A utilização de sacolas plásticas em supermercados, farmácias e no comércio em geral constitui prática arraigada em nossa sociedade, notadamente em razão da praticidade e comodidade que ela representa para os consumidores, tanto na hora de transportar as compras até a sua residência quanto na disposição e armazenamento do lixo doméstico.
Ocorre que, devido ao fato das sacolas plásticas demorarem centenas de anos para se decomporem no ambiente, a sua disposição em aterros ou descarte diretamente no ambiente tem causado o acúmulo de passivo ambiental considerável, razão pela qual a questão tornou-se motivo de preocupação para a sociedade.
Nesse contexto, surgiram as sacolas plásticas denominadas “oxi-biodegradáveis”, que, em síntese, são sacolas plásticas aditivadas com um produto catalisador de sua decomposição no ambiente, que passaria a ocorrer em cerca de 18 meses ao invés de centenas de anos.
Assim, a novidade foi imediatamente anunciada, por alguns, como sendo a grande solução para a gestão ambiental desses resíduos. Com isso, alguns Estados e vários municípios se precipitaram em exigir, por parte dos estabelecimentos comerciais, a substituição das sacolas plásticas convencionais pelas denominadas “oxi-biodegradáveis”, como política de redução de passivo ambiental, sob pena de aplicação de multas e outras sanções.
Apesar do escopo dessa ação do Poder Público ter sido o de promover, preservar e recuperar o meio ambiente, olvidou-se do fato que se trata de nova tecnologia ainda sem consenso científico sobre seus impactos na natureza, razão pela qual a sua adoção ou imposição deveria ter sido precedida de maior cautela e controle.
Há que se compreender, portanto, que o Princípio Ambiental da Precaução, previsto na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92), elaborada na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e ratificada pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo 01, de 03.02.1994, exige, justamente, que a adoção de nova tecnologia seja previamente avaliada e demonstrada técnica e cientificamente a sua segurança para o meio ambiente, como forma de se evitar que ações adotadas no presente, sem as devidas cautelas, causem danos graves ao meio ambiente no futuro.
A sociedade científica e órgãos ambientais, então, passaram a publicar notas e estudos indicando os possíveis malefícios da adoção das sacolas “oxi-biodegradáveis” para o meio ambiente.
Técnicos do Instituto de Tecnologia de Alimentos do Estado de São Paulo, em matéria veiculada na Folha de São Paulo, em 06.05.2007, p. B16, afirmaram que micropartículas resultantes da degradação do plástico oxi-biodegradável podem ser dissolvidas nos rios ou contaminar os lençóis freáticos e, como as sacolas recebem pigmentos e minerais pesados na sua produção, estes resíduos poderiam agredir o meio ambiente, além de gerar metano, um dos principais gases do efeito estufa.
No mesmo sentido, o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Embalagens do Instituto de Tecnologia de Alimentos – CETEA/ITAL, órgão vinculado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, elaborou Laudo Técnico, afirmando que “Embora seja legítima a preocupação da sociedade e do poder público em relação à gestão do resíduo sólido no Brasil, é muito preocupante a exploração do ‘marketing verde sem base técnica’ que promove ‘erroneamente’ a utilização de aditivos para degradação de materiais plásticos conhecidos como oxi-biodegradáveis. […] Materiais plásticos degradáveis não constituem solução para o problema de resíduo sólido urbano, pois mesmo degradáveis (bio ou não) requerem coleta e continuam a ocupar lugar em aterros, uma vez que a taxa de biodegradação não é tão rápida nesses ambientes. Além disso, se ocorrer biodegradação em aterros há a produção de gases de efeito estufa, como Dióxido de Carbono (CO2) e o Metano (CH4), este último, um dos maiores problemas na gestão de aterros ao longo de sua vida útil e após o fechamento e revitalização das áreas ocupadas (com riscos de explosão e incêndios). […] Esses residuais incluem aditivos, resíduos de tintas e de pigmentos (alguns contendo metais pesados), cargas, oligômeros (polímeros de baixo peso molecular), compostos orgânicos voláteis – COVs (aldeídos, ácidos carboxílicos…), cujo impacto sobre o meio ambiente (dispersos no solo, lixiviados pela água, absorvidos pelas raízes de plantas, entre outros) ainda está para ser estabelecido.”
Por sua vez, o Ministério do Meio Ambiente (MMA), em recente estudo técnico, se manifestou formalmente sobre os riscos da utilização das sacolas oxi-biodegradáveis e os seus impactos negativos no meio ambiente, através de Nota Técnica nº 001/2009 de 06/01/2009, afirmando que “A biodegradabilidade acarreta geração de metano e, se incentivada a substituição do plástico convencional por este material, sua correta gestão como resíduos deve ser realizada.”
Em síntese, verificou-se que, apesar das sacolas plásticas oxi-biodegradáveis se decomporem mais rapidamente no meio ambiente, isso não significa que seus componentes químicos simplesmente desapareçam e que dessa reação química não resulte nenhum outro resíduo potencialmente causador de poluição ou degradação ambiental, mesmo porque, conforme a máxima da química, elaborada por Antoine Lavoisier, “na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”.
Não obstante as controvérsias sobre o assunto, o Instituto Ambiental do Paraná – IAP, mesmo sem lei específica vigente no Estado determinando o uso das sacolas oxi-biodegradáveis, adotou a medida, autuando e impondo às redes de supermercados a obrigatoriedade de substituir as sacolas plásticas convencionais pelas oxi-biodegradáveis, razão pela qual foi impetrado Mandado de Segurança por uma das empresas autuadas questionando a legalidade da exigência formulada pelo órgão ambiental.
Assim, no dia 13/10/2009, a 4.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná – TJPR proferiu decisão inédita no país julgando, em sede de apelação, o mérito de Mandado de Segurança impetrado contra a exigência formulada pelo Instituto Ambiental do Paraná – IAP e pelo Ministério Público Estadual, visando impor a uma rede de supermercados a imediata substituição das sacolas plásticas convencionais pelas sacolas oxi-biodegradáveis, em todos os empreendimentos situados neste Estado, declarando ser ilegal a exigência, bem como proibindo o IAP de autuar/multar a empresa em razão do uso das sacolas convencionais ou da não adoção das sacolas oxi-biodegradáveis.
Desse modo, o Tribunal firmou importante precedente jurisprudencial sobre a matéria entendendo que a exigência é ilegal, em vista da ausência de respaldo jurídico e da incerteza científica acerca dos benefícios e prejuízos ambientais decorrentes da adoção da medida.
Apesar da utilização das sacolas plásticas convencionais acarretar considerável passivo ambiental, o que demanda a adoção de medidas eficazes e ambientalmente adequadas para a minimização desse impacto, a solução da questão depende principalmente de uma mudança na mentalidade dos consumidores e da sociedade quanto à redução do uso, aproveitamento e destinação dessas sacolas, sendo que outras opções ambientalmente seguras e corretas devem ser estudadas e fomentadas pelo Estado e pelas partes interessadas, tal como a utilização de sacolas retornáveis ou a cobrança no fornecimento das sacolas convencionais.
Leonardo Pereira Lamego é advogado especialista na área ambiental.
www.rolimgvlc.com.