Após a discussão provocada pelas medidas da Secretaria de Direito Econômico (SDE) com o escopo de intervir nas manifestações dos médicos para que seus honorários sejam revistos pelas operadoras de saúde e o decepcionante adiamento da votação das MP 520/2010 e 521/2010, o holofote deve se voltar aos enunciados que serão firmados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o qual realiza a Reunião dos Comitês Estaduais do Fórum do Judiciário para a Saúde.
Nos dias 02 e 03 de junho, em Brasília, também estarão presentes Ministros do STJ e STF além de representantes do Ministério da Saúde, das Secretarias de Saúde dos Estados e dos corregedores das justiças estadual e federal.
O Fórum Nacional do Judiciário para Monitoramento e Resolução das Demandas de Assistência à Saúde foi instituído em 03 de agosto de 2010 pelo CNJ. Antes mesmo de sua criação, o CNJ já havia elaborado a Recomendação de no.31, de 30 de março de 2010, a qual apontou para a necessidade de os Tribunais de Justiça dos Estados e os Tribunais Federais celebrarem convênios com entidades para que médicos e farmacêuticos fornecessem apoio técnico aos magistrados.
Não se tem, ao menos até o momento, o número exato dessas demandas. Da mesma forma, não se pode pontuar a adesão de todos os Estados às propostas do CNJ. Minas Gerais, Rio de Janeiro, Mato Grosso, Bahia (e não apenas estes) apresentam iniciativas envolvendo Justiça, Ministério Público, Estado, Governo Federal e Municípios: em comum, os esforços desses estados tem sido propiciar o diálogo entre o Executivo e Judiciário para que à comunidade seja possível a garantia do direito à saúde.
Por exemplo: uma das reclamações dos gestores de saúde pública é a de não serem ouvidos antes da concessão de provimentos judiciais de urgência.
Certos medicamentos e tratamentos no Brasil dependem da prévia aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Ainda que a Justiça determine que o gestor municipal ou estadual forneça o medicamento, se este não estiver disponível e não foi aprovado no país, acabará por ser uma decisão sem o resultado efetivo ao cidadão, que continuará, por tempo indeterminado, a aguardar o tratamento, mesmo já tutelado pelo Poder Judiciário.
Para que se evite essa situação, o magistrado poderia, a partir do esclarecimento prévio do gestor da indisponibilidade daquele medicamento, ter instruído a ação com relatórios médicos que apresentasse a descrição da doença, bem como os tratamentos possíveis a partir de determinado princípio ativo, que substituísse aquele não registrado na Anvisa.
No ano passado, nos dias 18 e 19 de novembro, ocorreu o primeiro encontro do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde, em São Paulo. Em oito painéis foram discutidos temas importantíssimos para a sociedade brasileira. A chamada Judicialização da Saúde, que se refere a demandas judiciais envolvendo como partes a saúde pública ou a privada – SUS ou operadoras – e pessoas que necessitam de tratamentos cuja cobertura fora negada; ou medicamentos cujo valor ultrapassa a renda total de certas famílias; ou passam pelo infortúnio de não conseguirem vagas nos hospitais públicos e privados.
A falta de controle da gestão dos recursos públicos também é tema constante em ações civis públicas propostas pelo Ministério Público. À época, levantou-se em 20 Tribunais um número parcial de 112 mil processos com essas demandas no setor de saúde. Não obstante, importa registrar que o próprio coordenador Milton Nobre referiu na abertura daquele encontro que certamente o número total de ações não passava de 500 mil.
Conclusão desse encontro foi a reafirmação de que o Poder Judiciário carrega a responsabilidade de resgatar a cidadania, enquanto políticas do Estado não se mostrarem eficientes para amenizar os graves problemas que permeiam a Saúde.
Para as discussões na reunião técnica dos dias 02 e 03 de junho, utiliza-se um número de 240.980 processos existentes.Pretende-se encontrar formas de acelerar a solução para esses conflitos. E uma solução é a de fornecer subsídios técnicos aos magistrados fundamentem suas decisões.
Em reunião dezembro de 2010, o CNJ discutiu com representantes da Universidade Federal do Estado de São Paulo (Unifesp) e do Centro Cochrane do Brasil a possibilidade de uma parceria que permitisse criar um sistema de informações científicas sobre eficácia, efetividade e segurança de medicamentos.
Assim, a estratégia continuará no sentido de promover encontros, como esse de Brasília, até que se consiga mapear cada detalhe que envolve o sistema de saúde de cada região do Brasil. Já se sabe que Alagoas possui 70% das demandas judiciais de saúde relacionadas a pessoas com problemas de diabetes e Mal de Alzheimer. O Ceará aponta para um maior número de demandas envolvendo pacientes com câncer.
O objetivo do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde é o de que o conhecimento das motivações das lides em saúde possa demonstrar ao Poder Executivo, de forma diferenciada, reconhecendo-se quais as medidas de política de saúde pública precisam ser criadas para diminuir a necessidade de intervenção do Poder Judiciário.
Só assim, o cidadão poderá, então, exercer plenamente seu direito à saúde, garantido pelo Estado, fazendo valer o disposto na Constituição Federal. Mas, muitas reuniões ainda precisarão ocorrer.
Sandra Franco é consultora jurídica especializada em Direito Médico e da Saúde, membro efetivo da Comissão de Direito da Saúde e Responsabilidade Médico Hospitalar da OAB/SP e Presidente da Academia Brasileira de Direito Médico e da Saúde – drasandra@sfranconsultoria.com.br