Tolerância zero

O Congresso Nacional vota normas para o combate à criminalidade. Quando se transformarem em leis, haverá uma disputa de estatísticas entre as polícias brasileiras, cada uma tentando mostrar que em seu território a situação melhorou, enquanto o governo federal buscará convencer que sua participação no combate à criminalidade foi decisivo e deve render-lhe dividendos políticos. Enquanto isso, os bandidos estão nas ruas enquanto as famílias se trancam em suas casas, com medo e ainda inseguras.

Há causas sociais no crescimento do problema. Para resumi-las: esta é uma democracia pela metade, pois não oferece justiça social. A bandidagem, em sua grande maioria, foi marginalizada na distribuição dos benefícios que seria de se esperar de uma democracia, a começar pelo direito de comer, estudar, trabalhar, sustentar suas famílias. Nem por isso pode-se retardar a busca de soluções para o problema da violência. Problema que já não atinge apenas as pessoas comuns, mas chega à família do presidente Lula, com o assassinato de um militar de sua segurança e ferimentos graves em outro. Problema que levou ao furto do automóvel do ministro da Justiça, até agora não recuperado, e que resultou no seqüestro de auxiliares do presidente do PT, José Genoíno, ele próprio só escapando da sanha dos bandidos porque, no momento do crime, havia voltado para o interior de sua residência a fim de pegar um objeto pessoal. Outros crimes aconteceram, tendo como vítimas gente ligada ao atual governo federal e a governos estaduais.

Catherine Coles, norte-americana co-autora do livro Consertando Janelas Quebradas, em visita ao Brasil, deu algumas opiniões baseadas na obra que ajudou a escrever, confessando não ser uma especialista em Brasil. Ela é especialista, sim, em segurança pública. Falou com a autoridade de haver escrito, com colaboradores, uma obra que é considerada a base do programa tolerância zero, aplicado pela polícia de Nova York e que fez daquela gigantesca e violentíssima cidade uma das mais pacatas dos Estados Unidos. Se nem tanto, pelo menos provocou uma queda acentuadíssima na criminalidade que atingia a grande metrópole. Coles aconselha, antes de mais nada, que a polícia suba os morros. Mas suba não só na forma como tem feito, para trocar tiros com bandidos, traficantes e atingindo moradores inocentes, trabalhadores. Que suba também para tornar-se conhecida e amiga da sua população, com a qual deve colaborar. Talvez o título do livro bem sirva para esclarecer o que deseja aconselhar. Consertar janelas quebradas, antes de confrontar-se com a bandidagem, atingindo freqüentemente cidadãos inocentes. E plantando uma imagem de medo. O favelado tem medo da polícia. Aliás, os brasileiros, em geral, não vêem a polícia como sua amiga.

A tolerância zero é a chave principal da solução do problema. Primeiro, didaticamente, e depois, para valer. Não se deve perdoar nenhum delito, seja jogar papel no chão ou andar de carro em alta velocidade. São infrações legais e quando forem punidas a população toda saberá que delitos mais graves também o serão, e com penas muito mais rigorosas.

É preciso que a sociedade brasileira saiba que não existem ilegalidades toleráveis. A tolerância zero seria um sinal de que as coisas estão mudando e os bandidos não terão o benefício da impunidade.

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