Durante o governo Fernando Henrique Cardoso, repetiram-se acordos e renovações de acordos com o Fundo Monetário Internacional. Desacordos, se ocorreram, foram resolvidos na mesa de negociações. Em todas as ocasiões, o Brasil se comprometeu a tentar alcançar metas de superávit primário. O objetivo era sobrar dinheiro para pagar parte da dívida externa, inclusive com o próprio FMI. Superávit primário é a diferença positiva entre receitas e despesas, excluídos os gastos com juros.
Foram oito anos de severas críticas da oposição, que sempre considerou que a manutenção de elevados superávits desviava recursos necessários para projetos sociais e de desenvolvimento do Brasil. Trabalhávamos para pagar juros das dívidas e pouquíssimo sobrava para o desenvolvimento. Tal discurso oposicionista estava longe de ser falso. A dívida pública sempre foi um entrave ao nosso desenvolvimento. Daí porque pregaram com convicção e ousadia a moratória, ou seja, o calote da dívida, para que houvesse dinheiro para fazermos o que o povo espera e reclama. Nosso mais recente acordo com o FMI, com suas posteriores alterações, fixou uma meta de superávit primário de 3,75% do Produto Interno Bruto. Nos últimos meses da administração FHC, as oposições pregavam a redução dessa meta, já não mais falando em moratória, convencidas que, longe de ser um remédio, é um veneno para qualquer economia. Fecha as portas para novos investimentos, rouba os já feitos e isola o país caloteiro. Em linguagem mais comedida, reclamava-se pelo menos uma redução da meta de 3,75% do PIB, preferentemente de forma negociada.
Num curto espaço de tempo em que a crise de confiança no Brasil pareceu amainar e tudo indicava que a equipe econômica estava vencendo a tempestade, um jornal inglês publicou artigo de um “brasilianista” recomendando ao futuro governo (Lula) um substancial aumento da meta de superávit primário. Manuseando com habilidade números de nossa economia, o brasilianista buscou mostrar que sem essa providência drástica, totalmente contrária ao que vinha sendo pregado pelas oposições, poucas chances teríamos de sair do buraco.
Assumiu Lula e outra vez se falou em diminuir o superávit primário. Mas, os números falam alto e os da nossa economia, berram. Antônio Palocci Filho assumiu o Ministério da Fazenda e, além de estar seguindo praticamente tudo o que Pedro Malan recomendava, já admite um aumento do percentual de superávit primário.
As metas sociais são do governo e não devem, na avaliação de Palocci, fazer parte do acordo com o FMI. “São as metas do País. São nossas responsabilidades. Devem ser acompanhadas pela sociedade civil, pelas universidades e não pelo FMI”, disse, quando indagado se discutiria a exclusão dos gastos de programas sociais de Lula do acordo com o Fundo.
E explicou: “Fazemos superávit primário porque temos dívidas. Não porque temos um acordo com o FMI”. Se esse aumento da meta de superávit virá ou não, depende ainda de conversações e estudos. Mas o que parece certo é que redução dos 3,75% ou eliminação do superávit é assunto esquecido. É conversa de campanha eleitoral, lícita enquanto não se tinha a responsabilidade efetiva de governar o País.
Resta a esperança de que alguns sonhos do novo governo se concretizem, como o aumento expressivo das exportações, incentivos aos investimentos na geração de empregos com a construção ou ampliação de empresas. Enfim, o progresso, a despeito da necessidade de apertar o cinto.