Os tiroteios nas favelas, em vias como a Linha Vermelha do Rio ou em comunidades da periferia de São Paulo e de outras capitais brasileiras já são fregueses do noticiário. Na Cidade Maravilhosa os confrontos entre a polícia, a Força Nacional de Segurança e milícias armadas camufladas em defensoras das comunidades e traficantes ocorrem todos os dias. Há sempre a desculpa de que são lutas das forças da lei contra o crime organizado. Em geral são, mas nesses confrontos não só as balas perdidas, mas também o açodamento, os equívocos e a impossibilidade de distinguir quem é marginal de quem é cidadão marginalizado matam inocentes. Matam idosos, trabalhadores, mulheres e crianças.

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Pela freqüência e multiplicação, esses embates já não causam mais indignação. Pelo menos não no nível que seria de se esperar. Nos últimos tempos esses tiroteios chegaram ao asfalto e começaram a atingir não só favelados, mas também policiais, de soldados a oficiais e mesmo delegados de polícia. Viaturas do sistema de segurança e mesmo delegacias de polícia e quartéis passaram a ser alvos.

Essa escalada da violência nos leva a encarar os enfrentamentos como uma verdadeira guerra urbana, os marginais e marginalizados utilizados por eles, contra a sociedade organizada. Mal organizada.

Agora, fatos novos começam a dar aos tiroteios a conotação de atentados. E atentados não mais contra as polícias estaduais, mas contra o governo federal. Um trem em que viajavam os ministros das Cidades, Márcio Fortes, e da Secretaria Especial de Portos, Pedro Brito, portanto representantes do primeiro escalão do Poder Executivo da União, autoridades logo abaixo do presidente da República, foi alvo de disparos de supostos traficantes. Coloquemos a palavra ?supostos? entre aspas, pois mesmo que sejam traficantes, é possível que também sejam grupos armados que cometeram um atentado político, subversivo.

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O trem realizava viagem inaugural de um trecho ferroviário de cargas que foi revitalizado, fazendo percurso até o Porto do Rio de Janeiro. A composição passou a transitar por uma área que fora invadida e onde foi necessário demolir casas de favelados. Passou no meio de comunidades marcadas pela miséria. Os organizadores do festivo passeio decidiram ampliar a viagem, indo até uma outra favela para onde se pretende estender os serviços de transporte ferroviário de carga. O trem foi alvejado por centenas de tiros na ida e na volta. Não houve a coincidência de ter passado no meio de um tiroteio, mas o fato inconteste de que foi alvo de um atentado. Os que atiravam e os que os lideravam sabiam que se tratava de uma viagem oficial e que no interior dos vagões estavam ministros, autoridades estaduais do Rio de Janeiro, policiais, seguranças, a imprensa e convidados. A toda esta gente desejavam amedrontar ou mesmo atingir, o que foi evitado, em parte, pelo gesto de defesa de a maioria atirar-se no chão dos vagões. Inclusive os engravatados ministros. As autoridades policiais do Rio de Janeiro já haviam desaconselhado a viagem por considerá-la perigosa. O governador carioca nem se juntou à comitiva. Preferiu não ir.

Este evento e a escalada de violência que começou com tiroteios nas favelas, onde morreram traficantes, policiais e inocentes (todos pobres), nos faz lembrar o que ocorre há décadas na Colômbia. Lá há uma luta armada com feições de guerra civil. O tráfico de entorpecentes e seu combate é justificativa, como justificativa também é a ação das Farc, grupos armados de esquerda que são alimentados pelo tráfico e carregam bandeiras ideológicas. O atentado ao trem do governo no Rio nos coloca muito próximos da terrível situação da Colômbia. É hora de as nossas autoridades federais acordarem. Estamos vivendo uma verdadeira guerra urbana.

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