciativa dos juízes do Tribunal de Alçada do Paraná, criando o Núcleo de Conciliação, está na vanguarda da modernização do sistema e atende ao convite da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) de dar corpo ao Movimento pela Eficácia do Poder Judiciário, priorizando alternativas à realidade processual hoje vigente É claro que isso importa em muito trabalho e adequada estrutura física, além de formação (capacitação) das pessoas que trabalharão na conciliação.
O Regimento Interno permite que o próprio relator do recurso promova a tentativa de conciliação, ou que encaminhe o processo para o núcleo. Experiências respeitáveis relatadas pelo desembargador Kazuo Watanabe e por outros magistrados, em reunião realizada em 17 de setembro último no Ministério da Justiça em Brasília, para tratar de “Soluções Alternativas de Conflitos” fizeram ver que é preferível que a conciliação seja dirigida por um terceiro, magistrado ou não, mas que não vá mais tarde julgar o recurso, porque assim as partes terão maior liberdade para se expressar, sem receio de que suas razões ou propostas possam ser levadas em conta na hora da decisão. Importa, por fim, que os advogados prestigiem essa iniciativa; que não se furtem ao convite para a audiência conciliatória, convite esse que possivelmente será feito sem maiores formalidades, por e-mail ou telefone, sendo depois confirmado por fax, tudo visando a agilização para que a fase de conciliação não emperre nem atrase o julgamento do recurso, em caso de não ser alcançada a composição. A adesão dos advogados é extremamente importante porque se eles não comparecerem à audiência, se não tiverem maior autonomia para a negociação ou se não convencerem os seus clientes das vantagens desse procedimento, todo o esforço do Judiciário será em vão.
Rubens Approbato Machado, presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB – já manifestou de público – na reunião realizada em 17 de setembro no Ministério da Justiça o apoio daquela entidade às iniciativas como da conciliação e mediação. Nem poderia ser diferente, diante do sucesso que ela representa em alguns Estados que a implantaram: em São Paulo, no último mês de agosto, entre os processos selecionados por uma comissão para tentativa de conciliação, houve 45% de acordos, dados fornecidos pelo desembargador José Carlos de Melo Dias, do TJSP.
Quem trabalha com o Direito sabe o quanto isso representa na redução do volume de julgamentos, ou de eventuais recursos para os tribunais superiores, ou ainda para o próprio tribunal (agravos, embargos de declaração, embargos infringentes, etc). Porém, quem mais tem a festejar com isso é a parte, que tem a oportunidade de ver solucionada a questão do seu interesse, de forma rápida e pacífica, quando não a tenha conseguido em primeiro grau. Oxalá possamos vislumbrar tempos melhores, e que essa iniciativa louvável dos juízes do Alçada contribua para a eficácia da administração da Justiça, reduzindo o tempo de espera pela sobrecarga de trabalho dos magistrados e ao mesmo tempo, estimulando a pacificação social.
Noeval de Quadros é juiz do Tribunal de Alçada do Paraná.