Os recentes alagamentos ocorridos em São Paulo, no Nordeste e em outras regiões do País, que colocam as políticas de saneamento até aqui praticadas em xeque-mate, estão dando motivo para outra “vontade política” do governo de Luiz Inácio Lula da Silva: vem aí – e poucos duvidam que não venha – outro imposto com nome de taxa. A taxa antienchente, a ser cobrada pelos municípios com base no tamanho da área impermeabilizada dos imóveis.
A proposta partiu de um grupo interministerial criado no ano passado para propor uma política de saneamento e um marco regulatório (sic) para o setor, segundo se anuncia em Brasília. Espelha-se numa iniciativa parecida que já está em funcionamento, segundo dizem, na Prefeitura de Santo André, em São Paulo. Ali, desde 1998, os contribuintes pagam uma taxa de drenagem, cujo valor mensal obedece a cálculo onde entram componentes ligados ao tamanho da área coberta do imóvel e ao índice pluviométrico da região. Se São Pedro exagera na dose, o município cobra mais do contribuinte que, assim, reza para chover menos.
A idéia parece o ovo de Colombo. Pelo menos para o governo que, emparedado pelos problemas sociais decorrentes de cheias e entupimentos momentâneos de bueiros, devolve a peteca para o contribuinte sem nada fazer de objetivo em defesa dos alagados. O passo mais importante dado por Lula nesse setor, ao que parece, foi o anúncio de sua vontade pela liberação dos recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS aos flagelados. Aí foram dizer a Lula que a maioria das vítimas nem emprego tem, ou se tem, é muito curto o tempo, sendo o Fundo insignificante. De qualquer forma, a bondade presidencial é alimentada, como se diz, num tipo de cortesia feita com chapéu alheio: o dinheiro do FGTS é patrimônio do trabalhador e a ele pertence. Liberar essa grana não constitui favor algum, nem obra social digna de monta. É lamentável.
Mas voltemos à taxa antienchente. Já pagamos durante algum tempo (e ainda não estamos livres disso) uma taxa anti-seca, vulgo taxa antiapagão. Mesmo em áreas onde sobrava água, resolveram saquear o consumidor de luz, já estrangulado com impostos, taxas e contribuições que representam a metade da fatura mensal da iluminação. Para essa cobrança, ninguém foi perguntar de quem era a culpa pelo desmatamento que diminui a incidência de chuvas e seca represas. O consumidor tupiniquim reagiu, mas, como sempre, acomodou-se e paga sem bufar.
Nosso planejamento urbano é nulo em saneamento. Muitos rios foram literalmente enterrados em cidades para esconder o esgoto que dentro deles é atirado com a conivência das autoridades sanitárias, do meio ambiente e das “ongs da árvore da praça”. Qualquer chuvinha e eles transbordam, é claro, pois além de tudo, geralmente foram mal dimensionados. Agora vem o mesmo poder público que não fez a sua parte (aliás, fez exatamente tudo errado) e atira a fatura no bolso do contribuinte já vítima de tais erros. Quem mora em apartamento, por exemplo, tem cem por cento da área que usa impermeabilizada. Quem reside num terreno pequeno, desses que denunciam irregularidades no passado, pagará pela pequenez de sua morada que extrapola os metros quadrados necessários a drenar a água da chuva e servir de moradia. Já numa chácara em pleno perímetro urbano…
Ora, é preciso mais criatividade para a solução desse ingente problema do que a simplória e sempre recorrente ameaça de avançar no bolso da gente. Sem essa de dizer que a taxa será uma forma de fazer as pessoas tomarem consciência do problema. Ninguém ignora que ele existe. E todos já perceberam a gravidade dos estragos. Quem dorme é o poder público. Nem se acredita que os recursos amealhados serviriam para combater o mal das cheias. Já tivemos o BNH em outros tempos, que cuidava também disso. Faliu escandalosamente e ninguém, apesar dos mármores e granitos explícitos em nababescas sedes, foi punido. Se aprovada, será mais uma taxa com fim específico, mas que, no passar do tempo, socorrerá salários, pensões e viagens de apaniguados.