Então é isso. Semana que vem vai dar Tiririca na cabeça. Ele terá, no mínimo, 900 mil votos no Estado mais desenvolvido do Brasil. Nós merecemos o Tiririca na Câmara Federal. Ele nos trata por abestados, e ninguém reage. Aliás, nem poderia reagir. Não ostentamos legitimidade moral para reagir.
Reação só poderia existir se ainda sobrasse algum sentimento de indignação. Mas a indignação tornou-se algo distante de nossa realidade. Diante das ofensas diárias, ou damos de ombros, ou fazemos piada daquilo que deveria causar vergonha em quem esteja sóbrio.
A corrupção, nossa maior chaga, é vista com um olhar falso de reprovação, nada mais. Bandidos se apoderam do dinheiro gerado do trabalho dos brasileiros, sorriem para as câmeras, e nada fazemos. Apenas perdemos, dia após dia. Esse é o preço da preguiça.
O pior é que o Tiririca não é uma patologia. Ele não é o único a nos ofender. Cada vez que vejo alguém claramente envolvido em um ato de corrupção dizer para as câmeras, com ares de indignação próprios de um ator de novela mexicana, que não há prova alguma de seu envolvimento, que sua vida pública é imaculada, ou que “não sabia” do que estava acontecendo na mesa do lado, sinto-me ofendido por ser tratado como um completo imbecil.
A imprensa revela documentos, gravações e uma lógica impecável (por exemplo, culpa-se alguém externo ao governo por prática de lobby, quando é elementar a percepção de que o lobby só existe porque alguém no governo participa do esquema), mas basta que o acusado, ou alguém superior a ele, diga que não há provas para que as acusações percam toda a sua força.
Para estas pessoas, o que não é confissão não é prova. Os fatos mais dantescos são descartados na lixeira da história, com as mais absurdas justificativas, e nada fazemos. Apenas pagamos o preço de nossa preguiça, de nossa indolência histórica.
A única forma de vingança do brasileiro contra essas pessoas é fazer piada. O Casseta e Planeta e o CQC substituem os programas policiais. Mas não percebemos que rimos de nossa desgraça.
Rimos de nós mesmos, apalermados. Enquanto isso, os acusados impunes riem gostosamente. Riem a risada gostosa de quem é acariciado com o voto daqueles que são roubados escancaradamente.
Abestado. É assim que muitos brasileiros devem ser tratados. É assim que muitos brasileiros gostam de ser tratados. Tiririca é o oráculo de nossa essência mais profunda.
Fábio Tokars é mestre e doutor em Direito. É advogado. É professor de Direito Empresarial na PUCPR, no curso de Mestrado em Direito do Unicuritiba e na Escola da Magistratura do Estado do Paraná. flt@marinsbertoldi.com.br