Transporte rodoviário de passageiros: garantias legais vigentes

O transporte rodoviário de passageiros pode ser realizado sob várias denominações, atendidas, para cada uma, particularidades e competências. Dentre estas denominações, temos: transporte urbano; transporte interurbano; transporte semi-urbano; transporte intermunicipal; transporte interestadual e, por fim, o transporte internacional de passageiros.

O primeiro deles, transporte urbano, é aquele realizado no perímetro urbano de uma cidade, utilizando-se veículos, quase sempre, com características urbanas (com portas diferenciadas para embarque e desembarque de passageiros). Para melhor entendimento do alcance do transporte urbano, valemo-nos da definição de “área urbana” utilizada pelo Ministério dos Transportes em seu Anuário Estatístico do Transporte Rodoviário Interestadual e Internacional de Passageiros de 2001 – ano base 2000: “área político-administrativa, delimitada pelo perímetro urbano, dentro da qual se localizam as zonas de atividade; caracteriza-se por uma concentração de edificações, uma malha viária e um sistema de serviços públicos de infra-estrutura”. Claro de se notar que o transporte urbano não transpõe o limite urbano, ou seja, não se lança fora dos limites da cidade. Tem como características o transporte urbano de passageiros a admissão de usuários viajando em pé no veículo, limitada a lotação aos dispositivos legais vigentes, e a venda de passagens, ou cobrança da tarifa, no momento da utilização imediata do serviço (momento do embarque). A Constituição Federal de 1.988 determinou ser de competência do município (Art. 30, V) a organização dos serviços públicos de interesse local, incluídos aí os serviços de transporte coletivo. O transporte urbano representa serviço de manifesto interesse local (apesar deste termo, um tanto vago, utilizado pelo constituinte, ser objeto de críticas da doutrina). Os munícipes têm interesse, imediato, de que o transporte local seja realizado a contento, daí a determinação de que o município sobre ele tenha competência.

O transporte interurbano, como o próprio nome sugere, compreende o transporte realizado, quase sempre em ônibus com características urbanas, de um centro urbano a outro, dentro dos limites de um município. Assim, as ligações realizadas de uma “cidade” (centro urbano) à outra (outro centro urbano) receberá a denominação de transporte interurbano. Neste caso, já não se pode afirmar claro interesse local. A ligação interurbana de transporte de passageiros já não está afeto a um interesse local, compreendendo, não raro, interesse de regiões distintas, ainda que compreendidas dentro de um mesmo município. A existência deste tipo de transporte é condição para o desenvolvimento regional (e não urbano ou mesmo municipal), competente, portanto, deve se apresentar, o ente estadual, para elaboração de suas diretrizes.

Transporte semi-urbano, diferentemente do que muitos erroneamente apregoam, não compreende ligações entre regiões metropolitanas (municípios contíguos): é, ainda adotando a terminologia do Anuário precitado, “aquele que, com extensão igual ou inferior a setenta e cinco quilômetros e característica de transporte rodoviário urbano, transpõe os limites de Estado, Distrito Federal ou de Território”, sendo de competência da União sua regulação, fiscalização e execução.

Idêntica subordinação assumem o transporte interestadual de passageiros (“que transpõe os limites de Estados e do Distrito Federal”) e o transporte internacional de passageiros (“o que transpõe os limites das fronteiras nacionais”), já que afetos ao mesmo Poder Concedente (a União). Diferem-se estes, daquele semi-urbano, por adotarem, regra geral, veículos rodoviários concebidos, em seus aspectos mecânicos e de conforto, à execução de longos trechos.

Por fim, temos o transporte intermunicipal de passageiros, também de competência do Estado, ligando, através de ônibus rodoviários (ou mesmo veículos de características urbanas), municípios situados dentro do seu território.

Dentre as garantias legais vigentes, destacamos duas, não por maior ou menor importância, mas sim pelo aspecto hodierno com que se despontam ao debate: o Art. 230, § 2º, da CF/88, e o Art. 39, caput, da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso). O texto da Carta Magna demonstra a clara opção do constituinte em determinar que o transporte gratuito para os maiores de 65 anos ficasse restrito aos transportes urbanos, ou seja, nos limites urbanos das cidades (moldes aqui já delimitados). A Lei infraconstitucional, não divergindo da ratio constitucional, reafirma a gratuidade no transporte coletivo público urbano, acrescentando, agora, o benefício ao transporte semi-urbano (determinando limitações quanto aos serviços seletivos e especiais prestados paralelamente àqueles ditos “normais”).

A competência municipal para o transporte coletivo não é soberana. Prova disto é a restrição ditada pelo Art. 21, XX, que dita à União função de “instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos”. De igual forma, transportes interurbanos, não têm a conotação do “interesse local” do Art. 30, V, da Constituição Federal. Nos municípios de grandes extensões como os que no Paraná existem, as ligações interurbanas têm aspectos regionais importantes, devendo o Estado sistematizá-las, sob pena de interesses locais serem falsamente disseminados como se uma região fosse tão igual à outra, ou uma urbe fosse igual em costumes e tradições a qualquer outra do Brasil. Perde o Estado no seu desenvolvimento. Perde o usuário por não ser “inserido” no sistema de transporte estadual, gerido e fiscalizado por governo que representa, ao menos em tese, camada maior da população.

Sérgio Roberto Maluf

é acadêmico de Direito da Faculdade de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

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