Uma equipe de peritos da Polícia Federal começa a analisar na segunda-feira, em Brasília, os diálogos da caixa preta do jato Legacy, que se chocou com o Boeing da Gol em 29 de setembro, para saber se inocenta ou se indicia os pilotos americanos Joe Lopore e Jan Paladino por crime culposo ou doloso. As transcrições, traduzidas do inglês para o português, contêm duas horas de conversa dos pilotos do Legacy entre si e com as torres de controle de São José dos Campos e do Brasília, até o momento da colisão, que causou a morte de 154 pessoas, na divisa entre os Estados do Pará e Mato Grosso.
O delegado Renato Sayão, encarregado do inquérito, informou nesta sexta-feira (1.º/12) que, se ficar comprovado que os pilotos adotaram deliberadamente comportamento perigoso, como desligar o transponder, desobedecer ordens da torre de controle ou mudar a altitude de vôo por conta própria, eles não terão como escapar do indiciamento por homicídio doloso. Nesse caso, eles correm o risco de ter prisão temporária ou provisória decretada pela Justiça e não poderão deixar o Brasil durante a instrução do inquérito. "Trata-se de um crime gravíssimo, com pena de 8 a 24 anos de reclusão", afirmou ele.
Pelo que já apurou em quase dois meses de investigação, a PF tende a indiciar os pilotos, mas a definição se houve dolo ou não dependerá da análise dos diálogos. São 100 páginas de conversas cruciais para esclarecer que tipo de conversa os pilotos tiveram com os controladores de São José dos Campos e de Brasília, se receberam instruções erradas ou se houve dificuldade idiomática de compreensão.
Essa análise será cruzada com as perícias realizadas nas duas aeronaves e demais provas produzidas pela investigação técnica, feita pela Aeronáutica. Embora a investigação não esteja sob segredo de justiça, Sayão cedeu aos pedidos da Aeronáutica e determinou o sigilo dos diálogos dos pilotos e demais provas produzidas no inquérito, inclusive os depoimentos dos controladores de vôo.
Sem precipitação
O delegado explicou que não quer fazer juízo precipitado sobre a culpa do acidente e teme que um trecho fora de contexto, divulgado com sensacionalismo, possa levar a conclusões erradas num assunto de extrema gravidade. Sayão saiu de férias e as investigações serão realizadas pelo delegado Ramon da Silva Almeida, a quem caberá decidir sobre o indiciamento ou não dos pilotos.
Ramon viaja neste domingo para Brasília com todo o material do inquérito, para começar o trabalho na segunda-feira em conjunto com a equipe de pilotos e técnicos da Coordenação de Aviação Operacional (Caop) da PF. Um deles, o delegado Renato José Maleiner, piloto e perito em investigação de acidentes aeronáuticos, está dando colaboração técnica ao inquérito desde o início.
Mas se a opção da PF for o indiciamento por crime culposo (sem dolo), os pilotos, que estão com os passaportes retidos, poderão retornar imediatamente aos Estados Unidos, país com o qual o Brasil tem tratado de cooperação jurídica internacional. "Não podemos falar em indiciamento sem saber qual artigo eles infringiram. Só após as análises, teremos essas respostas", enfatizou Sayão.