A rapidez com que os candidatos derrotados no primeiro turno subiram nos palanques e apareceram na tela dos contendores remanescentes foi impressionante. O eleitor nem esqueceu as rusgas anteriores e foi surpreendido: “Você, de casa, que votou em mim, receba minha gratidão e nesse momento lhe peço: vote no fulano”, implorou um falante candidato derrotado nas urnas, no primeiro dia de TV eleitoral deste segundo turno. Outro fracassado, que antes estocava o adversário de sua mulher candidata com vara curta, a ponto de fazer-lhe a desconcertante pegadinha do Cide no último debate do turno anterior, repete “agora é Lula”. Coisa igual – e em alguns casos mais desconcertante ainda – acontece nos estados onde a decisão final ficou para o dia 27 próximo. Inimigos figadais de antes tornam-se os mais simpáticos admiradores e colaboradores de hoje, como num passe de mágica.
É sempre bom alimentar a esperança da reconciliação. Melhor ainda é ver que as carrancas carregadas de ódio e rancor cedem espaço para palavras de bondade. O perdão e a solidariedade constituem, nos tempos atuais de brutalidade, a suprema virtude do homem. Não se pode dizer o mesmo, entretanto, quando a reconciliação aparente constitui apenas uma demonstração de sôfregos interesses, os mesmos interesses que antes motivavam as críticas mais contundentes.
O eleitor mediano deve estar se perguntando (e tem o direito de fazê-lo!) o que, de fato, aconteceu nos bastidores, que traz à cena, abraçadinhos e sorridentes, candidatos que antes insistiam em assegurar que eram, entre si e seus programas, diferentes como a água e o vinho. Se o que restou na disputa nada mudou, como diz, mudaram os outros – os derrotados -, é a conclusão natural. Garotinho, por exemplo, gabava-se, alfinetando Ciro e Lula, que não estava coligado com gente que sugeria ser de estirpe menor, tipo Antônio Carlos Magalhães, José Sarney e tantos mais, um dia já anatematizados por ambos. Agora, junta-se à mesma ninhada, jurando ser a melhor opção para o País e para a solução dos problemas brasileiros. Quem acredita? Em quem acreditar?
Se pelo menos tais parcerias encerrassem, e às claras, um bem explicado entendimento entre programas, propostas e linhas de ação, a tal ponto de convencer o eleitor sobre sua exeqüibilidade. Se ao menos ficasse claro quem cedeu o que, o que foi negociado, ou se a adesão se dá apenas por um simples ato de súbita simpatia. Mas nada ou quase nada disso é dito e explicado ao eleitor, que, cá com seus botões, sente-se um grande trouxa a ver “homens públicos” tratar da causa geral como um negócio particular.
Eleição sempre foi assim, dirão. E é verdade. Entretanto, isso pertence a um velho estilo de fazer política. Os novos tempos estão a exigir atitudes conseqüentes ou decisões justificadas – nada comparável à troca de máscaras num teatro grego, ou ao corte esmerado do terno novo em cabeça com novo penteado. Os acertos de hoje com gente tão diferente e com interesses também tão diversificados, realizados na sofreguidão de abocanhar o poder nas urnas (ou, para alguns deles, não ficar sem uma beirada nele), serão as dores-de-cabeça de amanhã. De todos nós, que eles haverão de se acertar de novo. São reflexões que os eleitores precisam fazer e, se possível – tiro rápido – decidir pelo melhor, enquanto é tempo.